Zumbi, Alcione e o Racismo

Imagino que Zumbi dos Palmares não está muito preocupado com a opinião do atual presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, sobre o seu papel na História. Os documentos provam a estatura da sua grandeza épica. Zumbi é uma personagem que, com certeza, viveu contradições. Porém, estas não diminuem a força da luta a favor da cultura e etnia de seus povos. Ele foi um rebelde valente.

Mas chamar Zumbi de “filho da puta” e “vagabundo” é impróprio. É um ato contra as normas do Estado do Brasil, que guarda o seu nome no Panteão da Nação na Praça dos Três Poderes, em Brasília.

Entendo a preocupação da Alcione, uma das maiores vozes da nossa música popular, com essa agressão a um símbolo oficial do país. No entendimento dela, insultar Zumbi é insultar a nossa bandeira, a nossa Pátria e as nossas tradições.

O presidente da Fundação Palmares não se conteve, respondeu a Marrom afirmando que a obra dela é insuportável e que preferia no seu lugar a genial Jessye Norman, artista falecida recentemente. Curioso que a soprano americana tem muito mais proximidade com a visão da nossa Alcione, a respeito da luta contra o racismo e defesa dos negros que lutaram contra a escravidão, do que com a visão de Sérgio Camargo.

Leiam o que ela disse a jornalista Eva Joory, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, em 5/12/94: “O que tenho a dizer sobre o racismo é que é um fato da vida. Não importa o quão talentosa, educada ou habilidosa uma pessoa possa ser, o racismo existe. É preciso entender que se não fizermos nada contra racismo, ele irá nos destruir”.

Sim, Jessy Norman foi uma pessoa maravilhosa na cena artística e tinha uma visão exata da importância da consciência negra na luta contra o racismo nos EUA. Sim, Alcione é uma pessoa maravilhosa na cena artística e tem perfeita visão da importância da consciência negra no Brasil. Quanto ela já sofreu de agressões por ter a pele negra!

Falta a Fundação Palmares tomar jeito e cumprir seu papel institucional em defesa da população negra marginalizada em nosso país. Promover inclusão. Nunca ofender cruelmente um símbolo de nossa nação, de nossa identidade, de nossa terra – da Bandeira do Brasil.


LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).

Fonte: Tribuna da imprensa livre

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