Juiz da operação Mãos Limpas diz que Moro não poderia sentenciar Lula

Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, o ex-magistrado italiano que atuou na Operação Mãos Limpas, Gherardo Colombo, afirmou que na Itália não seria possível o juiz Sérgio Moro ao mesmo tempo conduzir a investigação e julgar sozinho o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

o-ex-magistrado-italiano-gherardo-colombo-que-atuou-na-operacao-maos-limpas - Reprodução

"Notei que o juiz [Sérgio Moro] que fez a investigação contra Lula é o mesmo da sentença e isso me deixou um pouco surpreso porque aqui na Itália isso não poderia acontecer", disse.

No país europeu existe uma separação: o juiz que conduz a investigação não pode ser o mesmo que julga o processo. E esse mesmo juiz também não pode emitir sozinho a sentença, que tem que ser feita por um colegiado de três pessoas. Moro conduziu sozinho um processo que na Itália seriam necessários cinco juízes diferentes.

O juiz Sérgio Moro diz que se inspira na operação Mão Limpas para atuar na Lava Jato. No entanto, Gherardo Colombo diz que são poucos os pontos que se podem encontrar paralelos.

"Em relação às pessoas contra quem foram aplicadas a custódia cautelar na Itália por parte dos magistrados, há uma outra particularidade que, para mim, é importante, e torna impossível fazer paralelos entre Mãos Limpas e Lava Jato. Existe uma diferença notável sobre o perfil do controle dos magistrados. Na Itália existe o Ministério Público que faz a investigação. Existe o juiz da investigação preliminar que controla a atividade do Ministério Público e que emite todos os procedimentos que restringem em qualquer medida a liberdade como a custódia cautelar na cadeia, as interceptações telefônicas e por aí vai. Quando a investigação termina, um outro juiz, um juiz para a audiência preliminar, decide se vai mandar a julgamento o investigado ou mesmo se recusa a abertura do processo. Mas não é ele que condena porque a condenação só pode ser emitida por um tribunal, que um juízo diferente e para os casos de corrupção é o juízo de um colegiado, composto por três pessoas".

Gherardo Colombo também disse que pessoas não poderiam ser presas para forçar delações premiadas.

"Não existe na Itália um sistema para a corrupção similar ao vosso da delação premiada. Não existe. A delação premiada é um termo que não se pode usar. Nós falamos de colabores de Justiça no campo da Máfia e do terrorismo. A Máfia e o terrorismo são tratados geralmente de um modo muito particular. Não se pode pôr na cadeia uma pessoa para fazê-la falar. Ok? Para contar fatos dos outros", enfatizou.

Ao comentar sobre as prisões preventivas, o magistrado foi enfático: "Não se pode pôr na cadeia uma pessoa para fazê-la falar. Ok? Para contar fatos dos outros. Ainda que esse seja uma distinção muito sutil porque, se uma pessoa se torna não confiável ao sistema de corrupção do qual ela provém, então não se justifica mais a custódia cautelar. Porque não há mais o risco de reincidência, pois os outros não confiam mais nela e não há perigo de fuga porque já confessou e, geralmente, quem resolve contar o que sabe recebe normalmente uma pena que não é grave".

Para ele, num sistema de delação é necessário a prova para se emitir uma sentença. Na sentença de condenação contra o ex-presidente Lula, a principal crítica é a falta de provas para fundamentar a decisão, que se baseia em delações.