País tem 13 milhões de desempregados e dados não indicam recuperação
O Brasil possui 13 milhões de pessoas desempregadas. É o que mostra a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada nesta terça-feira (31) pelo IBGE. A taxa de desocupação encerrou o terceiro trimestre em 12,4% – o que significa recuo de 0,6% em relação ao trimestre anterior, mas um aumento de 7,8% no confronto com igual período de 2016. Para o doutor em Economia pela USP Emilio Chernavsky, os números dos últimos meses não indicam uma tendência de recuperação.
Publicado 31/10/2017 18:59
“Esses meses [entre abril e outubro] são de melhora do trabalho mesmo. Foi assim em 2012, 2013 e 2014. Essa melhora, que é pequena, apenas se insere num padrão sazonal esperado, que só não aconteceu nos dois últimos anos, quando o desemprego disparou. Então os números não permitem falar em retomada”, disse o economista.
Segundo ele, após um período de grande ampliação do desemprego, para se falar em retomada, a redução da taxa de desocupação precisaria ser mais rápida. Em contraposição ao discurso otimista do governo, Chernavsky defendeu que uma interpretação mais isenta seria a de que o pior, provavelmente, já passou, mas não há razões para crer em uma recuperação.
“No cenário atual, a perspectiva de real recuperação, como o governo anuncia, é altamente duvidosa. O que se pode falar é que a queda que vinha acontecendo até o início do ano aparentemente se encerrou. A gente está estável, mas em um nível muito mais baixo que o de dois, três anos atrás”, apontou.
Informalidade: menor impacto na economia
Os novos dados do IBGE reforçam o cenário das últimas pesquisas e indicam que a pequena melhoria no mercado de trabalho se dá na informalidade, que implica deterioração das condições de trabalho dos novos empregados.
No trimestre encerrado em setembro, 91,3 milhões de pessoas estavam ocupadas no país. Destas, 22,9 milhões trabalhavam por conta própria, um aumento de 1,8% sobre o trimestre anterior. Outras 10,9 milhões estavam empregadas no setor privado sem carteira assinada, um crescimento 2,7%.
Por outro lado, o emprego formal se manteve estável por mais um período, apesar do aumento do emprego como um todo. Segundo o IBGE, 33,3 milhões de pessoas estão empregadas com carteira de trabalho. Na comparação com o mesmo período do ano passado, houve uma queda de 2,4%. Quer dizer que cerca de 800 mil pessoas perderam o registro na carteira.
“O que tem elevado a taxa de ocupação é o emprego sem carteira e é o trabalhador por conta própria, que indicam a informalidade. Ou seja, é positiva a queda da desocupação, mas ela se dá pela criação de postos de trabalho com menor qualidade”, reconheceu o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo.
Emilio Chernavsky também chamou a atenção para os prejuízos desse quadro. “A alavancagem da renda dos empregos informais é menor, porque eles costumam se pior remunerados e mais instáveis. Como a pessoa não tem previsibilidade da renda, consome menos e não consegue tomar crédito da mesma forma que com um emprego formal. Uma melhora no emprego formal tem impacto maior sobre as vendas, sobre todo círculo virtuoso da atividade. Quando os empregos são informais isso não acontece ou é menor”, destacou.
Reforma trabalhista
O cenário de precarização do emprego já é desolador, antes mesmo de a reforma trabalhista entrar em vigor no próximo dia 11, flexibilizando a legislação que protege o trabalhador. Para o economista ouvido pelo Vermelho, as novas regras podem ajudar a melhorar os números, em detrimento da qualidade dos empregos.
“As estatísticas podem mostrar uma melhora no mercado de trabalho, mas que será apoiada na precarização dos empregos. Vai ficar mais fácil formalizar um trabalhador, mas em condições muito precárias, podendo trabalhar numa jornada reduzida, ganhando menos de um salário, por exemplo”, afirmou.
De acordo com Chernavsky, a combinação da reforma trabalhista com a recessão será perversa para o trabalhador. “Nesse cenário, a reforma é muito negativa porque ela está ampliando a livre negociação entre as partes no mercado de trabalho. E está fazendo isso num momento de recessão e desemprego prolongado, em que uma das partes – o trabalhador – está particularmente fragilizada”, resumiu.
Indicadores ruins
O economista avaliou ainda que, para além do desemprego, outros indicadores econômicos também não autorizam o governo a celebrar a retomada do crescimento. “Os indicadores têm dado informações contraditórias. Um mês vêm melhores; noutro, piores. Particularmente, os do mês de agosto foram negativos, revertendo melhoras de meses anteriores. O que se depreende é que os números de agosto e setembro estão muito próximos daqueles do início do ano. Não podemos falar que está se consolidando uma tendência de retomada”, defendeu.
Para ele, o discurso da equipe econômica de Michel Temer é muito mais “uma declaração de desejos”, que uma realidade. “Seria bom que isso [o crescimento] estivesse acontecendo, mas não está. Os sinais são contraditórios”, completou.
Sem horizontes
E o que pode tirar o país dessa situação, devolvendo os empregos perdidos com a crise? “Investimento público”, respondeu. “Sem investimento público dificilmente sairemos de uma situação de estagnação”, citou, mencionando ainda a importância de manter uma taxa de câmbio competitiva.
Chernavsky ponderou, contudo, que nem uma coisa nem outra está no horizonte do governo Temer, que aposta na iniciativa privada para tirar o país do atoleiro. “O governo espera que, com concessões e privatizações, aconteça um boom de investimentos. Mas isso é muito mais fácil no discurso que na prática”, declarou.
Ele ressaltou que há dois tipos de concessões e privatizações. “Uma coisa é fazer concessões de coisas que já existem, como são as linhas de transmissão, os aeroportos. Essas não envolvem tanto investimento. Nem emprego, ao contrário. Porque pode haver algumas melhorias marginais de gestão, que podem até desempregar”, colocou.
Segundo o economista, o que teria impacto positivo sobre o emprego e o investimento seriam novos projetos de infraestrutura, na área de transportes, por exemplo.
“O problema é que esses novos projetos envolvem pesados aportes de capital e grandes incertezas quanto à demanda por aquilo que se vai produzir e quanto à própria estabilidade do contrato – que são contratos de décadas, com um governo bastante questionado. É normal o investidor ficar com o pé atrás. Então essas concessões são difíceis de ocorrer. O governo, apesar de toda a propaganda, não fez esse tipo de concessão”, reiterou.
Um obstáculo adicional é o fato de a gestão temer ter reduzido o papel de fomento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Como esses projetos precisam de grande aporte de capital, a diminuição da importância um player relevante no fornecimento de capital dificulta ainda mais”, concordou o economista.