Estados Unidos, uma eleição que pode criar dificuldades para Trump
A eleição que vai ocorrer nesta terça-feira (6) nos EUA será um duplo teste – para Trump e para o socialismo democrático.
Por José Carlos Ruy*
Publicado 04/11/2018 21:05
O primeiro teste será o da popularidade do presidente Donald Trump; depois, a aceitação daquilo que lá eles chamam de socialismo democrático.
A disputa para a Câmara dos Representantes (435 deputados federais), um terço do senado (35 vagas estão em disputa), além de eleições locais, pode representar uma derrota para Trump, nesta eleição de meio do mandato do presidente e que, tradicionalmente, é desfavorável aos chefes do executivo.
A grande expectativa é em torno daquilo que muitos tem chamado de "onda democrática", ou “onda azul”. Muitos esperam que prevaleça, com a eleição de uma Câmara e um Senado dominados pelo Partido Democrata, retomando o domínio do cenário político perdido desde a eleição de Trump em 2016, quando os Republicanos alcançaram a maioria nas duas Casas, além de terem conquistado a presidência da República. A maioria conquistada na Câmara é grande (241 republicanos e 194 democratas), mas no Senado é frágil – 51 Senadores, contra 49 da oposição democrata.
O que está em jogo é o estilo duro e criticado de Trump, que encontra forte oposição entre os estadunidenses. E há também aqueles que estão satisfeitos com os rumos da economia dos EUA, que dá sinais de crescimento e geração de empregos, embora sem recuperação da renda dos trabalhadores.
"Parece cada vez menos provável que os democratas conquistem o Senado", diz David Lublin, professor da American University de Washington. Outro especialista, que tem opinião oposta, é Kyle Kondik, da Universidade da Virgínia. Para ele "os democratas estão contando com muitas oportunidades para recuperar a Câmara, mas menos no Senado". Mas explica: "a Câmara e o Senado parecem se dirigir a resultados diferentes, o que complica a ideia de uma “onda azul” democrata.
Caso alcancem a maioria na Câmara, os democratas poderão criar grandes dificuldades para Trump. Poderão investigar ações do governo, deixar de aprovar leis do interesse do Executivo e inclusive dificultar a votação do orçamento.
Se conseguirem reeleger seus 194 deputados e conquistar ao menos 24 novas vagas, os democratas alcançarão a maioria na Câmara. Uma conquista que muitos analistas consideram provável.
Para o Senado, a dificuldade para os democratas será eleger 26 entre as 35 vagas em disputa, muitas delas em estados onde os republicanos, e Donald Trump, venceram em 2016.
O presidente, com seu estilo falastrão, participa da campanha eleitoral tentando caracterizar os democratas como “radicais".
Trump abusa do sentimento conservador, antisocialista, anticomunista que há nos EUA, embora em aparente declínio. E o usa eleitoralmente contra os socialistas democráticos cuja visibilidade cresce nesta campanha eleitoral.
Crescimento que permite a previsão de que a novaiorquina de 28 anos de idade, Alexandria Ocasio-Cortez, será eleita para a Câmara, juntamente com outros socialistas democráticos que poderão compor uma bancada mais afinada mais com a sociedade e menos com os interesses financeiros que dominam o cenário nos EUA.
Alexandria Ocasio-Cortez, de ascendência latina, poderá vir a ser a parlamentar mais jovem a ser eleita este ano. Ela se tornou notável quando, nas primárias para esta eleição, derrotou um democrata veterano, Joe Crowley, defendendo um programa que, nos EUA, é considerado socialista e “radical”: igualdade social, distribuição de renda e críticas ao modelo capitalista americano.
Programa defendido pela ala mais à esquerda do Partido Democrata, que tem , calcula-se, mais de 60 candidatos nesta eleição. Usando a legenda do Partido Democrata, são membros da DAS (sigla em inglês para Socialistas Democráticos da América).
A ideia socialista tem crescente aprovação nos EUA, sobretudo entre os jovens, que não compartilham da aversão antisocialista difundida desde os tempos da guerra fria e do enfrentamento com a União Soviética, que deixou de existir faz um quarto de século. Uma pesquisa do Instituto Gallup, divulgada em agosto passado, mostrou que 37% dos estadunidenses são favoráveis ao socialismo, número que é muito maior entre os jovens (18 a 29 anos), entre os quais mais da metade (51%) são favoráveis ao socialismo; já entre os mais velhos, com mais de 60 anos de idade, apenas 28% aceitam o socialismo.
O crescimento da DAS nos últimos anos é um retrato desta realidade. Ela passou de: 6 mil associados em 2015, para 49 mil neste ano.
O programa que defende não é propriamente socialista, e pode ser definido como social-democrata, como aquele praticado por muitos países europeus depois da Segunda Grande Guerra, e que foi posto em xeque depois da ascensão do neoliberalismo de Ronald Reagan e Margareth Thatcher, no início dos anos 80.
Ele prevê um programa de saúde pública gratuita para todos; fim da cobrança de taxas no ensino superior; legislação trabalhista com mais poderes para regular as relações patrão-empregado; salário mínimo de US$ 15/hora; fim da Polícia de Imigração e Alfândega (ICE) e sistema seguro de documentação de imigrantes; controle das ações que prejudicam o meio ambiente. São medidas democráticas, de caráter anti-neoliberal, que teriam forte impacto na vida dos habitantes dos EUA, sobretudo os mais pobres.
O medo é a arma usada por Trump e a direita contra este visível crescimento da aceitação do socialismo nos EUA. Ele está presente por exemplo um artigo publicado por Trump no jornal “USA Today” onde diz que, no caso da vitória democrata para o Congresso, os EUA estarão “perigosamente mais perto do socialismo”. E continuou: “Os novos democratas são socialistas radicais que querem modelar a economia da América como a Venezuela”. Lá como cá a Venezuela é o espantalho agitado pela direita para amedrontar incautos…