Luciana Santos: resistência, amplitude e sagacidade

No discurso de abertura da 4ª reunião do Comitê Central, na noite da sexta-feira (30), a presidenta nacional do PCdoB, deputada federal Luciana Santos, fez uma longa e detalhada avaliação das conjunturas internacional e nacional, destacando as tarefas que cabem ao PCdoB na nova etapa que se inicia na política brasileira, depois da vitória eleitoral da direita e da escolha do conservador Jair Bolsonaro para a presidência da República.

Por José Carlos Ruy*

Luciana Santos - Foto: Teddy Falcão/Portal Vermelho

“Esta certamente será uma reunião histórica”, disse a dirigente comunista referindo-se a um dos pontos de pauta, a incorporação ao PCdoB do Partido Pátria Livre, cuja aprovação é prevista para ocorrer no Congresso do partido, neste sábado (1º). Histórica também pelo esforço coletivo de “analisar o caráter do novo governo que se forma, sob o comando de Jair Bolsonaro” e os fatores que contribuíram para sua vitória. E também pelo debate sobre a tática dos comunistas nesta nova etapa, e a construção da resistência.

O objetivo da reunião, disse ela, é preparar as forças do Partido para “o enfrentamento inteligente, o combate na esfera da luta de massas, na disputa de ideias e na ação institucional, principalmente nos parlamentos”. O desafio é “construir um amplo, flexível e diverso movimento em defesa da democracia. A luta que se avizinha é de grande envergadura e a política é o campo da disputa”, disse.

A questão central de nossa época, disse ela, é encontrar a alternativa “para este modelo cada vez mais excludente e autoritário, e que coloca em cheque a própria vida humana. A luta por uma alternativa anticapitalista, sob a forma e as condições do nosso tempo, a luta pelo socialismo”. Este é o objetivo estratégico “que orienta o nosso programa que, focado na realidade brasileira, se dá através da nossa luta por um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento”.

E continuou: “diante desta nova ordem, devemos atualizar nossa tática, refletir sobre as formas de fortalecer a resistência, e atuar com amplitude e sagacidade”. O debate que se inicia, disse ela, será levado a cabo nos próximos meses que antecedem o início do governo Bolsonaro.

“Resistência, amplitude e sagacidade. São estas as chaves para atuarmos neste novo tempo” disse a dirigente comunista. “Resistência para fazer frente a um governo de ruptura, que instala uma nova ordem; amplitude, pois devemos reconhecer que somente com um amplo movimento político poderemos fazer frente a esta nova ordem; e sagacidade para saber explorar as contradições no seio dos adversários”.

É um esforço de atualização com tarefas nas três esferas de ação do PCdoB: a luta de ideias, a frente de massas e a luta institucional. São esferas sinérgicas, disse. “Ou não é nos movimentos sociais que existe um intenso debate de ideias nos dias de hoje?”, indagou.

Na luta de ideias é necessário desvendar com mais profundidade as transformações que ocorrem na sociedade brasileira e no mundo e “permitiram a emergência do fenômeno Bolsonaro, suas contradições e limites. Isto deve contribuir para nossa atuação política e para o enfrentamento político e ideológico”.

Na frente de massas será necessário pensar de modo aberto e criativo as “formas de resistência e de convergência da ação, e “entre os trabalhadores e setores não organizados”, assegura. “Debater o papel das articulações dos movimentos sociais, definir estratégias comuns e amplas agregando setores mais amplos como as associações profissionais, igrejas, além de intelectuais, artistas entre outros”.

Reforçou seu argumento lembrando o rico debate ocorrido nesta sexta-feira (30) no Fórum dos Movimentos Sociais, que deu “início um processo de debates sobre nossa atuação. Construir sinergias entre nossos movimentos, criar territorialidade em nossas esferas de atuação. Esta reunião do Fórum reinaugura um processo de debates sobre nossa atuação nos movimentos sociais. Jogar mais juntos nas esferas de atuação, e construir territórios. Temos duas grandes causas: educação e saúde pública, que deveriam ser verticalizadas e horizontalizadas”.

Nesta nova etapa, a frente institucional ganha ainda mais relevância. “Seja a atuação na Câmara dos Deputados, seja nos governos locais e em nossa presença nos governos estaduais. Estes postos serão posições estratégicas da luta política no próximo período”. E lembrou: “nossa primeira tarefa nesta esfera será a eleição da presidência da Câmara, buscando garantir que seja um espaço onde prevaleça a política e a autonomia do parlamento”. E não um mero joguete político manejado pelo presidente conservador, Jair Bolsonaro.

“O núcleo central da nossa tática”, disse, “será o esforço de trabalhar na criação da convergência com todos os democratas, que tenha como centro a defesa da democracia e do Pacto Constitucional de 1988”.

A amplitude desta frente de resistência é fundamental. “A radicalidade que podemos dar na oposição a Bolsonaro é no tamanho da amplitude que possamos dar a um movimento de contestação. Uma amplitude política e social, reunindo forças heterogêneas, em uma Frente Ampla Democrática, que tenha como programa a Constituição de 1988. Na Carta Magna estão os fundamentos do processo civilizatório da nação brasileira, a síntese dos elementos progressistas que superaram etapas históricas e derrotaram governos autoritários e regimes ditatoriais”.

O grande desafio “deste amplo movimento deve ser a defesa do Estado Democrático de Direito, como pré-condição para se estabelecer o debate sobre as propostas para tirar o país da crise econômica e política”.

Para Luciana, a soma de outras reivindicações, como a defesa dos direitos e das conquistas sociais, a defesa da soberania nacional e das liberdades – vai requerer desprendimento, flexibilidade nas formas e paciência para a construção deste movimento. “Este deve ser o nosso centro gravitacional. O importante é criar convergência com amplos setores, com visões dispares em alguns aspectos, uma frente heterogênea, que aglutine um amplo leque de forças políticas, sociais, econômicas, culturais, com o objetivo de impedir retrocessos democráticos.”

Terão papel de destaque na construção deste movimento “nossas lideranças, entre elas, nossa Manuela d´Ávila e o governador Flávio Dino, expoentes de primeira linha nos esforços e articulações da conformação desta Frente. O povo deu o rumo e o norte no segundo turno, é este o caminho que devemos seguir”.

Diante do novo quadro que se abre, onde predominam as forças conservadoras e de direita, é necessária a a união de amplas forças, políticas, sociais, culturais, diz ela, “com vistas a criar um movimento em defesa da democracia, da soberania e dos direitos, que tenha como programa a Constituição de 1988. Será uma resistência que se desenvolverá nas lutas, no debate de ideias e nos âmbitos institucionais em que atuamos, com atenção especial ao parlamento”.

Ao lado do cumprimento destas tarefas, o PCdoB se movimenta também em busca de soluções políticas e jurídicas que permitam superar os efeitos restritivos da antidemocrática cláusula de desempenho (de barreira). “Isso é importante para que possa melhor desempenhar suas responsabilidades assumidas com a Nação e a classe trabalhadora em seus quase cem anos de história”.

Luciana Santos definiu, em seu discurso, a envergadura da tarefa que cabe aos comunistas no enfrentamento aos atentados contra a democracia, os direitos do povo e a soberania nacional que, tudo indica, marcarão o governo da direita, que terá início no próximo 1º de janeiro e vai – todos sinais apontam para isso – aprofundar as mazelas cometidas pelo governo do golpista Michel Temer.