Jornais ao redor do mundo colocam-se contra o julgamento de Lula

Além das manifestações convocadas em cidades do mundo todo em apoio do ex-presidente brasileiro (Frankfurt, Berlim, Colônia, Munique, Zurique, Paris, Londres, Barcelona, Estocolmo, Madrid, Nova Iorque e Cidade do México) diversos jornais progressistas fazem voz contra o discurso da mídia hegemônica e defendem a ilegitimidade da condenação de Lula

Por Alessandra Monterastelli *

Lula em Alagoas - Ricardo Stuckert

Veículos ao redor do mundo tem noticiado o julgamento de Lula, que acontecerá nessa quarta-feira (24). Especialmente jornais de esquerda e do campo progressista tem relembrado a ineficiência de provas, o perigo da judicialização da política e que o ex-presidente lidera as intenções de voto com larga vantagem para as eleições de 2018. Alguns dos mais notáveis na última semana foram os portugueses Público e Abril Abril, além do jornal comunista italiano Il Manifesto e o portal estadunidense The Intercept .

O jornal português Público lembrou que a defesa de Lula provou que a propriedade não pertence ao ex-presidente, entregando ao tribunal documentos que mostram que o apartamento foi penhorado para pagar dívidas da construtora e, portanto, não pertencia ao petista. A matéria citou uma declaração da pré-candidata à presidência da república pelo PCdoB, Manuela D’Ávila, para reforçar o sentimento de solidariedade que envolve a esquerda brasileira em torno de Lula: “qual é o sentido do presidente mais popular da história, que lidera as sondagens, ficar de fora das próximas eleições?”.

O jornal português ainda cita declarações de Tarso Genro e Manoela D’Ávila quando ambos concordam que “o Brasil vive hoje uma ‘judicialização da política’”. “Os juízes de primeira instância participam no debate político, mostram um posicionamento”, observou o ex-ministro da Educação.

O veículo lembra ainda que “as acusações contra Lula, e o provável impedimento de se recandidatar, inserem-se numa ofensiva da direita e do setor financeiro, com apoio dos principais órgãos de comunicação, para liquidar as políticas sociais aplicadas nos últimos anos pelo Partido dos Trabalhadores”, reiterando que apesar de outros partidos de esquerda terem lançado candidatos para as eleições presidenciais de outubro, todos concordam que “eleição sem Lula é fraude”.

O jornal comunista Abril Abril, também português, dedicou uma matéria inteira ao assunto, com o título de “Solidariedade com o povo brasileiro, frente ao golpe”, onde informou sobre um ato a favor do ex-presidente que ocorreu em Lisboa, onde Manuela D’Ávila (PCdoB) marcou presença. “Na agenda mais imediata dos setores golpistas brasileiros, está a campanha de descredibilização do ex-presidente Lula da Silva pela via judicial”, lê-se na matéria, que também usou a caracterização da Frente Brasil Popular (FBP) para o julgamento: “uma perseguição política com o objetivo de impedir a candidatura às eleições desse ano”.

O jornal citou ainda Gleisi Hoffman, presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), sobre as fases do golpe: “a primeira foi a retirada da Dilma. A segunda, a retirada dos direitos conquistados dos trabalhadores. E agora querem tirar do povo brasileiro o direito de eleger novamente Lula presidente do Brasil”, disse. O veículo também entrevistou Alexandre da Conceição, membro da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que sublinhou a importância da mobilização popular face à tentativa de “impedir que Lula dispute as eleições de 2018, consolidando assim o golpe”.

Por fim, o jornal argumenta que esse cenário de retrocesso vivido pelo Brasil é culpa da “bancada ruralista e golpista” no Congresso Nacional, que aprovou medidas com forte impacto negativo no campo e que conduziram ao favorecimento do grande latifúndio e à mineração, em detrimento do meio ambiente, das comunidades indígenas, dos pequenos agricultores e dos trabalhadores sem-terra, que foram alvo de mais ações violentas, e que a meta do atual executivo é entregar “a agricultura brasileira aos grandes monopólios internacionais”, citando Alexandre da Conceição, “beneficiando os ricos e aumentando ainda mais a pobreza e a desigualdade no Brasil”.

O The Intercept fez diversas matérias para refletir sobre o assunto. No domingo (21), publicou um artigo de João Filho que, pouco a pouco, coloca sobre a mesa todas as provas que evidenciam como o julgamento de Lula é, na verdade, político. “Lula não está sendo julgado com imparcialidade. Não interessa se você acha que Lula é culpado ou inocente”.

Primeiro, o artigo relembra como Moro virou um personagem da mídia, um “super-herói anti-petista mais reacionário” e como nunca abdicou desse status, dando diversas entrevistas, tendo sido premiado, sempre sob os holofotes: “o conceito básico de que ‘não basta o juiz ser imparcial, ele tem que parecer imparcial’ nunca foi uma preocupação de Moro. A capa do super-herói na luta contra a corrupção lhe serviu muito bem”. Depois, João filho cita irregularidades cometidas pelas autoridades durante o processo e, por fim, relembra que o próprio Moro admitiu que o tríplex não tem relação com esquemas de corrupção da Petrobrás.

O jornal comunista italiano, Il Manifesto, também deu a notícia sobre o julgamento. Com ironia, a matéria começa dizendo que “os golpistas brasileiros podem festejar” a “velocidade recorde” com que foi encaminhado o processo do ex-presidente, tendo sido o julgamento marcado para o dia 24.

A matéria reafirma a fragilidade da acusação, baseada essencialmente em informações de delações premiadas, concluindo que “não é difícil entender que a condenação de Lula, indicado como vencedor por todas as sondagens, não seja nada além do cumprimento de uma estratégia golpista que tem comandado golpes duríssimos contra os trabalhadores, os camponeses, os povos indígenas e o ecossistema do país”. Em seguida, o veículo denuncia a perda de direitos para as mulheres e os trabalhadores em geral configurada pelas reformas trabalhista e da previdência.

Por fim, o jornal comunista italiano não deixou de criticar erros cometidos no mandato de Lula, que “garantiu muitas conquistas sociais importantes, mas não conseguiu romper e, portanto, preservou interesses da oligarquia”; mas posicionou-se fortemente contra o julgamento carente de provas e a tentativa dos “golpistas” de impedir o ex-presidente de concorrer às eleições de outubro.