À sombra dos holofotes, o espírito olímpico em sua essência

A origem dos Jogos Olímpicos, na Grécia Antiga por volta de 2.500 anos a.C., está ligada, dentre outras, à ideia de autossuperação. Em um misto de religião e esporte, os gregos homenageavam Zeus ultrapassando os seus próprios limites. A Paraolimpíada materializa como ninguém esta ideia.

Por Penélope Toledo*

Ibrahim Hamadtou, mesatenista egípcio que disputou os Jogos Paralímpicos Rio-2016 - Rio-2016

Além de transcender as suas habilidades esportivas e de quebrar recordes, como ocorre na Olimpíada, pessoas paratletas transcendem a si mesmas, na medida em que ultrapassam suas limitações físicas e, em muitas vezes, suas barreiras psicológicas. O que não faltam são exemplos épicos.

A menina Verônica Hipólito, por exemplo, antes de superar as adversárias e ficar com a prata nos 100m da categoria T38, para atletas com paralisia cerebral, superou um tumor no cérebro e um AVC. Ela iniciou no atletismo como tratamento para voltar a andar, ganhou a medalha e avisou que quer mais: “ainda quero chegar em um lugar que nem imagino”.

Vítima de um acidente aos dez anos que lhe fez perder a visão, o judoca Wilians Araújo, da categoria acima de 100 quilogramas, sequer pôde ver a medalha de prata que conquistou. Não viu, mas sentiu. Isto porque pela primeira vez, as medalhas paraolímpicas têm guizos no interior que oferecem uma experiência sensorial aos atletas cegos. A de ouro tem 28 guizos, a de prata 20 e a de bronze 18.

Os Jogos Paraolímpicos

Os Jogos, embora haja relatos de disputas entre deficientes antes disto, estão associados ao pós-Segunda Guerra (1939-45), para acolher os soldados feridos. Na abertura da Olimpíada de Londres em 1948, o neurologista alemão Ludwig Guttmann, que reabilitava por meio dos esportes os soldados com lesões na coluna, a pedido do governo britânico, organizou a primeira competição em cadeiras de rodas.

A Paraolimpíada estreou em Roma, 1960, com cadeirantes de 23 países. Outras deficiências, como visuais e mentais, foram incorporadas à competição a partir de 1976 e o sistema de classificação pelo tipo e grau de deficiência dos atletas foi em 1988. Nesta Olimpíada, em Seul (Coréia do Sul), a organização passou a ser conjunta com a Paraolimpíada, de modo que hoje, para um país sediar a primeira, tem que ter infraestrutura para sediar a segunda também.

O desempenho do Brasil vem subindo a cada Paraolimpíada. O melhor resultado foi nos últimos Jogos, em Londres-2012, com 21 ouros, 14 pratas e 8 bronzes, na sétima colocação. Na ocasião, nossos paratletas quebraram o recorde anterior, de Pequim-2008, quando, na nona posição, nosso país teve 16 ouros, 14 pratas e 17 bronzes.

Pensar a acessibilidade

Apesar do grande desempenho brasileiro e de traduzir o espírito olímpico em sua essência, a Paraolimpíada acontece às sombras dos holofotes. Nem mesmo a abertura dos Jogos sediados em nosso país teve a transmissão da TV aberta, a mesma que vez ou outra faz reportagens e telenovelas discutindo a acessibilidade.

Segundo dados do IBGE em pesquisa feita junto com o ministério da Saúde, 6.2% da população tem algum tipo de deficiência, que representa cerca de 45 milhões de pessoas com deficiência auditiva (1,1%), visual (3,6%), intelectual (0,8%) e física (1,3%). Deste último grupo (física), apenas 18,4% frequentam serviço de reabilitação.

Para que a vida destas pessoas não se torne olimpíadas diárias, são importantes leis como a que cria o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/ 2015), sancionada por Dilma Roussef, bem como o desenvolvimento de mais e mais políticas públicas que ampliem a acessibilidade nos locais públicos – com calçadas baixas, rampas, espaços para cadeiras de rodas e banheiros especiais – e o ingresso nas instituições de ensino e de trabalho.