Teto de gastos fica inviável a partir de 2022, prevê economista

Segundo Daniel Couri, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, o projeto da LDO mostra que, em 2022, para cumprir o teto, gastos discricionários teriam de ser de R$ 85 bilhões. Essas despesas, no entanto, nunca ficaram abaixo de R$ 128 bilhões.

Em artigo publicado nesta terça-feira (28) no Valor Econômico, o diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado Federal, Daniel Couri, avalia que manter o teto de gastos – mecanismo de controle que limita os gastos públicos federais por 20 anos – se tornará inviável a partir de 2022. Mesmo com a pandemia do novo coronavírus, a Covid-19, o governo federal não cogita flexibilizar a regra, que drena recursos para investir em áreas como a saúde e a educação.

Couri ressalta que, em 2020, o teto não trará problemas para o governo. “Os serviços públicos (ainda) funcionam e as despesas com a Covid-19 estão sendo pagas à conta de créditos extraordinários, não computados no teto”, destaca.

O economista lembra ainda que, este ano, a meta de resultado primário está suspensa pelo Decreto Legislativo nº 6/2020, o decreto de calamidade. Além disso, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2020, que cria o chamado “Orçamento de Guerra” e está em vias de ser aprovada, suspende a regra de ouro durante o estado de calamidade.

O Ministério da Economia também conseguiu acomodar as coisas para 2021, com uma meta de resultado flexível, que será a receita arrecadada menos a despesa definida no teto de gastos.

Por sua vez, diz Couri, a regra de ouro – que veda o financiamento de despesas correntes com dívida – tem contado com disciplina própria na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e não tende a ser um problema real. O combinado tem sido que o orçamento pode ser elaborado em desequilíbrio, mas parte dele só será executada com autorização de maioria absoluta do Congresso Nacional.

“Contudo, 2021 deve ser o primeiro ano realmente desafiador para o teto. Os gastos discricionários – principalmente funcionamento da administração e investimentos – deverão ceder ainda mais espaço aos gastos obrigatórios”, alerta o economista, que prevê ainda a necessidade de aumento de gastos no ano que vem como rescaldo da crise.

O próprio governo federal já anunciou, à revelia de Paulo Guedes, o programa Pró-Brasil, que prevê estímulo à recuperação econômica com gasto público. “Tão vazio quanto ambicioso, [o programa] promete ampliar investimentos públicos nos próximos anos”, afirma Daniel Couri.

Ele cita também a possibilidade de ampliação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e de transformação do auxílio emergencial aos mais vulneráveis em política de Estado.

“O Congresso aprovou pela terceira vez desde março a ampliação do critério de renda familiar para concessão do benefício: passaria de um quarto para meio salário mínimo per capita. As duas primeiras tentativas foram vetadas. A terceira aguarda apreciação do presidente. O gasto adicional pode chegar a R$ 20 bilhões. Há ainda a possibilidade de que o auxílio emergencial aos mais vulneráveis seja o projeto-piloto de instrumentos mais amplos de proteção social. Duas opções na mesa são a são a renda básica da cidadania, criada em 2004 e nunca implementada e o benefício universal às crianças, já aprovado pelo Senado Federal”, afirma.

Segundo Couri, por essa série de razões, a IFI avalia como “elevado” o risco de descumprimento do teto em 2021. Em 2022, diz o economista, o cumprimento ficará “inviável”. “Se, fora do governo, esse já era um prognóstico relativamente comum, hoje ele consta das próprias projeções oficiais”.

Ele ressalta que o anexo de metas fiscais do projeto da LDO enviado ao Congresso este ano mostra que, em 2022, para cumprir o teto, os gastos discricionários (gastos não obrigatórios, de custeio da máquina pública e investimento) teriam de ser de R$ 85 bilhões, ou 1% do PIB. O economista lembra que esses gastos nunca encerraram o ano abaixo de R$ 128 bilhões, ou 1,8% do PIB.

“No início de 2019, os bloqueios nessas despesas, que levariam o gasto a algo próximo de R$ 100 bilhões no ano, geraram uma onda de protestos na educação”, lembra. Para 2023, afirma, o cenário do PLDO é ainda menos crível. Para viabilizar o cumprimento do teto, os gastos discricionários teriam que somar apenas R$ 69 bilhões, cerca de 0,7% do PIB.

Fonte: Valor Econômico