Mesmo sem provas, Moro aceita denúncia contra Lula
Criticada até mesmo por adversários do petista e motivo de piada nas redes sociais, a denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apresentada na semana passada pela força-tarefa da Operação Lava Jato, foi acolhida pelo juiz Sérgio Moro nesta terça-feira (20). Assim, Lula se torna réu em uma ação que, como os próprios procuradores confessaram, não conseguiu reunir provas contra ele – está baseada em convicções.
Publicado 20/09/2016 19:28
A denúncia inclui ainda a esposa de Lula, Marisa Letícia da Silva, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto; o ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, e outras quatro pessoas relacionadas à empreiteira: Agenor Franklin Magalhães Medeiros, Paulo Roberto Valente Gordilho, Fábio Hori Yonamine e Roberto Moreira Ferreira. Na decisão, Moro “lamenta” a imputação realizada contra Marisa e diz que durante o processo pode reavaliar se é necessário mesmo levá-la a julgamento.
Lula foi denunciado por lavagem de dinheiro, corrupção passiva e falsidade ideológica. Durante a apresentação, na semana passada, procuradores utilizaram toda a sorte de recursos visuais para desviar o foco do centro da questão: não tinham provas de que o ex-presidente de fato tinha cometido os crimes atribuídos a ele.
Segundo os procuradores, há a “convicção” de que o ex-presidente teria recebido propinas “de forma dissimulada”, por meio de benefícios. Especificamente, nas reformas de um apartamento triplex no Guarujá, e no custeio do armazenamento de seus bens.
Na sua decisão, Moro afirma que, nessa fase do processo, não cabe analisar profundamente as provas, apenas verificar se o conjunto probatório é razoável.
“Nessa fase processual, não cabe exame aprofundado das provas, algo só viável após a instrução e especialmente o exercício do direito de defesa. (…) Juízo de admissibilidade da denúncia não significa juízo conclusivo quanto à presença da responsabilidade criminal. Tais ressalvas são oportunas pois não olvida o julgador que, entre os acusados, encontra-se ex-presidente da República, com o que a propositura da denúncia e o seu recebimento podem dar azo a celeumas de toda a espécie”, escreve o magistrado.
Em um trecho de seu despacho, Moro reconhece que alguns elementos probatórios da denúncia são “questionáveis”, endossando assim as inúmeras críticas feitas à ausência de provas da materialidade do crime e da autoria.
“Certamente, tais elementos probatórios são questionáveis, mas, nessa fase preliminar, não se exige conclusão quanto à presença da responsabilidade criminal, mas apenas justa causa”, diz o juiz.
A defesa do ex-presidente Lula tem apontado que seu cliente sofre perseguição com o objetivo de tirá-lo da disputa presidencial de 2018.
“O MPF elegeu Lula como maestro de uma organização criminosa, mas esqueceu do principal: a apresentação de provas dos crimes imputados. ‘Quem tinha poder?’ Resposta: Lula. Logo, era o ‘comandante máximo’ da ‘propinocracia’ brasileira. Um novo país nasceu hoje sob a batuta de Deltan Dallagnol e, neste país, ser amigo e ter aliados políticos é crime”, argumentou a defesa na ocasião da apresentação da denúncia.
Analistas, juristas, políticos e mesmo opositores do petista têm criticado a partidarização da Lava Jato e a falta de argumentos na peça contra Lula. Até mesmo ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) condenaram a ação, afirmando que ela está perdendo a base e é “espetaculosa”.
O célebre jurista Dalmo Dallari chamou a denúncia dos procuradores de “exibição circense muito espalhafatosa” e questionou: “Por qual motivo, apresentando publicamente e com linguagem pirotécnica uma espetaculosa denúncia, ele [Deltan Dallagnol] não apontou fatos que a justificassem e não fez o enquadramento jurídico da denúncia?”
As críticas se acentuaram após a notícia de que a peça contém uma informação que só aparece no esboço da delação premiada do empresário Léo Pinheiro, que foi recusada pela Procuradoria Geral da República.