Ceará é o 3º do Nordeste em violência contra mulher
Em Fortaleza, 27 % das mulheres entrevistadas foram violentadas emocionalmente ao longo da vida
Publicado 24/11/2017 11:41 | Editado 04/03/2020 16:23
Fortaleza ocupa o 3º lugar no ranking das cidades nordestinas que mais registram violência doméstica física contra a mulher; 18,97% sofreram algum tipo de agressão pelo menos uma vez na vida. Os dados foram divulgados, ontem, através de um estudo realizado por meio de uma parceria entre a Universidade Federal do Ceará (UFC) e o Instituto Maria da Penha, contando com o apoio da ONU Mulheres.
A pesquisa, que já está em sua terceira etapa, entrevistou mais de 10 mil mulheres das nove capitais do Nordeste durante os últimos 12 meses. Ela esclarece que violência doméstica é caracterizada por três tipos de agressão: emocional, física e sexual. Mais de 27% das mulheres nordestinas, com idades entre 15 e 49 anos, foram vítimas de violência emocional; 17% sofreu agressões físicas pelo menos uma vez na vida e 7% foi violentada sexualmente.
Segundo o relatório Violência Doméstica e seu Impacto no Mercado de Trabalho e na Produtividade das Mulheres, 27% das mulheres fortalezenses foram violentadas emocionalmente ao longo da vida. O percentual de violência sexual na Capital ficou próximo ao da média do Nordeste, com 6,98% dos casos.
O estudo revela, ainda, que entre as mulheres nordestinas que sofrem agressões físicas durante alguma gestação (6% do universo de 10 mil mulheres), 77% são negras. Além disso, 24% das mulheres negras presenciaram a ocorrência de violência doméstica contra suas mães, um percentual maior do que a mesma situação vivida por mulheres brancas (19%).
Impacto
Os resultados do relatório mostram, também, que 23% das mulheres vítimas de violência doméstica no Nordeste, nos últimos 12 meses, recusaram ou desistiram de alguma oportunidade de emprego nesse mesmo período porque o parceiro era contra. A pesquisa analisou a ação da violência por parte de parceiros e ex-parceiros das vítimas. Os índices são muito próximos entre os relacionamentos antigos e atuais das mulheres em situação de violência.
José Raimundo Carvalho, coordenador da pesquisa e professor da UFC, destaca que essa etapa do estudo identifica a clara transmissão da violência doméstica entre gerações de mulheres. "Cerca de 23% das mulheres adultas, hoje, que sofrem violência, testemunharam agressões em suas famílias. Ou seja, as mães dessas mulheres já sofriam violência em casa. Outro dado alarmante é o número de grávidas que são violentadas, representando cerca de 7% das mulheres no Nordeste", explica.
De acordo com a representante da ONU Mulheres Brasil, Nadine Gasman, o alto índice de violência doméstica contra mulheres nordestinas se deve porque "o Nordeste é uma das regiões com mais desigualdades no País, com machismo arraigado e concentração de população negra".
Ela explica que a pesquisa "capta a complexidade da violência de gênero com recorte racial e geracional, que demanda respostas políticas multisetoriais, como estabelece a Lei Maria da Penha ao evocar ações integradas da saúde, segurança pública, justiça, educação, psicossocial e autonomia econômica", esclarece Nadine Gasman.
Mudanças
No setor público, há propostas de legislação em trâmite na Câmara dos Deputados que preveem a criação de um auxílio às vítimas de violência doméstica. Embora a Lei Maria da Penha já determine a manutenção do vínculo empregatício de mulheres que precisem se afastar do trabalho em virtude de agressões ou situações de risco, o Projeto de Lei nº 296/2013 estabelece que elas recebam apoio financeiro. O projeto é de autoria da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência contra a Mulher.
Atualmente, no entanto, o principal mecanismo legal de auxílio às vítimas de violência doméstica, a Lei Maria da Penha, está ameaçada de sofrer alterações. A principal mudança presente no projeto que modifica a lei, que já foi aprovado no Senado Federal e aguarda a sanção do presidente Michel Temer, é a possibilidade de delegados de polícia concederem medidas protetivas à mulheres em situação de risco, o que, hoje, só pode ser realizado por juízes. A justificativa é de que a alteração vai acelerar a ação de proteção. Para críticos da proposta, contudo, a mudança fragiliza a legislação e dificulta o acesso das mulheres à Justiça, onde podem conhecer e obter direitos.