Marcos Verlaine: Atenção, o futuro poderá ser ainda pior
Para ficar apenas no campo econômico, a agenda em curso é a da oposição, só que em níveis mais brandos. Se Aécio fosse eleito presidente em 2014 não ficaria pedra sobre pedra. Basta lembrar que seu ministro da Fazenda seria Armínio Fraga, que foi ministro de FHC, que entre outras propostas disse que acabaria com a atual política do salário mínimo, tão cara ao movimento sindical.
Por Marcos Verlaine*
Publicado 23/02/2016 11:19

Mantendo-se os níveis atuais de polarização sectária da política até as eleições de 2016 e 2018, a situação do País tende a piorar. As eleições municipais de 2016 poderão ser o termômetro disto. E as de 2018 poderão ser o resultado final desse embate despolitizado e caótico.
O debate político está interrompido. De um lado, os “petralhas”, de outro, os “coxinhas”, com altíssimo grau de intolerância. É óbvio que esta equação contraditória é falsa, mas é mantida pelos meios de comunicação e os agentes políticos como se verdadeira fosse.
A orientação midiática, sobretudo da imprensa, aceita por parcelas expressivas da chamada classe média, é que basta tirar o PT e tudo estará resolvido.
O buraco é mais embaixo e vai exigir união nacional pelo desenvolvimento, pela recuperação da renda e do emprego!
No embate político em curso, tudo que compromete ou pode comprometer e incriminar o PT, Lula e Dilma ganham destaque e dimensão nacionais. É como diz o músico, compositor, escritor brasileiro, que é vocalista da banda Detonautas Roque Clube, Tico Santa Cruz: “falar da vida privada do Lula é notícia; falar da vida privada do FHC é fofoca”.
Quando o mal feito compromete a oposição, em particular o PSDB, do senador Aécio Neves (MG), e a mídia não pode esconder/abafar, veicula-se. Com direito ao contraditório. Como deve ser, mas só para a oposição. Depois desaparece do noticiário como se nunca tivesse existido.
No contexto das eleições, o diretor de Documentação do Diap, Antônio Queiroz, em seu artigo "Perfil dos candidatos às eleições de 2016 e 2018", entre outros aspectos, chama a atenção para a qualidade dos postulantes às próximas disputas (2016 e 2018) em razão da desqualificação do debate político nesta conjuntura de polarização ensandecida.
Ele divide os candidatos em quatro categorias por conta do fim do financiamento empresarial de campanha: 1) os endinheirados ou os ricos, 2) as celebridades, 3) os fundamentalistas, e 4) os candidatos vinculados aos movimentos sociais.
Os endinheirados têm sempre vantagem, porque disputam num ambiente despotilizado em que o dinheiro desequilibra o resultado para o bem ou para o mal. As celebridades por serem muito conhecidas. Os fundamentalistas religiosos, entre outros aspectos, por conta da prevalência da agenda conversadora em curso. E os movimentos sociais, pela sua militância.
Em geral, as três primeiras categorias trazem candidatos, em sua maioria, afinados com a agenda conservadora. Assim, a prevalecer essa média do debate político, tudo indica que a situação não vai melhorar, pelo contrário, como problematiza Queiroz em seu artigo citado acima.
O perfil do Legislativo eleito em 2014 é a confirmação desta preocupação. Há uma unanimidade em afirmar que se trata de o Congresso mais conservador dos últimos 20 anos.
No final das contas, a qualidade dos representantes, nas democracias representativas, como é o caso da democracia brasileira, tem relação com a qualidade dos representados, numa relação dialética. Não é à toa que eleição após eleição, a qualidade dos poderes legislativos nos seus três níveis — municipais, estaduais e federal — tem decaído bastante, com a perda da qualidade dos eleitos.
No governo, a agenda econômica, por exemplo, colocada em prática pela presidente Dilma, neste segundo mandato, por força das circunstâncias, como pondera Queiroz, é a agenda da oposição, com menos radicalidade.
Alguns fatores da intolerância
Em seu longo artigo "Quem é quem no xadrez do impeachment", jornalista Luis Nassif chama a atenção para a falência do modelo neoliberal inaugurado em 1972, e da democracia representativa que vigorou em todo século 20, para entender, entre outras abordagens, alguns fatores da intolerância e da desqualificação da política em curso.
Ele cita ainda o fim do “quadro econômico estável, e com válvulas de escape permitindo administrar os conflitos internos, com relativa abertura para processos lentos de inclusão.” Lembra a crise de 2008, que reacendeu “a insegurança econômica e o medo de perda de status social.”
No Brasil, com a crise, “a busca de bodes expiatórios foi bater nas costas dos novos incluídos, muito mais concretos para atiçar o primarismo da besta do que movimentos financeiros sofisticados ou as grandes jogadas empresariais”, pontifica Nassif.
E acrescenta: “Houve então um estilhaçamento de todas as formas de coordenação e controle da opinião pública em um momento de conflitos étnicos e de ódio interno nos países. A besta arrebentou as grades e invadiu as ruas, as cidades, até as conversas de família.”
Diante desse quadro caótico que inunda a sociedade e as instituições é preciso resgatar o conteúdo do debate político para evitar que essa situação se deteriore, pois os principais prejudicados serão o povo em geral e os trabalhadores em particular.