Médicos repudiam pressão pelo uso do “kit covid”

Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto lança nota de repúdio à pressão pelo uso do “kit covid”

kit covid

Assinado por 25 gestores, o documento destaca que as instituições do Complexo Acadêmico da FMRP, HCFMRP e Faepa estão comprometidas com o bem-estar da comunidade e com o combate à grave pandemiaEditorias: Campus Ribeirão PretoUniversidade – URL Curta: jornal.usp.br/?p=3456980

O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP lançou nesta quarta-feira, 12 de agosto, nota de repúdio a atitudes de órgãos de imprensa e a postagens em mídias sociais que acusam de irresponsabilidade os serviços públicos de saúde pela não adoção dos chamados “kits covid”. O documento é  assinado por 25 autoridades que compõem os órgãos gestores do chamado Complexo Acadêmico de Saúde, que reúne a FMRP, o Hospital das Clínicas da FMRP e a Faepa (Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência do HCFMRP), que inclui os Hospitais Estaduais de Ribeirão Preto e das cidades de Serrana e de Américo Brasiliense, além do Centro de Referência da Saúde da Mulher Ribeirão Preto (Mater). Leia abaixo a nota na íntegra.

Nota à imprensa

Nós, abaixo assinados, professores, médicos, diretores, chefes de departamentos e demais profissionais da saúde da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP) e das entidades gerenciadas pela Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência (Faepa) vimos a público manifestar nosso repúdio às insinuações expressadas por certos órgãos de imprensa e nas mídias sociais no sentido de que estaria ocorrendo irresponsabilidade dos serviços públicos de saúde pela não adoção dos chamados “kits covid”, que, de acordo com a opinião manifestada nesses veículos, seriam eficazes na prevenção das formas graves da covid-19. Para tanto, são propalados conteúdos com repetidos exemplos de cidades do Brasil onde, de acordo com opiniões de prefeitos e moradores, resultados favoráveis têm sido obtidos com a distribuição populacional desses medicamentos.

Cumpre esclarecer que estas opiniões não têm embasamento científico robusto, tendo sido refutadas por estudos bem recentes, metodologicamente muito bem conduzidos, que, unanimemente, apontam completa ausência de efeito protetor ou curativo de drogas como hidroxicloroquina e azitromicina em qualquer fase evolutiva dos casos de covid-19.

Com base unicamente na opinião de alguns, tais informações defendem ainda a utilização de produtos como ivermectina, nitazoxanida, zinco, vitamina D e ozônio, nunca submetidos a estudos controlados, agredindo o bom senso e as modernas práticas científicas. Além da falta de qualquer suporte científico à utilização desses medicamentos, que justificassem sua distribuição para a população, os benefícios apregoados em algumas cidades não resistem minimamente a uma comparação objetiva de indicadores epidemiológicos da covid-19, com outras cidades de população similar que não os utilizam.

A insistência em transmitir ao público estas falsas informações constitui grave irresponsabilidade por parte dos criadores desses conteúdos e de alguns órgãos da imprensa, posto que levam a opinião pública a acreditar em soluções pretensamente milagrosas e a ingerir drogas que, além de ineficazes para a covid-19, possuem efeitos colaterais potencialmente graves. E ainda mais, a experimentar uma falsa sensação de segurança que possivelmente leve a um relaxamento das medidas comprovadas cientificamente como de alto impacto na interrupção da cadeia de transmissão, como o distanciamento social, o uso contínuo de máscara e a correta e constante higienização das mãos.

Ressaltamos que, com os recursos que temos disponíveis e com o grande esforço e engajamento das equipes hospitalares e administrativas, os resultados assistenciais obtidos pelos hospitais do Complexo HCFMRP-USP-Faepa demonstram um cuidado seguro e de qualidade aos pacientes internados por covid-19, comparáveis aos dos melhores hospitais do Brasil e de países desenvolvidos.

Adicionalmente, o protocolo de manejo de pacientes com covid-19 do HCFMRP é frequentemente revisado por uma equipe de especialistas, e também atualizado de acordo com as mais recentes publicações científicas e boas práticas médicas.

Finalmente, temos um compromisso firmado com a Sociedade que nos leva a utilizar os melhores tratamentos disponíveis e não nos furtaríamos em ofertar esses medicamentos se houvesse a menor base que os justificasse.

Ainda que se deva respeitar o direito de cada profissional médico em prescrever a medicação que julgar adequada para seus pacientes, assumindo individualmente a responsabilidade pelos seus atos, não se pode compactuar com políticas públicas que destinem recursos substanciais para tratamentos sem comprovação de sua eficácia, ao invés de aplicá-los em equipamentos e terapêuticas já consolidados para o enfrentamento dessa grave doença.

Que fique claro, portanto, que este tipo de informação é altamente danoso à comunidade e produz um enorme desserviço aos esforços das instituições de saúde comprometidas com o bem-estar da comunidade e com o combate à grave pandemia pela qual passamos.

Ribeirão Preto, 12 de agosto de 2020.

Prof. Dr. Rui Alberto Ferriani, diretor FMRP-USP e presidente do Conselho Deliberativo HCFMRP

Prof. Dr. Jorge Elias Júnior, vice-diretor FMRP-USP

Prof. Dr. Antônio Pazin Filho, diretor de Atenção à Saúde HCFMRP

Prof. Dr. Benedito Carlos Maciel, superintendente HCFMRP

 Prof. Dr. Valdair Francisco Muglia, diretor científico Faepa

Prof. Dr. Ricardo de Carvalho Cavalli, diretor executivo Faepa

Profa. Dra. Elaine Christine Dantas Moisés, diretora geral CRSMRP-Mater

Prof. Dr. Wilson Salgado Júnior, diretor do HE Ribeirão

Dra. Maisa Cabete Pereira Salvetti, diretora geral HE Américo Brasiliense

Prof. Dr. Marcos de Carvalho Borges, diretor geral HE Serrana

Prof. Dr. Helton Luiz Ap. Defino, chefe departamento Ortopedia e Anestesiologia

Profa. Dra. Fabiana Cardoso Pereira Valera, chefe departamento Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia Cabeça e Pescoço

Prof. Dr. Lourenço Sbragia Neto, chefe departamento Cirurgia e Anatomia

Prof. Dr. Francisco José Cândido dos Reis, chefe departamento Ginecologia e Obstetrícia

Prof. Dr. Sonir Roberto Rauber Antonini, chefe departamento Puericultura e Pediatria

Prof. Dr. Rodrigo Tocantins Calado, chefe departamento Imagens Médicas, Hematologia e Oncologia Clínica

Prof. Dr. Paulo Louzada Júnior, chefe departamento Clínica Médica

Prof. Dr. Wilson Marques Júnior, chefe departamento Neurociências e Ciências do Comportamento

Prof. Dr. João Paulo Dias de Souza, chefe departamento Medicina Social

Prof. Dr. Aguinaldo Luiz Simões, chefe departamento Genética

Prof. Dr. Benedito Antonio Lopes da Fonseca, Divisão de Moléstias Infecciosas

Prof. Dr. Valdes Roberto Bollela, Divisão de Moléstias Infecciosas

Prof. Dr. Rodrigo de Carvalho Santana, Divisão de Moléstias Infecciosas

Prof. Dr. Gilberto Gambero Gaspar, Divisão de Moléstias Infecciosa, presidente da CCIH HCFMRP

Prof. Dr. Afonso Dinis Costa Passos, coordenador do Núcleo de Epidemiologia

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