Marina Valente: Dei um “rolê” com Karl Marx no Brasil atual

“Se me permitirem tamanho acinte criativo, penso que ao se deparar com os ‘memes’ preconceituosos do mundo atual, dispararia irritadíssimo algo do tipo: Acéfalos do mundo, desuni-vos!“

Por Marina Valente*

Karl Marx Moderno - Ilustração: O Povo

Os conservadores do Brasil atual têm por hábito deslocar Marx de seu tempo, assim como o fazem com muitos pensadores para, como acéfalos que são, transformarem recortes de seu pensamento como “a religião é o ópio do povo” em coisas do tipo “comunistas não gostam de cristãos”. O fato é que eles andam convidando Marx para esse passeio aos dias atuais, mais vezes do que gostaria que fizessem e do que gostaria que o campo progressista convidasse.

Às vezes eu resolvo fazer esse tal convite com a certeza de que Marx está mais atual do que nunca, e que 200 anos passados entre seu nascimento e os dias atuais, deixaram, por assim dizer, o “cabra” mais jovem.

Penso nele andando por aqui, nas ruas de Fortaleza, e diante do perfil do homem por de trás do pensamento, já descrito em tantos livros. O idealizo ainda jovem, parafraseando Belchior, de “cabelo ao vento” com “gente jovem reunida” (Como nossos pais), e coloco alguns volumes debaixo de seu braço, sentado numa mesa de alguns dos nossos bares universitários, pedindo a “pindura da conta” discutindo, com certo afinco, as questões nacionais.

Lembro de escrita, do jornalista Marx, e reflito que possivelmente ele estaria analisando profundamente questões factuais como o fez no “Caso do navio Trent”. Talvez um tanto irritado com certa “pelegagem” escreveria algo mais áspero e um tanto irônico, que expusesse nossa limitada visão. O que diria ele diante de certas reflexões que circulam sem beber nas tantas fontes que ele sempre buscou? Na verdade, não andamos bebendo nem na fonte de Marx.

Se me permitirem tamanho acinte criativo, penso que ao se deparar com os “memes” preconceituosos do mundo atual, dispararia irritadíssimo algo do tipo: Acéfalos do mundo, desuni-vos!

Mas não pensem que imagino um homem de pouca paciência. Na verdade, reflito que Marx jamais deixaria de lado uma determinada leitura só porque ela trafega por péssimos conceitos. Ele mesmo refletiu (se me permitirem a simplificação) que a censura costuma abrir espaço para a curiosidade à leitura dos mais diversos títulos (ler Debates sobre a liberdade de imprensa e comunicação, Marx, 1843).

Como Hegel, ele jamais ignoraria o pior dos pensamentos, tentando buscar dele o que existe de verdade e se colocando com algoz intelectual de toda parte que não presta (Prefácio da Fenomenologia do Espírito, Hegel, 1807). Saberia Marx que aquilo que chamamos de “coxinhas” são reflexo de um tempo assim como suas ideias. E, nesse caso, um tempo tomado do mais nefasto capitalismo. Combateria então as ideias retrógadas a fim de conscientizar os que por ela são enganados e aqueles que elas produzem.

Vejam só, eu acho que Marx gritaria “fora Rede Globo!” e se zangaria com o fato de a esquerda não ter criado, até hoje, um jornal nacional forte e qualificado. Estamos falando de um gênio que pensou em criar uma agência de notícias, anos antes que uma fosse realmente criada.

Visionário, ele saberia que “tudo passa, tudo sempre passará”, e cantarolaria Lulu. “A vida vem em ondas, como o mar… Num indo e vindo infinito” (Como uma onda), possivelmente rindo um pouco do fato da dialética ter se tornado tão sonora. E, dessa forma, tentaria nos mostrar que toda essa mercantilização dos valores humanos não está com nada e que “em breve tudo pode acontecer”, e sorriria dizendo que “precisamos todos nos rejuvenescer!” (Velha Roupa Colorida – Belchior).

E para isso ele nos diria que a briga miúda entre os que compõem o campo progressista é uma grande bobagem. Ele, mais do que nós, saberia que cada uma tem uma ideia boa e que o melhor de cada, deveria ser aproveitado. Foi o que ele fez, juntando o que acreditava servir do socialismo utópico, da filosofia alemã e da economia inglesa, incluído liberais como Adam Smith.

Diria “Proletários do mundo uni-vos”! E “Bora” acreditar nas mudanças. Quem sabe, vocês não convidam Marx também para dar uma volta por aí. Pode ser que ele diga coisas diferentes do que disse para mim. Pode ser que ele diga que eu sou um “pequeno Wilhelm”! Não sei gente boa, mas só saberá quem também convidar.

*Marina Valente é jornalista sindical. (Com a contribuição de Esdras Gomes)

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