Imigrantes marcam nova transformação nos gramados europeus

Em 2005, o Arsenal colocou em campo uma equipe sem nenhum jogador inglês para enfrentar o Cristal Palace. Nenhum inglês nem ao menos no banco de reservas. Esse episódio pode ser usado como o início de um novo período no futebol mundial.

Por Thiago Cassis*

Boateng Futebol

Já no começo dessa década, milionários árabes passaram a comprar equipes inteiras, transformando clubes medianos, como o Manchester City, da Inglaterra, em potências mundiais. O Paris Saint Germain é outro exemplo deste modelo. City e PSG formam, inclusive, uma das chaves das quartas-de-final da Champions League dessa temporada.

Porém, um outro fenômeno pode ser observado atualmente em gramados europeus. Trata-se da grande quantidade de atletas de origem árabe (sobretudo oriundos da região do Magreb e Turquia), além dos africanos, que já ocupam seu espaço há mais tempo no futebol do velho continente, atuando em grandes equipes europeias.

Se pegarmos como exemplo os clubes que lideram os principais campeonatos da Europa, a começar pela grande sensação da temporada, o Leicester, da Inglaterra, temos nessa equipe, Riayd Mahrez e N'Golo Kanté. O atacante Mahrez, que já marcou 16 vezes nessa temporada, nasceu na França, mas tem pais argelinos, e por isso, optou por naturalizar-se e defende as cores da seleção da Argélia. Já o meio-campista Kanté, apontado por muitos como a grande revelação do inglês, também nasceu na França, mas optou por defender a bandeira tricolor ao invés de vestir a camisa de Mali, país do qual descende.

Já na Alemanha, onde o Bayern de Munique ocupa o topo da tabela com 5 pontos de vantagem sobre o Borussia Dortmund, encontramos no banco de reservas Serdar Taşçı, de origem turca. Na equipe titular aparecem Boateng, de origem ganesa, mas que optou defender a seleção alemã (ao contrário de seu irmão Kevin-Prince que atua por Gana) e Mehdi Benatia, nascido na França, mas que defende a seleção de seus pais, o Marrocos.

Ainda na Alemanha, o vice líder, Borussia Dortmund, tem como um de seus destaques, Pierre-Emerick Aubameyang, que também é francês, mas defende a seleção de Gabão. Mesmo caso de Nuri Şahin, alemão, que veste as cores da Turquia, respeitando suas origens.

Quem assiste aos jogos do Barcelona, já deve ter visto Munir El Haddadi em ação. O jogador que deve defender a Espanha na Eurocopa desse ano tem origem marroquina. O turco Arda Turan, também faz parte do elenco atual do clube catalão.

Na França, além de Matuidi e Kimpembe, temos o talvez mais famoso dos atletas que resultam de imigração. Trata-se do craque, Zlatan Ibrahimović, filho de pai bósnio-muçulmano e de mãe croata-católica. Como resultado dos conflitos que esfacelaram a antiga Iugoslávia, o jogador nasceu na Suécia, para onde seus pais imigraram com o aprofundamento do conflito.

Com uma rápida passada pelos campeonatos europeus, muitos outros casos de jogadores filhos de imigrantes, ou mesmo, que fazem parte da primeira geração de imigração de seus países, podem ser encontrados. E a tendência é só aumentar.

A França merece atenção especial. Talvez seja onde aconteça a maior parte dos casos de atletas, que mesmo nascendo em território francês, decidam defender as seleções deu seus parentes, demonstrando dessa forma uma não-identificação com a nação europeia.

Em um momento onde os conflitos, acerca da imigração para a continente europeu aumentam rapidamente, servindo como elemento que reacende antigos preconceitos e tendo uma prolongada crise do sistema capitalista como pano de fundo, o futebol pode ser não apenas uma maneira de integração das populações que desembarcam na Europa, mas também uma importante forma de resistência para os que fogem de seus países de origem, na maioria das vezes por falta de condições mínimas de sobrevivência, para lutar por uma situação melhor nos países europeus.


*Thiago Cassis é jornalista, assessor de comunicação da UJS, colaborador do Vermelho e editor do blog Pelota de Trapo