Na contramão, Temer quer se desfazer do Fundo Soberano do Brasil
Para economista, o objetivo do desmonte do fundo, criado para combater efeitos de crises, é alcançar superávit primário; Enquanto Noruega anuncia que vai usar seu fundo Soberano para garantir a aposentadoria das gerações futuras, Brasil avisa que vai acabar com o fundo Soberano e ainda insiste na reforma da Previdência.
Publicado 20/02/2018 19:04
O governo Temer anunciou nesta segunda-feira (19) que irá extinguir o Fundo Soberano do Brasil (FSB). A proposta é uma de 15 pautas da agenda alternativa apresentada pelo governo em substituição ao fracasso da reforma da Previdência que ainda está no radar do Planalto, mas impossível de ser aprovada antes das eleições em outubro.
Na prática, o FSB já estava caminhando para o fim. "Eu tendo a ver a medida como simbólica, pois o fundo já não operava", avalia o economista Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp.
Em maio de 2017, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, anunciou a venda de ativos do FSB, especificamente ações do Banco do Brasil compradas pelo Tesouro em 2010 e que integravam o Fundo Fiscal de Investimentos e Estabilização (FFIE), totalizando cerca R$ 3,631 bilhões.
“Eles [o governo] estão desmontando o fundo pois precisam de 3 bilhões para fechar a conta do superávit primário”, pontua Rossi explicando que o uso do fundo pode ser utilizado na contabilidade das contas públicas para evitar o déficit previsto.
O Fundo Soberano foi criado logo após o anúncio do programa de exploração do pré-sal, em dezembro de 2008, seguindo os mesmos objetivos dos fundos soberanos de outros países: de ser um instrumento financeiro montado para combater os efeitos de eventuais crises econômicas e ajudar em projetos estratégicos do País. No caso da Noruega, por exemplo, a "poupança" soberana inicialmente alimentada por recursos de gás e petróleo hoje garante a aposentadoria das gerações futuras.
Em novembro do ano passado, o fundo nórdico, criado nos anos 90, alcançou 1 trilhão de dólares (o equivalente ao PIB do México), tornando-se o maior fundo de investimentos do mundo. E, o que começou com 300 milhões de dólares da venda do petróleo, conta atualmente com a participação de 9 mil empresas, entre elas Nestlé, Microsoft e Apple, incluindo também a propriedade de áreas valorizadas em Paris e Nova York.
O Fundo Soberano brasileiro começou com sobras do superávit primário equivalentes a 0,5% do Produto Interno Bruto. Na ocasião em que foi criado, o governo aplicou R$ 14,25 bilhões. Um ano depois, em dezembro de 2009, a valorização era de R$ 1,9 bilhão atingindo R$ 16,1 bilhões, aplicados em papéis do Tesouro.
“O fundo foi formado no contexto de visões diferentes do política econômica da Fazenda e do Banco Central”, destaca Rossi, na expectativa de ajudar na condução da política econômica do país.
“O fundo seria um instrumento a mais de política econômica da Fazenda e a ideia era que pudesse atuar com intervenções no mercado de câmbio, coisa que só o Banco Central faz”.
Quando anunciou a criação do FSB, o então ministro da Fazenda Guido Mantega destacou também entre os propósitos financiar empresas brasileiras que investissem no exterior, sem deixar de lado a perspectiva futura de engordar o fundo com parte dos royalties pagos à União pela exploração das reservas do petróleo do pré-sal, nos moldes dos fundos da Arábia Saudita, Emirados Árabes, Noruega.
Na atividade cambial, o FSB deveria ser usado para adquirir moeda externa em momentos de grande fluxo cambial e vender em momentos da saída do capital externo. Outra função seria na estabilização fiscal, acumulando recursos nos momentos de maior crescimento econômico ou de maior preço das commodities, gastando depois em períodos de recessão.
“Mas o fundo nunca operou nesse sentido. Foi formado com 0,5% do PIB de excesso de superávits que acabou sendo investido em ações de estatais como BB e Petrobras”, destaca o economista.
Em 2010, a Secretaria do Tesouro Nacional, gestora do fundo, comprou R$ 12 bilhões em ações da Petrobras obtendo 3,9% do capital da companhia. Dois anos depois, as ações da petroleira perderam 40% do valor e, contrariando a lógica de reter as ações na baixa e vender na alta, o Tesouro Nacional vendeu as ações da Petrobras perdendo R$ 4,4 bilhões.
Na época, o governo alegou que a comercialização ajudou a cumprir a meta de superávit fiscal de 2012 e, ainda, que a União não perdeu dinheiro uma vez que a compra inicial dos papéis beneficiou a economia com investimentos no pré-sal e, em seguida, no cumprimento do superávit primário, abrindo mais espaço para gastos dos estados e municípios. Em 2010, o Tesouro também usou o FSB para comprar ações do Banco do Brasil, quando teve o seu maior valor patrimonial, atingindo R$ 18,7 bilhões.
Em setembro de 2010 o fundo também cumpriu o papel de contribuir com o superávit daquele ano. Em uma operação envolvendo BNDES e o Tesouro Nacional, o FSB comprou indiretamente direitos sobre ações da Eletrobras do governo Federal. Os recursos provenientes da venda foram contabilizados como receita da União.