Manifesto do Pacto pela Vida cobra rapidez na vacinação de crianças

Manifesto assinado por seis entidades condena a campanha de sabotagem da vacinação de crianças.

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Após uma semana do início da vacinação de crianças contra a covid-19, seis organizações lançaram na sexta-feira(21) o Pacto pela Vida das Crianças Brasileiras, uma frente para promover a imunização infantil e combater o negacionismo. “É urgente pensar com lucidez, responsabilidade e profundo sentido ético”, afirmam as instituições em nota.

Mais de 80% dos pais e responsáveis querem vacinar os filhos contra a covid-19, de acordo com estudo VacinaKids, realizado pela Fundação Oswaldo Cruz, em janeiro de 2022. No Brasil, estão autorizados os imunizantes da Pfizer- BioNTech e a CoronaVac para crianças de 5 a 11 anos.

O manifesto de criação da frente é assinado pela Academia Brasileira de Ciências (ABC), pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

As entidades criticam a postura das autoridades brasileiras, que ainda divergem das orientações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e alertam para as campanhas de desinformação em torno do tema. O Ministério da Saúde levou 20 dias para anunciar a aplicação das vacinas nas crianças, mesmo após a Anvisa ter aprovado o uso do imunizante da Pfizer para essa faixa etária.

“Manobras para desacreditar as vacinas, com o bombardeio incessante de declarações infundadas, têm tão somente por finalidade minar a confiança dos pais diante do que é correto e inadiável fazer: vacinar as crianças, garantindo-lhes proteção diante de um agente infeccioso grave”, ressaltam as organizações em nota. 

O Brasil teve 1.544 mortes de crianças por covid-19 de 0 a 11 anos desde o início da pandemia. No entanto, a taxa de letalidade entre as crianças de 0 a 4 anos é quatro vezes maior em comparação com o público mais velho, segundo dados do Ministério da Saúde.

A variante ômicron provocou aumento de 44% nas internações e mortes de crianças por covid-19, como apontou a plataforma SP Covid-19 Info Tracker, criada pela Universidade de São Paulo e pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Essa tendência foi a oposta do público vacinado, tanto de adultos como de adolescentes a partir de 12 anos, que estão recebendo os imunizantes desde setembro de 2021.

O aumento de resultados positivos para covid-19 entre crianças entre 0 a 13 anos saltou de 3,3% para 50,8% entre 27 de dezembro e 18 de janeiro nos testes do Grupo Pardini, rede com laboratórios presente em todas as regiões do Brasil.

Neste domingo (23), a secretaria de saúde de Salvador divulgou que todos os leitos de UTI pediátrica estão lotados com pacientes com covid-19, assim como 70% dos leitos comuns. Em todo o estado da Bahia, a ocupação de UTIs pediátricas já alcança 93%.

Ainda em setembro passado, a diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Carissa Etienne, havia alertado que crianças também desenvolvem quadros graves da doença e criticou o retorno presencial às aulas sem o aumento da imunização infantil.

“Não existe um cenário de risco zero”, destacou a diretora da Opas. “À medida que mais adultos recebem suas vacinas contra a covid-19, as crianças – que ainda não são elegíveis para vacinação na maioria dos países – representam uma porcentagem maior de hospitalizações e até mortes por covid-19”.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de oito milhões de crianças foram vacinadas contra a covid-19 em todo no mundo, com destaque para Cuba – primeiro país a vacinar menores de 11 anos.

Contando crianças, adolescentes e adultos, o Brasil acumula até ontem (22) 23.909.175 de casos confirmados de covid-19 e 622.801 óbitos pela doença, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).

Leia abaixo a íntegra do manifesto

Pacto pela vida das crianças brasileiras

Nós, entidades signatárias do Pacto pela Vida e Pelo Brasil, lançado em 7 de abril de 2020 face ao agravamento da pandemia, voltamos a unir nossas vozes no clamor por aqueles que assistem, silentes e sem poder de ação, a situações que colocam em risco a sua própria vida. Falamos de milhões de crianças e adolescentes brasileiros, sobre os quais é urgente pensar com lucidez, responsabilidade e profundo sentido ético.

O enfrentamento da Covid-19, no curso de uma crise sanitária que abalou o mundo, prenunciou a necessidade de imunização da população infanto-juvenil, como já vem ocorrendo em vários países. Sabia-se que a vacinação teria que chegar às crianças, protegendo-as de um vírus contagioso e mutante, com impactos diversos sobre o organismo. No entanto, chegada a hora, mais uma vez armou-se o circo da insensatez no Brasil, buscando semear o tumulto e afastar o país do seu destino. Manobras para desacreditar as vacinas, com o bombardeio incessante de declarações infundadas, têm tão somente por finalidade minar a confiança dos pais diante do que é correto e inadiável fazer: vacinar as crianças, garantindo-lhes proteção diante de um agente infeccioso grave.

O Brasil, e não é de hoje, conquistou reconhecimento internacional pelo seu programa de imunização. Gerações cresceram atendendo às convocações para vacinações diversas e assim foi possível controlar doenças que assombraram a população infantil e tantas famílias — entre elas, o sarampo e a poliomielite. Imunizou-se muito e bem, num país de dimensão continental e grande desigualdade.

Hoje não se pode aceitar a campanha de sabotagem em torno da vacinação pediátrica, no curso de uma pandemia ainda longe de ser controlada, desprezando o direito à vida e à saúde de uma faixa etária com cerca de 69 milhões de brasileiros — porque é disso que se trata, em flagrante desrespeito à Constituição e ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Estarrece constatar que tal situação esteja acontecendo no país que, tristemente, tornou-se um dos recordistas de mortes por Covid no planeta – cerca de 622 mil óbitos até o momento, boa parte deles evitável.

Declarações enganosas de autoridades do governo, na contramão do que tem sido feito pela autoridade sanitária, a Anvisa, poderiam sugerir que o Brasil pouco ou nada aprendeu nesses mais de dois anos de luta contra o vírus. Que falhamos como Nação. Que abrimos mão de compromissos éticos. Que retrocedemos no tempo. Mas, não nos enganemos: a sociedade brasileira não vive dentro da bolha do negacionismo. Ela conhece muito bem a dura realidade, sente na pele os desafios, escuta o que diz a ciência e assim defenderá o direito à vacina infantil, contra o SARS-CoV-2. Certos disso, conclamamos governadores e prefeitos a não poupar esforços para que a imunização pediátrica avance rapidamente pelo país, em grandes mutirões, alcançando todas as crianças, e sem esquecer jamais das que vivem em condição de vulnerabilidade.

Conclamamos mães, pais, familiares e professores a exigir do Estado brasileiro o que é preciso neste momento, para garantir não só a saúde, mas o futuro dos mais jovens. E, por fim, mas não por último, conclamamos cidadãos e cidadãs a formar conosco um cinturão de lucidez no enfrentamento da pandemia, que esperamos ver superada. Como uma sociedade livre e democrática, construída sobre os pilares da ética, do bom senso e do bem comum, sairemos disso mais fortes.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB
Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB
José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns
Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências – ABC
Paulo Jeronimo de Sousa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa – ABI
Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC

Fonte: Brasil de Fato e OAB