Advogados trabalhistas: "Momento é de resistir, sem temor, sem temer"

A Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat) realizou congresso nacional, em Salvador (Bahia), nos dias 11 e 13 de outubro, em que foi aprovado documento que aponta o retrocesso da reforma trabalhista e da agenda econômica do governo de Michel Temer que, segundo a entidade, vai resultar na precarização dos direitos sociais, especialmente os trabalhistas, que atinge toda a sociedade.

Por Dayane Santos

Roberto Parahyba - Abrat - Reprodução

“A Abrat, como entidade nacional, põe-se como trincheira e conclama os advogados trabalhistas à resistência dessas medidas e políticas adotadas e a construir um novo patamar de estágio civilizatório da nossa sociedade, com um governo e um Congresso Nacional representativos dos interesses nacionais, uma imprensa democrática e independente, uma política econômica sustentável que desenvolva a indústria nacional, a geração de empregos, a democratização da distribuição de renda e, principalmente, assegure os princípios e garantias democráticos albergados em nossa Constituição”, defendem os mais de 1.300 advogados trabalhistas de todo o país que assinam a chamada Carta de Salvador.

Em entrevista ao Portal Vermelho, o presidente da associação, Roberto Parahyba de Arruda Pinto, ressaltou que os advogados trabalhistas consideram que a aprovação da reforma (lei 13.467/2017), que começa a vigorar em 11 de novembro, um retrocesso de pelos menos 100 anos.

“A relação do trabalho é desigual em sua essência. Um dos requisitos para caracterizar a relação de trabalho é justamente a subordinação, ou seja, uma das partes tem o poder de disciplinar e decidir sobre a outra. A lei [legislação trabalhista] buscava compensar essa inferioridade econômica e social com uma proteção jurídica. Uma ideia justa para equalizar as relações. No entanto, essa legislação [reforma] está promovendo um retrocesso ao século XIX, frisou Roberto.



Discurso da reforma

Apesar da Justiça Trabalhista ser uma das mais céleres, Roberto lembra que um dos argumentos usados para justificar a realização da reforma era diminuir o número de ações trabalhistas. “De fato foram erigidos vários obstáculos, dentre as várias mazelas da reforma trabalhista, que dificultam o acesso à Justiça do Trabalho, inclusive até a responsabilidade sobre os honorários advocatícios e periciais, ainda que o trabalhador seja beneficiário da assistência judiciária gratuita”, disse.

Para contestar essa medida, Roberto Parahyba cita dados do IBGE que indicam que 72% dos trabalhadores brasileiros ganham até dois salários mínimos. “A imensa maioria está sendo prejudicada e a ideia é de dissuadir os trabalhadores a reaver os valores que têm direito perante a Justiça do Trabalho”, salientou. “Esse era o objetivo e está muito claro, pois aqueles que defendem estão colocando de forma muito clara e despudorada”, acrescenta.

Outro ponto que Roberto rebate é o discurso de litigância de má-fé, ou seja, ações em que supostamente os trabalhadores buscam obter vantagens manipulando os fatos. Ele destaca que, diferentemente do que afirma os defensores dessa tese, a litigância de má-fé não é uma exclusividade da Justiça do Trabalho.

“A litigância de má-fé existe e a própria lei estabelece um remédio processual para punir tal conduta. Isso não justificaria se obstar o acesso à justiça. Se verificar um dado objetivo, vamos constatar que quase metade das ações trabalhistas, dizem respeito a verbas rescisórias, que são direitos taxativamente previstos em lei. São verbas incontroversas. Só isso já desmonta esse discurso”, argumenta.

Temer não tem legitimidade

No documento, os advogados destacam que a reforma trabalhista foi aprovada no âmbito de um quadro político, econômico e social marcado por profundas vulnerabilidades e por um governo “desprovido de qualquer apoio popular, de legitimidade questionada e abalada por uma sucessão de escândalos e denúncias de corrupção e outros crimes”.

A carta afirma que o “grande capital” tem cooptado parte do parlamento, transformando-o “como sua instância deliberativa e não dos interesses nacionais e da população que haveria de ali estar representada”.

O texto também critica a política de ajuste fiscal do governo de Michel Temer, que congelou os investimentos por 20 anos – afetando principalmente as áreas sociais como saúde, educação, segurança, habitação, transporte, entre outras -, e a privatização de empresas estatais, os leilões de jazidas do pré-sal, a outorga graciosa da base militar de Alcântara aos Estados Unidos da América. De acordo com o documento, tais medidas “não vão propiciar a retomada do desenvolvimento do País, nem a inclusão dos mais de 14 milhões de desempregados no mercado de trabalho”.

Momento é de resistir e avançar

“Esse conjunto de medidas e políticas fará com que se aprofundem a desnacionalização da economia, a concentração de renda e o retrocesso social”, enfatiza.

"Exortamos, assim, os advogados e advogadas a que não se constranjam diante dos intentos de nos calar. Não receiem os efeitos da lei ilegítima, nem restrinjam o seu papel de promotores e protagonistas das pretensões da classe trabalhadora e da sociedade brasileira. O momento é de resistir e avançar", completa o documento.

"A luta por uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária pressupõe, necessariamente, uma advocacia trabalhista cidadã, livre de peias, sem temor, sem temer", finaliza.