Alexandre Lucas: Nós, depois a arquitetura e o urbanismo
“As intervenções urbanística e arquitetônica devem ou deveriam sempre considerar a memória, história de ocupação e apropriação dos espaços e as necessidades sociais como elementos centrais para pensar as interferências alinhadas à humanização e à qualidade de vida da população”.
Por *Alexandre Lucas
Publicado 05/10/2017 11:45 | Editado 04/03/2020 16:23

A ocupação criativa das cidades deve fomentar o processo de apropriação dos espaços numa perspectiva de criar elos de integração e organização popular. As relações de identidade e pertencimento com os espaços é o que gesta os lugares. O que requer a devida compreensão de que os espaços não se separam dos sujeitos sociais.
As intervenções urbanística e arquitetônica devem ou deveriam sempre considerar a memória, história de ocupação e apropriação dos espaços e as necessidades sociais como elementos centrais para pensar as interferências alinhadas à humanização e à qualidade de vida da população.
Interferir no espaço é, antes de tudo, interferir na dimensão simbólica do sujeito e nas suas demandas sociais. O que nos coloca diante de refletir sobre o direito social à cidade, ou ainda, o direito de democratização da cidade na suas múltiplas dimensões: mobilidade, acessibilidade de bens e serviços, ludicidade, segurança, comodidade, imaterialidade e inovação tecnológica como fator de desenvolvimento social.
Esses pressupostos partem do princípio de que o direito à cidade é negado a partir do modo de apropriação privada e antagônica de sociedade, que estratifica socialmente e espacialmente os indivíduos.
É preciso redefinir uma arquitetura e um urbanismo de ocupação e definição pelas camadas populares. O que só se define a partir do povo organizado e com consciência de classe. As linhas desconectadas da arquitetura e do urbanismo gestado nos escritórios desassociado da prática social do povo não refletem as necessidades e anseios da população. O viés desta engrenagem não é unicamente técnico, mas essencialmente social.
A arquitetura e o urbanismo da cidade não podem ser um pacote governamental como fórmula universal para cada lugar ou uma maquiagem para o processo de higienização social. As interferências na cidade devem se entrelaçar com o desenvolvimento social, compreendendo o campo conflituoso entre a produção social e a apropriação privada. Em outras palavras, a necessária tomada de posição e de ruptura da estrutura econômica.
O recorte de classe se faz imprescindível e inseparável deste contexto, considerando que não haverá harmonia e nem desenvolvimento social equiparado numa sociedade desigual e sistemicamente baseada para exploração como mecanismo de sobrevivência do modo de produção capitalista.
A luta pelo direito à cidade reveste-se para as camadas populares como uma luta pela democratização econômica e transformação social que possibilite o pensar os sujeitos, as suas utopias e criatividades, antes das cercas, asfaltos e concretos.
*Alexandre Lucas é pedagogo, artista/educador e integrante do Coletivo Camaradas.
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