Sem regulação do BC, bancos cobram juros exorbitantes

Embora o Banco Central tenha mantido a taxa básica de juros no mesmo patamar desde setembro de 2015, os bancos continuam a aumentar as taxas de juros das operações de crédito. Em janeiro de 2016, ocorreu 16ª elevação consecutiva, segundo dados da Anefac (Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade). Para o economista Paulo Kliass, os números refletem a omissão do Banco Central, que deveria regular um mercado de crédito "praticamente oligopolizado". 

materia sobre juros recordes no cartão de crédito

De acordo com a Anefac, as seis linhas de crédito pesquisadas tiveram juros elevados no último mês (juros do comércio, cartão de crédito rotativo, cheque especial, crédito direto para financiamento de veículos, empréstimo pessoal de bancos e empréstimo pessoal de financeiras).

Com isso, a taxa média de juros geral para pessoa física, subiu 0,11 ponto percentual de dezembro para janeiro deste ano e atingiu 7,67% ao mês (142,74% ao ano). Esse é a maior taxa de juros desde fevereiro de 2005.

Se a taxa básica de juros (a Selic) está no mesmo – e já elevado – patamar de 14,25% desde setembro do ano passado e os juros para os tomadores finais de empréstimos e financiamentos continua subindo, significa que o spread bancário está aumentando.

Spread é justamente a diferença entre as taxas que as instituições financeiras pagam para captar recursos e as que cobram do cliente final. Traduzindo: os bancos captam recursos a taxas próximas de 14,25% ao ano e cobram, em média, 142,74% em suas operações de crédito para pessoa física.

"O Brasil tem a peculiaridade de ser campeão mundial não só na taxa oficial de juros (Selic), mas também no spread bancário", aponta o doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, Paulo Kliass. 

No caso das empresas (capital de giro, desconto de duplicatas e conta garantida), também houve elevação nas três linhas de crédito pesquisadas. A taxa de juros média geral para pessoa jurídica apresentou elevação de 0,06 ponto percentual ao passar de 4,27% ao mês (65,16% ao ano) em dezembro de 2015 para 4,33% ao mês (66,31% ao ano) em janeiro de 2016. Essa é a maior taxa de juros desde fevereiro de 2009.

Os juros cobrados nos cartões de crédito continuam sendo os campeões isolados, saltando de 399,84% ao ano na pesquisa de dezembro para 410,97% ao ano no levantamento de janeiro. O resultado, que Kliass classifica como "um escândalo", é o maior desde outubro de 1995. 

Segundo o economista, os spreads praticados estão em níveis tão elevados devido à passividade do Banco Central, que tem por missão fiscalizar, controlar e regular esse tipo de atividade, mas não o faz. E quem sofre é o tomador de crédito, ou seja, famílias e empresas. 

"O mercado de crédito é praticamente oligopolizado. Há uma concentração de grandes bancos. Cartel na veia. Por isso cobram altíssimo. E quem deveria regulamentar seria o Banco Central, que fecha os olhos e faz cara de paisagem", critica.

Kliass lembra que não apenas os bancos privados cobram taxas elevadas, como também os bancos públicos, que poderiam ter o papel de fazer baixar o spread. Em 2011 e 2012, destaca, a presidenta Dilma Rousseff adotou uma postura mais ativa, obrigando bancos públicos federais a reduzirem suas taxas. Desta forma, forçavam também as instituições privadas a acompanharem a redução. 

"Mas a pressão foi grande, houve uma tentativa de sabotagem e ela recuou, deixou de utilizar os bancos públicos como instrumento de redução do custo financeiro", lamenta. E reitera qual deveria ser o papel do BC: "Deveria ser zelar pelos interesses da maioria da população, contra o abuso de poder de grandes conglomerados financeiros", aponta.

Segundo ele, o argumento de que os bancos seguem a regra do mercado não poder ser aplicado nesse caso. "Não existe mercado, no sentido do equilíbriio mágico entre a oferta e a procura, quando se tem oito grandes conglomerados dominando milhões de brasileiros pelo lado da demanda. É uma absurdo", condena.  

"Parece que o Brasil é o paraíso do sistema financeiro. E ninguém se importa com o que acontece com o tomador. A preocupação do banco é em resolver seus problemas de resultado, garantir o lucro", diz. Ele ressalta que, em 2015, ano de recessão, aumento do desemprego e de quebradeira de empresas, o único setor que comemorou aumento de lucratividade foi o financeiro. Não à toa. 

Kliass destaca que o setor financeiro é o único que não é regulado. "E deveria ser", defende, citando que o BC poderia fixar o máximo de spread a ser cobrado pelos bancos, como fazem outras agências reguladoras em suas respectivas áreas. 

De acordo com o diretor de estudos e pesquisas econômicas da Anefac, Miguel José Ribeiro de Oliveira, um dos motivos que explica as elevações dos juros cobrados pelos bancos é o cenário econômico que aumenta o risco dos índices de inadimplência também subirem. 

Paulo Kliass, contudo, questiona a explicação, com um argumento muito simples: "Quando a economia estava bombando, eles não baixaram o spread".