Para Cardozo, tentativa de impeachment é golpe de Estado
Advogado-geral da União (AGU) apresenta defesa de Dilma Rousseff na comissão especial que analisa o pedido de impedimento da presidenta. José Eduardo Cardozo fala em vícios no processo, falta de pressupostos jurídicos, vingança e desvio de finalidade para anular pedido.
Por Christiane Peres
Publicado 04/04/2016 21:24
A oitava reunião da comissão especial que analisa o pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff foi marcada pela defesa da dirigente. Em quase três horas, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, desmontou os argumentos jurídicos e políticos que, teoricamente, sustentavam o pedido de impedimento da petista. Cardozo falou em vícios no processo, na falta de pressupostos jurídicos, em vingança e desvio de poder do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao aceitar a peça de Janaína Paschoal, Miguel Reali Junior e Hélio Bicudo. Para ele, esses são motivos suficientes para o arquivamento do processo.
“O processo de impeachment foi aberto em retaliação, como vingança. Essa é uma verdade inexorável. Isso é desvio de poder, de finalidade, e deslegitima o processo. Pede-se então o arquivamento do processo”, afirmou durante sua argumentação.
Segundo Cardozo, o afastamento de um presidente eleito no regime presidencialista só pode ocorrer em situações extremas e hipóteses excepcionais. “Impeachment só pode ser usado em absoluta excepcionalidade institucional. Nenhum governo jamais pode ser afastado por questões banais. Este não é um processo político apenas, mas um processo jurídico-político. Logo, um presidente da República só pode ser afastado se houver pressupostos jurídicos claros, inquestionáveis. E a Constituição Federal é clara: o pressuposto jurídico é a ocorrência dos chamados crimes de responsabilidade. Se não houver fato não pode haver cassação de mandato de um presidente. Neste caso, não existem crimes de responsabilidade e a peça original é dotada de vícios, além do processo ter sido motivado por vingança”, afirma o ministro ao lembrar que a abertura do impeachment de Dilma por Cunha se deu em retaliação ao PT no processo de análise da cassação do presidente da Câmara no Conselho de Ética.
A defesa enfatizou que para que se configure crime de responsabilidade é necessária a existência efetiva de ato praticado pelo presidente da República, já que o artigo 86 da Constituição Federal explicita que “o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”. Logo, Dilma não poderia ser criminalizada por atos de responsabilidade dos órgãos administrativos que compõem seu governo.
“Os atos devem ser praticados diretamente pelo presidente da República [para ser crime de responsabilidade]. São atos do presidente e não atos que decorram do seu cargo, da sua ação administrativa. Se os pressupostos jurídicos não forem atendidos, a tentativa de impeachment é um golpe de Estado, sim”, declara Cardozo.
Para o vice-líder do governo, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), Cardozo “demonstrou cabalmente” que as pedaladas, o Plano Safra e os decretos – que embasam o pedido de impeachment – não se sustentam. “A presidenta fez o que a lei determina. Espero que a Câmara possa avaliar e chegar à conclusão de anular esse processo.”
Já a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), membro da comissão especial, acredita que os depoimentos de Cardozo, do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e Ricardo Lodi, professor de Direito Financeiro da Universidade Estadual do Rio de Janeiro ajudarão a solidificar, na Câmara e na sociedade, que impeachment sem crime é golpe.
“Isso ajuda a mudar o quadro. Mesmo que na comissão nós não tenhamos mudança no resultado, acho que Plenário teremos. Cardozo foi impecável. Ele demoliu todo e qualquer argumento jurídico ou político para o estabelecimento de um crime. Demoliu, inclusive, as impropriedades, a inépcia e a fragilidade da denúncia, que confunde conceitos, mostrando que é uma peça puramente política. A análise política precisa se dar depois que o crime está estabelecido, não antes. Qualquer governo que saia de um processo ilegítimo não tem condição de se manter”, avalia.
A defesa de Dilma foi a última etapa antes da apresentação do relatório da comissão especial. O relator do processo, deputado Jovair Arantes (PTB-GO), já anunciou que até quinta-feira (7), deverá apresentar o texto aos parlamentares.