Trump e Macron, ligados pelos seus interesses

A aversão em relação ao acordo com o Irã por parte de Donald Trump e a sua decisão de retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris, documento referente ao clima da Terra, não afastou Emmanuel Macron. Pelo contrário: o encontro de ambos os presidentes foi envolto em cordialidades e elogios, afinal muitos de seus interesses (como os imperialistas), são parecidos

Trump e Macron

Quando os Estados Unidos bombardearam a Síria nesse mês de maio, como retaliação a um suposto ataque químico que nunca foi provado e começou a ser investigado na semana passada, a França foi o aliado mais decidido dos Estados Unidos: deu seu apoio desde o princípio, adotou o discurso de Washington e acreditou sem hesitar em seus relatórios de inteligência, como lembra o El País.

“A amizade entre nossas nações e nós mesmos é indestrutível”, disse Trump na visita de Estado que fez em julho de 2017 a Paris. “Nosso relacionamento pessoal é muito forte”, reforçou Macron no domingo (22) em entrevista à TV Fox. Macron é o primeiro chefe de Estado a visitar os EUA após a posse de Trump.

Trump, demonstrando seu estridente isolacionismo, tinha causado repúdio mundial ao abandonar o Acordo de Paris contra a mudança climática e ameaçava romper o pacto nuclear com o Irã. Nada disso afetou a reunião. Os dois presidentes não pouparam gestos de amizade e não deixaram dúvidas de seu afastamento de Londres − nem de que a intensa relação que Barack Obama manteve com o Governo da chanceler alemã, Angela Merkel, tinha sido enterrada.

O encontro entre ambos os líderes acontece em um momento delicado: no dia 1º de maio termina o período de isenção decretado por Trump para a inclusão da França, da Alemanha e do Reino Unido na lista de países atingidos pelo aumento de tarifas sobre o aço e o alumínio. E em 12 de maio vence o prazo para renovar o pacto nuclear com o Irã. "Todos conhecem a minha posição sobre o acordo com o Irã. É um acordo horrível", disse Trump durante o encontro, mesmo sabendo da defesa de Macron em relação ao acordo. "É insano, ridículo. Nunca deveria ter sido feito. Mas vamos falar sobre isso”, concluiu.

Apesar da fúria do presidente norte-americano em relação ao Irã, foi provado pelo Relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), divulgado em fevereiro desse ano, que o Irã tem se mantido dentro das restrições impostas pelo acordo nuclear de 2015 firmado com outros países ocidentais, contrariando assim a desconfiança de Donald Trump. Reginaldo Nasser, professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC-SP e pesquisador do INEU (Instituto de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os EUA), destacou em entrevista para o Portal Vermelho no início do mês que o outro argumento usado por Trump contra o Irã, de que o país financia o terrorismo, não faz sentido. "As acusações dos Estados Unidos contra o Irã são completamente infundadas. O país não está envolvido com terrorismo, pelo contrário, ele foi alvo de terroristas. Não existem fatos objetivos contra o Irã", lembra Nasser.

Mas o Irã se tornou uma grande potência no Oriente Médio, o que incomoda muito Israel, antes único destaque da região que, por sua vez, pressiona os EUA graças ao forte lobby presente no Congresso norte-americano. E incomoda também a França, que tem seus interesses na região.

Aliás, Trump também é útil para Macron em outro aspecto: ao deixar de lado certos problemas globais, como a mudança climática, e manifestar sua vontade de se retirar de conflitos em regiões como o Oriente Médio e de assuntos como o programa nuclear iraniano, ele abriu espaço para a França.

No final do encontro, nenhum dos dois líderes quis falar do que foi decidido sobre o acordo nuclear com o Irã, mas Macron ressaltou que podem haver mudanças de acordo com o que foi apontado como insatisfatório por Trump.

Para o americano, uma recepção amigável a um chefe de Estado europeu pode ser vista como uma vitória em comparação com o seu último encontro com a chanceler alemã, Angela Merkel, que também o visitará nesta semana. Já Macron precisa mostrar que pode convencer o presidente americano a se manter como um forte aliado europeu ao manter o acordo com o Irã, como lembra o El País.

Macron também tem usado, assim como os EUA, seu direito de veto no Conselho de Segurança da ONU e Forças Armadas que projetam seu poder em teatros de operações na África e no Oriente Médio. As relações entre os militares de ambos os países têm sido intensas nos últimos anos. Como observado pelo El País, aterrissar em Washington depois da intervenção militar liderada pelos EUA na Síria, na qual a França teve um papel secundário, mas destacado, também ajuda a reforçar a posição do presidente francês.