Manifestante da Paulista têm visão seletiva da corrupção, diz pesquisa

Pesquisa realizada por professores da USP e da Unifesp com os manifestantes presentes no ato de domingo (16), confirmam o que muitos, inclusive o Portal Vermelho, vinham apontando: os manifestantes se dizem democráticos, mas defendem ideias antidemocráticas e têm pensamento seletivo quanto o assunto é corrupção.

- Foto: André Tambucci/ Fotos Públicas

Seguindo o viés dado pela grande mídia, os que foram à Avenida Paulista no domingo consideram o chamado "mensalão" e o caso envolvendo a Petrobras como os mais graves de corrupção, segundo 99% dos manifestantes.

Mas quando se trata do mensalão tucano a história é outra: 80% deles consideram grave. Quando se trata da Operação Zelotes o grau de gravidade cai para 58,8%. A Zelotes investiga sonegação de impostos de grandes empresas e milionários por meio de suborno a integrantes do Conselho Administrativo de Recurso Fiscal (Carf), estimada em R$ 19 bilhões.

Questionados sobre qual a saída para a crise, a maioria dos manifestantes, 87,7% dos entrevistados, aponta que a solução seria “entregar o poder para um político honesto”. Outros 63,7% consideram que o melhor seria um juiz honesto governar o país. E pasmem: 28,2% afirmam que é melhor os militares assumirem o poder.

Entre os considerados "honestos" por esse público estão o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), com 9,63%; juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato, com 9,14%, e Joaquim Barbosa, ex-ministro do STF com 8,64%.

O perfil conservador é ainda mais latente quando 86,4% dos entrevistados afirmam que a melhor maneira de conseguir a paz na sociedade é aumentando a punição aos criminosos. Ou quando 79,5% afirmam que as cotas raciais não deveriam existir, pois são um tipo de privilégio. Outros 74,8% são contra o programa Mais Médicos e 48,7% defendem que “estrangeiros que pedem asilo tiram trabalho dos brasileiros e não deveriam ser aceitos no país”.

A contradição aparece quando 50,3% afirmam que a maconha deve ser legalizada, ou 60,5% não discriminam relações homoafetivas e 78,8% discordam que a roupa de uma mulher seja justificativa para estupro.

Ao mesmo tempo, 76,8% concordam que seria bom para o país “tomar decisões políticas por consulta popular e plebiscitos”. Outros 59,3% defendem que é preciso fortalecer ONGs e movimentos sociais. E 73,3% disseram ser contra o financiamento empresarial de campanhas eleitorais.

“Está bem confuso. E esta é uma questão-chave quando se tem uma crise. Ao mesmo tempo que tem uma parte buscando soluções extrapolíticas, tem também tendências de aprofundamento democrático”, destaca o professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da USP, Pablo Ortellado, um dos organizadores da pesquisa.

A posição dos manifestantes destoa das principais lideranças responsáveis pela convocação do ato, defensores de ideais radicalmente neoliberais, como privatizações e redução de impostos. Para 96% dos entrevistados, o Estado deve prover serviços públicos de saúde e de educação para todos. Mesmo a tarifa zero tem aceitação significativa dos manifestantes: 50,4% concordam. A concordância entre organizadores e manifestantes limita-se a considerar a carga de impostos no país "alta demais".

“Para nós, o principal achado é esse desacordo com as propostas liberais dos grupos, que pregam o Estado mínimo. Não devemos observar só o que dizem estas lideranças, mas o que pensam as pessoas que estão se mobilizando”, avalia Ortellado.