Yrigoyen, o primeiro progressista eleito pelo voto argentino

Em 1916, sem o ainda inexistente voto das mulheres, os argentinos elegem pela primeira vez um líder de um partido radical que já havia convulsionado a vida política do país por duas vezes no final do século 19. Hipólito Yrigoyen é um dos líderes políticos mais notável e original da história da Argentina. Foi presidente duas vezes, de 1916 a 1922 e de 1928 a 1930, pela União Cívica Radical (UCR). Progressista, trouxe avanços consideráveis para a Argentina do início do século 20.

Hipólito Yrigoyen, no centro, caminha com ministros

Nascido em Buenos Aires em 1852, descendentes de imigrantes bascos, após participar brevemente da política dentro da UCR, Yrigoyen passa a ganhar a vida dando aulas para a escola Normal de Mulheres da cidade e comprando gado para engorda e posterior venda. Em 1893, convencido pelo seu tio Leandro Alem, volta à política e assume a presidência da UCR de Buenos Aires.

Com o suicídio de seu tio em 1896, assume a liderança do partido. A UCR segue a política de abster-se de participar tanto das eleições, como do governo, até que se satisfaçam suas reivindicações por um sistema eleitoral amplo e com eleições livres.

Yrigoyen tem como postura a total oposição ao governo, que seguia sempre na mão de conservadores, alternando-se no poder. Por duas vezes investe contra o sistema com ações armadas, liderando o partido, em 1893 e 1905. Mais tarde, orienta sua ação de forma não violenta mediante a abstenção revolucionária. Logo depois da promulgação da Lei Sáenz Peña em 1912, que estabelecia o sufrágio obrigatório, secreto e universal (ainda que excluindo as mulheres), os radicais iniciam sua ação política e elegem Yrigoyen para presidente em 12 de outubro de 1916. Ele é eleito com mais de 57% dos votos.

Seu primeiro mandato, apesar das desastrosas consequências da Primeira Guerra Mundial – quando a Argentina sofreu com a recessão devido à inexistência de mercado para seus produtos –, a presidência de Yrigoyen é marcada pelo "nacionalismo econômico", quando acerta acordos que beneficiam os agricultores e os comerciantes argentinos.

No final de 1916, por exemplo, o Congresso recebe um plano de colonização centrado na partilha da terra, que passaria à propriedade dos colonos, e é intensificado o ensino agrícola. A produção é estimulada mediante a proliferação de pequenos proprietários. Em apoio desta iniciativa, o governo emite cem milhões de pesos em títulos da dívida pública, cujo produto possibilitaria, entre outras coisas, a criação de um banco agrícola com fins de crédito favorável à colonização.

Sua administração foi marcada por forte oposição no Congresso, de grande maioria conservadora. Entretanto, é amplamente popular, pois nela são realizadas amplas reformas progressistas, como a educacional. Quando é eleito, em 1916, haviam no país 7.856 escolas primárias e em poucos anos foram criadas mais 3.120.

As faculdades, antes meros suportes do conservadorismo, foram despojadas de grande parte de seu poder e a administração universitária tornou-se mais democrática. Surge um movimento estudantil em Córdoba, conhecido como a Reforma Universitária. Suas conquistas se estendem a todo o país e influenciam também o continente. Ao mesmo tempo, são nacionalizados e fundados novos institutos de ensino superior. Sopb sua administração ao analfabetismo cai de 20% para 4%.

É do seu governo a criação da empresa de hidrocarbonetos argentina, a Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF). Outra grande vitória para os trabalhadores é a sanção presidencial do descanso dominical.

Entretanto, nem tudo são rosas, para o presidente. A crise causada pela Primeira Guerra, da qual a Argentina mantém distância com a neutralidade, eleva o desemprego de 5% para mais de 20%. Apesar da elevação dos salários, o mal-estar se espalha entre os trabalhadores. Em setembro de 1917 desencadeia-se uma greve ferroviária. Os conservadores pedem pela repressão militar à greve e que vete a lei das aposentadorias de ferroviários aprovada pelo Congresso. Porém, Yrigoyen nega o uso da força e não se opõe à promulgação da lei.

Durante todo o período presidencial de Yrigoyen acontecem greves. Entre 1917 e 1922 são 1.109, das que participam ao todo 856.574 pessoas. O ano de 1919 marca o momento culminante da tensão social, com 367 greves e 308.967 grevistas. Quando Yrigoyen finaliza seu mandato, no entanto, há tranquilidade entre os trabalhadores, como o prova a participação de apenas 4.737 grevistas em 116 movimentos de greve registrados.

De todos estes conflitos de caráter social, tem singularíssima importância, por sua magnitude, o que se produz durante a chamada Semana Trágica. Começa em 6 de janeiro de 1919, quando os trabalhadores das metalúrgicas Vasena exigem jornada de trabalho de 8 horas e o pagamento de horas extras.

Os trabalhadores entram em greve e os patrões demitem os dirigentes. Os grevistas passam a exigir a readmissão dos demitidos, além do fim das represálias.

Tem início então conflitos generalizados em Buenos Aires, cuja gravidade obriga o presidente a designar um governador militar para a cidade. A luta persiste até o dia 13. Em uma semana exata de choques nas ruas, as forças de repressão submetem os operários.

Uma testemunha da época, Mario Boratto, delegado dos operários, calcula que os mortos chegam a 700, os feridos a 4 mil e milhares de presos. Segundo a polícia, a culpa é dos comunistas, que são estimulam os operários às greves "por causa da revolução na Rússia". Aos supostos comunistas é aplicada e lei de expulsão do país.

Na época, o mais poderoso sindicato argentino era a Federação Operária Regional Argentina (Fora), que havia declarado na época sua adesão à Revolução Russa e ao comunismo.

Espalham-se greves por todas as províncias e só em junho de 1920 que o Fora acerta um acordo com a Federação Agrária Argentina (FAA), colocando um fim temporário às greves.

Yrigoyen tem apoio popular, porém a maioria opositora impede no Congresso quase todas as suas iniciativas transformadoras. A imprensa e os governos do interior do país permanecem seus adversários, pois continuam com a orientação conservadora anterior.

Ele deixa a presidência em 1922, cedendo a cadeira a Marcelo Torcuato de Alvear, mas permaneceu politicamente poderoso como presidente da UCR. Foi eleito novamente em 1928, devido à sua grande popularidade, mas teve de enfrentar a grande Depressão, a crise econômica do final dos anos 1920.

A crise ocasionou insurreições populares em algumas províncias, contidas por militares, o que minou o apoio que tinha do povo. Devido à saúde frágil e à idade avançada, não conseguiu enfrentar a crise e acabou sendo deposto do poder por militares, em 1930. Quando isso acontece, a economia Argentina tinha a metade do PIB da América Latina e o dobro do Brasil. Preso na linha Martín Garcia, volta para Buenos Aires em 1933, quando vem a falecer.