Israel rompe com a Unesco e tenta se fazer de vítima

De forma intempestiva e suspeita, Israel recentemente rompeu relações com a Unesco por causa da aprovação de uma resolução no Conselho Executivo da entidade que supostamente nega os vínculos do judaísmo com o Monte do Templo.

Muro de Israel na Palestina - Moara Crivelente

Efetivamente, em suas sessões há poucos dias, o Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) aprovou uma resolução com o título "Palestina Ocupada", na qual se refere à situação atual desse território ocupado à força por Israel.

Horas depois, apareceram as manchetes em diversos meios internacionais segundo os quais o texto negava as relações de Israel e dos judeus com o Har Habayit (Monte do Templo) e o Kotel (Muro das Lamentações).

Chegaram imediatamente de Telavive as reações e o primeiro ministro, Benjamin Netanyahu, argumentou que, com essa postura, "a Unesco perdeu completamente a escassa legitimidade que ainda lhe restava".

O ministro de Educação e encarregado das relações de seu país com a Unesco, Naftali Bennett, dispôs a suspensão de todas as atividades profissionais com essa organização e afirmou que a resolução "dá um apoio imediato ao terrorismo islamista" e é "um prêmio ao extremismo".

Com essas palavras, qualquer um poderia imaginar que o texto aprovado na Unesco é pouco menos que uma declaração de guerra.

No entanto, em suas cinco páginas e 41 pontos, a resolução não faz nem uma referência sequer que desvincule o Monte do Templo e o Muro das Lamentações da tradição judaica.

De fato, nas linhas iniciais que declaram as bases do documento, se reafirma "a importância da cidade velha de Jerusalém e suas muralhas para as três religiões monoteístas", em referência ao cristianismo, o judaísmo e o islã.

Toda a polêmica se armou com a desculpa de que no texto se usa a denominação de "mesquita Al Aqsa/Haram-al-Sharif" para fazer referência a um lugar que os judeus conhecem como o Monte do Templo.

Tal como a diretora geral da Unesco Irina Bokova explicou em um comunicado, em uma Jerusalém caracterizada pela diversidade e a multiculturalidade, os diferentes povos frequentam os mesmos lugares e às vezes lhes atribuem nomes diferentes.

Neste sentido, apontou que a mesquita Ao Aqsa/Haram-al-Sharif é um santuário sagrado para os muçulmanos e é também o Monte do Templo, cujo Muro das Lamentações é o lugar sagrado do judaísmo.

Em vez de negar os vínculos da tradição judaica com esse patrimônio, a resolução defende, pelo contrário, que Israel reconheça e respeite os direitos de palestinos e muçulmanos a terem acesso ao lugar que também é sagrado para sua religião e cultura.

Em resumo, Israel tentou se fazer de vítima quando na realidade ocupa o papel de algoz, como reconhece grande parte da comunidade internacional.

Entre as críticas contidas na resolução da Unesco, se destacam a condenação às constantes agressões de militares israelenses a civis, incluídas personalidades religiosas islâmicas e sacerdotes, bem como as proibições de que muçulmanos adentrem a mesquita.

O texto "pede a Israel, potência ocupante, que respeite o status quo histórico e ponha fim imediato a essas medidas" e também repudia a negativa de visto a especialistas da Unesco que trabalham temas relacionados à mesquita.

A resolução lembrou que "a obrigação de Israel [é] de respeitar a integridade, a autenticidade e o patrimônio cultural da mesquita Al Aqsa/Haram-al-Sharif", e lamentou os prejuízos causados a algumas partes do edifício.

Pouco depois da decisão de Telavive de romper os vínculos, Bokova reafirmou a postura da Unesco em defesa de Jerusalém como uma cidade multicultural e espaço sagrado para as três religiões monoteístas: o judaísmo, o cristianismo e o islã.

"É devido a essa diversidade e à coexistência religiosa e cultural que a cidade foi inscrita na Lista de patrimônio mundial da Unesco", lembrou a diretora em um comunicado.

Para além de uma resolução, as tensões entre Israel e a Unesco remontam ao ano de 2011, quando se aprovou a entrada da Palestina a essa organização como estado membro de pleno direito, um dado que Telavive parece não esquecer.