“Investimos menos em ciência do que os países mais pobres do mundo”

A Pesquisa a e Ciência brasileira tem pedido socorro. Semana passada a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) com a Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino (Andifes) e outras quatro entidades dos setores de ensino, pesquisa, ciência e tecnologia entregaram uma carta ao ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Gilberto Kassab, pedindo que convoque uma reunião urgente do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT).

Tamara Naiz, presidenta da ANPG - .

A urgência é devido a gravidade da situação dos recursos cada vez mais escassos para a CT&I e a necessidade de estratégias e ações no sentido de reverter a crise.

De acordo com os cálculos realizados pelo economista Carlos Frederico Leão Rocha, professor do Instituto de Economia da UFRJ, divulgados pelos organizadores da campanha Conhecimento Sem Cortes, lançada em Junho deste ano por diversas entidades da área, o setor de Ciência e Tecnologia do País vem perdendo cerca de R$ 500 mil por hora, ou mais de R$ 8 mil por minuto, em investimentos federais desde 2015. Um total assombroso de R$ 11 bilhões em cortes. Essas reduções significam uma perda de cerca de 50% do total de financiamento para a produção de conhecimento nesses dois anos.

“Estamos vivendo um quadro de desmonte da universidade pública”, comenta o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) Ildeu de Castro Moreira.

Já na perspectiva dos estudantes pesquisadores em entrevista ao site da UNE, a presidenta da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Tamara Naiz, falou sobre a irresponsabilidade do cortes de bolsas. “Se cortamos agora esses investimentos significa que daqui a muito pouco tempo o Brasil não vai ter condições de responder as necessidades do nosso povo, em bem estar, em promoção de oportunidades. Não foi a toa que conseguimos dar uma resposta ao Zika, por exemplo, foram anos de investimento em pesquisa nessa área”, destacou.

Leia a entrevista na íntegra:

Como está a situação da pesquisa no país atualmente?

Atualmente a situação da pesquisa brasileira é de muita dificuldade e sem garantia de continuidade. Estamos prestes a ver um colapso no Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia pelo corte do financiamento. O governo brasileiro passou em um ano de 1,6 do PIB para 0,5 do PIB. Estamos investindo menos em ciência do que os países mais pobres do mundo e isso é muito lamentável.

Sabemos que o investimento em ciência é importante inclusive para retomar o desenvolvimento econômico, as riquezas, oportunidades, os conhecimentos e o desenvolvimento do nosso país. Vivemos num momento de desconstrução de tudo o que avançamos nos últimos anos e pior ainda do nosso futuro. Se cortamos agora esses investimentos significa que daqui a muito pouco tempo o Brasil não vai ter condições de responder as necessidades do nosso povo, em bem estar, em promoção de oportunidades. Não foi a toa que conseguimos dar uma resposta ao Zika, por exemplo, foram anos de investimento em pesquisa nessa área. Então o Brasil fica despreparado para várias questões desde o surgimento de uma epidemia até a dependência científica e tecnológica de outros países e isso é muito ruim para a soberania, para autodeterminação do Brasil.

Como funcionam os meios de financiamento de bolsas de pesquisa no Brasil?

As bolsas de pós-graduação, mas também as bolsas de iniciação científica e iniciação à docência que são do âmbito da graduação e do ensino médio, além das bolsas de produtividade que são para pesquisadores renomados são financiadas em geral pelas agências federais e pelas fundações de amparo à pesquisa nos Estados, principalmente pelas federais sobretudo a CAPES e a CNPq que são as principais financiadoras da ciência brasileira. Quando o governo corta de maneira transversal todos os investimentos é um pensamento não muito inteligente, porque a gente sabe que tem área que se for cortada deprime ainda mais a economia e reduz a possibilidade de retomar o crescimento ou de gerar conhecimento para superar a crise. Ou seja uma política equivocada e não muito inteligente.

Qual política é necessária para que a pesquisa seja prioridade na educação brasileira?

Para a Pesquisa se tornar prioridade para o Brasil é preciso que tenhamos uma política consistente de financiamento e impeçamos que os cortes sejam feitos abruptamente e a qualquer momento. Porque a Ciência sempre é a primeira a ser cortada, então ter uma política consistente e um projeto de desenvolvimento que coloque a ciência e a educação com centralidade pelo potencial que elas tem de gerar conhecimento, oportunidade e riqueza, é mostrar que há uma prioridade para o desenvolvimento do nosso país.

A gente sabe que esse problema orçamentário do Brasil não é só de falta de dinheiro, é de falta de prioridade. O governo brasileiro nos últimos anos cortou 12 bilhões da Ciência, mas só este ano o governo Temer cortou quase metade do orçamento, sendo que há poucos dias ele antecipou 13 bilhões em emendas orçamentárias para salvar seu próprio pescoço na votação do seu processo de impeachment. Por exemplo, para fechar o orçamento até o final do ano, pagar todas as bolsas, todos os projetos, os institutos nacionais de C&T, o CNPq precisa de 570 milhões e o governo fala que não tem todo esse dinheiro. Ou seja tem 15x mais para dar dinheiro para os deputados do que para garantir o mínimo de funcionamento do CNPq que é fundamental para a Ciência.

Por isso a Comunidade Científica tem que se organizar, se articular, porque não podemos ficar paralisados diante do desmonte do Estado brasileiro, e diante do desmonte das nossas possibilidades de futuro. Nesse sentido integramos a marcha da último dia 17 da Jornada de Lutas da Juventude e convidamos toda a comunidade científica, todos os bolsistas para estarem na marcha pela Ciência no Brasil em que vamos para as ruas para questionar como será nosso amanhã, da Ciência, do Brasil , do povo brasileiro, se esses investimentos continuarem a ser cortados dessa forma.