A difícil situação dos índios guarani na aldeia Piraí em Araquari
Por Domingos Miranda – Ideias simples costumam ser eficientes pois são mais fáceis de serem colocadas em prática. Foi isso o que fez o advogado e sociólogo Jeison Heiler, professor da Universidade Católica de Joinville. Ele tem levado seus alunos até as aldeias dos índios guarani espalhadas pela região de Joinville para conhecerem a realidade desta etnia tão marginalizada pela nossa sociedade.
Publicado 24/11/2017 16:55 | Editado 04/03/2020 17:13
No dia 16 de novembro eu acompanhei a excursão dos alunos de direito até a aldeia Piraí, no município de Araquari, às margens da BR-280. Aprendi muito com a conversa com o cacique Ronaldo Costa, 41 anos, líder de 23 famílias (150 pessoas), espremidas numa pequena área de dois hectares.
Inicialmente estivemos na escola de ensino básico, com 57 alunos, sob a coordenação da índia Cecília Brizola, As aulas são em guarani e português. Além das disciplinas existentes em qualquer escola urbana, ali também é valorizada a cultura tradicional indígena. Cecília, por exemplo, que trabalha com ervas medicinais, explica aos alunos o valor de cada planta. Ela revela que o desmatamento tem prejudicado o seu trabalho. “Sem mato a gente não vive. Temos cura para tudo, até para o câncer, mas aqui não tem quase nada do que a gente precisa para fazer os remédios”, diz.
Em um amplo salão de pau-a-pique (paredes de barro entrelaçado com paus) e chão batido funciona a área de culto ao Deus Nheanderu. O cacique, antes de começar a falar, acende o seu enorme cachimbo com fumo de corda. Ronaldo Costa explica que a fumaça ajuda a entrar em contato com Nheanderu. Ele falou sobre as dificuldades enfrentadas, tais como o desconhecimento por parte dos brancos – juruá – da sua cultura. “Muitas vezes dizem que nós somos do Paraguai ou da Argentina, mas estas separações de fronteira não existem para nós. Antes da chegada dos brancos toda a região Sul, Paraguai e norte da Argentina já estava habitada pelos guarani. Então não precisamos pedir licença para percorrer nosso território original”, frisou.
O preconceito contra o índio está muito arraigado entre a população. Muitos costumam afirmar que o índio é preguiçoso, mas não entendem que a mentalidade indígena não é capitalista, onde só tem valor quem tem dinheiro. Os habitantes originários viviam da caça e pesca, por isso eles sempre se preocupam em preservar o meio ambiente. “O desmatamento prejudica. Sem mato a gente não vive. Nós estamos preocupados com os brancos que estão cortando todo o mato. Se um dia acabar o mato nós vamos acabar, os rios vão secar”, nos ensina Ronaldo, com o rosto pintado e um cocar na cabeça.
Sem condições de sobreviver com a caça e a pesca, eles são obrigados a comercializar artesanato nas cidades. O cacique conta que plantou uma roça de milho e o dono das terras soltou o gado em cima e acabou com tudo. A grande esperança deles é a demarcação de quatro reservas indígenas, determinada pela Funai, mas embargada pelo Tribunal da Justiça Federal. Esta é uma luta que mobilizou os proprietários rurais das áreas atingidas pela demarcação e que está sendo discutida na justiça. As quatro áreas, num total de 10 mil hectares, estão nos municípios de Araquari, Balneário Barra do Sul e São Francisco do Sul.
A sociedade deveria reconhecer o valor destes indígenas e se solidarizar com a sua luta. Os habitantes da região, quando chegaram os primeiros brancos, eram os índios carijó (também da etnia guarani). Por serem pacíficos, foram presas fáceis para os bandeirantes que os caçavam, aprisionavam e vendiam-nos como escravos em São Paulo. Por volta do século 17 estes indígenas já estavam extintos. Não podemos deixar que isto aconteça novamente com os atuais moradores das reservas Piraí, Pindoty, Tarumã e Morro Alto. Respeitar o diferente é o que nos torna mais humanos.