Comendador italiano devolve título a Temer após impeachment de Dilma

Após o golpe parlamentar que destituiu a presidenta Dilma Rousseff no dia 31 de agosto, o professor aposentado da Universidade de Roma, o italiano Massimo Canevacci, devolveu o título de comendador da mais alta condecoração brasileira atribuída a cidadãos estrangeiros, a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul. A informação foi divulgada pela jornalista Mônica Bergamo da Folha de S.Paulo nesta terça-feira (6).

Massimo Canevacci - Foto: Reprodução/Facebook

O antropólogo, etnógrafo e escritor, doutor em Letras e Filosofia, em carta endereçada ao presidente Michel Temer,  justifica sua atitude diante de seu descontentamento e de sua "tristeza" com o processo de impeachment ocorrido no Brasil, sendo ele, “contrário” aos seus valores e “princípios republicanos”.

Na carta, Massimo Canevacci alegou a "impossibilidade" de manter a honraria "depois da votação parlamentar pelo impeachment contra a Presidenta Dilma". Em alusão ao golpe militar de 1964, o professor ressalta que prefere não manter vínculo com um governo que represente valores contrários aos seus.

O conceituado professor – que foi condecorado em 1994 – descreve ainda na carta, como foi sua pesquisa em relação a cidade de São Paulo e do seu livro "A Cidade Polifônica" – “que continua sendo um texto básico para a interpretação da comunicação urbana”, ressaltou. Ele conta que continuou sua pesquisa em relação às culturas nativas da região do Mato Grosso e sobre os livros que publicou "em relação às belezas da cultura brasileira". Canevacci foi professor visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP.

Abaixo a íntegra da carta:

"É Caro Temer,

Em 1994 – enquanto professor de Antropologia Cultural da Universidade de Roma “La Sapienza” – recebi o titulo de Comendador da "Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul". Na Embaixada do Brasil em Roma, e na frente de todo o corpo diplomático, o então Embaixador Carbonara me atribuiu esta honra, que ele mesmo havia solicitado.

O Embaixador, homem de cultura, conhecia bem a minha pesquisa sobre São Paulo e, em particular, o meu livro "A Cidade Polifônica" – que continua sendo um texto básico para a interpretação da comunicação urbana.

Posteriormente, segui pesquisando as culturas nativas presentes na área do Mato Grosso, e publiquei outros livros sobre a beleza das culturas do Brasil.

Confesso que depois da votação parlamentar pelo impeachment contra a Presidenta Dilma, sinto a impossibilidade de manter este titulo. É, portanto, com grande tristeza que decido retornar esta honra ao Senhor.

Prefiro não manter este tipo de vínculo com um Estado e com um Parlamento que – após o golpe militar de 1964 – continua produzindo valores contrários aos meus princípios republicanos.
Infelizmente, o Cruzeiro do Sul esta apagado, no momento. Espero que seja apenas temporariamente.

Respeitosamente,
Massimo Canevacci"

Honraria

A Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul originou-se da extinta Ordem Imperial do Cruzeiro, instituída por Decreto de D. Pedro I (1822) e restabelecida, com novo nome a partir do Decreto 22.165 do presidente Getúlio Vargas, em 1932. A concessão do título, de diferentes graus, se dá por decreto presidencial, configurando-se em ato de relações exteriores.

Grandes personalidades estrangeiras, como o revolucionário argentino Ernesto Che Guevara, o russo Yuri Alekseievitch Gagarin (o primeiro homem a viajar pelo espaço, em 12 de abril de 1961), o cientista político italiano Giovanni Sartori (especialista no estudo da política comparada. Sua obra mais destacada é Teoria da democracia), a presidenta da Argentina (2007-2015), Cristina Fernández de Kirchner, a professora italiana Chiara Lubich (fundadora do Movimento dos Focolares – mundo único, "que todos sejam Um") e Alain Prost (o piloto francês, quatro vezes campeão do Mundial de Pilotos da Fórmula 1), já foram condecorados com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul.