Indústria pressiona por conteúdo nacional, mas governo quer mudança

Até mesmo apoiadores do impeachment da presidenta Dilma Rousseff começam a se dar conta de que o golpe é também contra a indústria nacional. Entidades representativas de fornecedores de bens e serviços ao setor de petróleo e gás natural do país e federações nacionais da indústria agora pressionam para que Michel Temer não leve adiante mudanças radicais na Política de Conteúdo Local (PCL) do setor de petróleo.

Petrobras

De acordo com o Valor Econômico, diversas entidades enviaram uma carta ao Ministro da Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Marcos Pereira, alertando sobre os danos que representariam às empresas brasileiras o fim da exigência de conteúdo nacional na construção das plataformas e demais equipamentos de exploração de petróleo.

O documento, entregue na última quinta-feira, pede que o ministro analise os “argumentos que comprovam a necessidade de se avaliar, de forma aprofundada, os impactos que poderão ser causados na cadeia de fornecedores em decorrência de mudanças que estão sendo anunciadas na Política de Conteúdo Local do setor de petróleo e gás”.

Os empresários, que pregam menos intervenção do Estado na economia, agora perceberam que podem sair prejudicados, caso tenham que competir com os fornecedores internacionais.

O Valor relata que, apenas no setor de máquinas e equipamentos, estima-se 400 empresas ligadas ao setor de óleo e gás, “as quais poderão suspender investimentos neste momento”. Conforme cálculos das entidades que assinam o documento enviado ao ministro Marcos Pereira, entre 1 milhão e 1,5 milhão de empregados podem ser afetados com o fim do PCL.

Assinam a carta as seguintes entidades: ABCE, de engenharia consultiva, Abemi, de engenharia industrial, Abimaq, de máquinas e equipamentos, Sinaval, do segmento de estaleiros, Instituto Aço Brasil, em siderurgia, Abitam, de fabricação de tubos e Abinee (elétrica e eletrônica).

Além das entidades, também as federações Fieb (Bahia), Fiesp (São Paulo), Fiergs (Rio Grande do Sul), Fiemg (Minas Gerais), Firjan (Rio de Janeiro) e Fiesc (Santa Catarina) estão engajadas no movimento.

A indústria analisa que as medidas anunciadas até agora são boas apenas para as petroleiras, mas prejudicam os fornecedores locais. Segundo a Folha de S. Paulo, as duas maiores federações – Fiesp e Firjan, já fizeram chegar a Temer o recado de que a indútria quer evitar uma mudança brusca nas regras. Elas reagem à pressão das petroleiras, que têm se encontrado com o presidente para tratar do assunto.

Entre os pontos problemáticos, estão a isenção tributária para a compra de equipamentos petrolíferos, através do Repetro, e o possível perdão para as petroleiras que não cumpriram os índices de conteúdo exigidos nos leilões realizados.

Segundo a indústria, o Repetro incentiva a importação, prejudicando os fabricantes brasileiros que não conseguem isenção sobre os equipamentos feitos no Brasil.

A gerente de petróleo e gás da Firjan, Karine Fragoso, diz que a entidade propõe a extensão dos benefícios para os fabricantes nacionais.

Segundo o presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, o programa representou uma renúncia de R$ 10 bilhões por ano entre 2011 e 2013.

Em 2016, o governo recebeu os presidentes globais da Shell, Ben Van Beurden, e da Statoil, Eldar Saetre. O setor afirma que ganharia investimentos de US$ 250 bilhões com as mudanças. De acordo com Velloso, "eles ameaçam com um investimento que só vai acontecer na década que vem. O fechamento de fábricas vai trazer desemprego agora".

O presidente da Petrobras, Pedro Parente, não se mostrou muito sensível aos apelos nesta segunda (24). Segundo ele, as petroleiras não estão "contra a indústria local". Parente afirmou ainda que em nenhum lugar do mundo é possível encomendar 100% às empresas nacionais.

"Não é possível encomendar 100% para a indústria nacional. Precismos tratar esse tema com outra ótica. O conteúdo local tem que fazer parte do debate. E, devido a nossa escala, temos uma grande contribuição a fazer. Estaremos sempre abertos ao diálogo", disse.

Ao tentar se defender das críticas das petroleiras, o ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, disse que "estão enganados aqueles que acham que a política de conteúdo local está sendo discutida para beneficiar as petroleiras".