Nove anos da Lei Maria da Penha: especialistas apontam os desafios

Na semana em que a Lei Maria da Penha completa nove anos de existência (Lei nº 11.340/2006), especialistas alertam para os desafios que ainda existem no combate à violência intrafamiliar e seus impactos na sociedade. O debate foi promovido, nesta quinta-feira (6), pelas Procuradorias da Mulher do Senado Federal e da Câmara dos Deputados e pelas bancadas femininas das duas casas, no Senado.

Debate Lei Maria Da Penha - CTB

A defensora pública do Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria Pública do Mato Grosso e presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do estado, Rosana Leite Antunes de Barros, comemorou os nove anos da Lei, pontuando que é a 3ª mais importante legislação do mundo no combate à violência doméstica. “Temos uma lei de primeiro mundo, mas vivemos ainda uma situação precária, com o Brasil sendo o 7º no ranking de violência contra a mulher. Mas houve avanços nos últimos anos, e o principal, a meu ver, é a quebra do tabu de que o poder público não pode intervir em situações de violência doméstica.”

Rosana Barros também descreveu o ciclo da agressão e ressaltou que não há um perfil pré-determinado de agressor, mas que uma criança que cresce em um lar hostil tende a reproduzir agressões. “Crimes terríveis são cometidos por vítimas de um passado violento. A partir da minha experiência como defensora pública, posso afirmar que 70% dos que já cometeram crimes tiveram uma infância violenta, num lar marcado por agressões.” Para ela, é fundamental o desenvolvimento de políticas públicas que interrompam o ciclo de violência que atinge as crianças e a sociedade.

A psicóloga e coordenadora da ONG Aconchego – Grupo de Apoio à Convivência Familiar e Comunitária, Maria da Penha Oliveira Silva, apresentou um recorte do perfil das crianças em situação de acolhimento. De acordo com dados mais atuais, são mais de 46 mil crianças nessa situação, das quais 30% têm menos de seis anos.

Existem cerca de 3,7 mil instituições de acolhimento, que é uma medida de caráter provisório e protetivo prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei 8.069/1990). “Muitos são filhos de mulheres que sofreram abandono na infância e que voltam a ser abandonadas pelos parceiros. Além do abandono, as crianças precisam ser acolhidas por motivos de carência de recursos materiais da família, violência doméstica, orfandade, dependência química e alcoolismo dos pais ou responsáveis.”

A representante da Ação Mulher do PDT, Fabiana Gadelha, chamou atenção para o fato de que o principal fator de morte de crianças menores de um ano ainda são causas externas como acidentes causados por negligência e violência. “As pessoas mais próximas das crianças são os agressores na maioria dos casos”. Ela também apontou que a Lei Maria da Penha tem sido eficaz para proteger meninas, adolescentes, mulheres adultas e idosas, mas que há dificuldade para proteger meninos.

“A Lei Maria da Penha, por ter a questão de gênero como motivadora, é importante para a conscientização da sociedade”, ressaltando que a norma não apenas pune, mas prevê ações de prevenção de situações de violência, assim como medidas protetivas e de assistência às vítimas. Para ela, é importante ter um olhar mais completo sobre essas situações. “Não adianta afastar o agressor das vítimas e não tratá-lo, porque ele vai se relacionar agressivamente com outras mulheres e crianças e vai ser violento novamente.”

Maria de Lourdes Magalhães, representante do Ministério da Saúde, fez uma abordagem ampla das leis existentes. Ela destaca que o ECA é um importante instrumento na defesa dos direitos desse segmento e que a Lei do Menino Bernardo (Lei 13.010/2014) trouxe mais ações relativas à punição de castigos físicos. Ela citou que também há legislação que obriga o atendimento de vítimas de violência física e sexual. “O ministério vem construindo um trabalho para que exista um olhar integral sobre a 1ª infância, combatendo as formas de violência e promovendo uma cultura da paz.”