“Ricardo Alarcón em minha memória”

O jornalista Pedro Martinez-Pirez celebra as contribuições internacionalistas do diplomata cubano Ricardo Alárcon, falecido no último sábado (30).

Ricardo Alarcon, presidente da Assembleia Nacional do Poder Popular de Cuba, en conferência especial durante Pedagogia 2013. Foto: Ismael Francisco/Cubadebate

No último sábado (30), às vésperas das tradicionais celebrações do Primeiro de Maio, em Havana, morreu o diplomata e político cubano Ricardo Alarcón de Quesada.

Nasceu em Havana em 21 de maio de 1937 e desde cedo esteve ligado à luta revolucionária. Ingressou na Universidade de Havana em 1954, unindo as atividades revolucionárias com Fructuoso Rodríguez e a candidatura da Federação de Estudantes Universitários (FEU), chefiada por José Antonio Echeverría.

Durante esses anos, participou da maioria dos atos de protesto realizados pela referida organização. Foi colaborador do Diretório Revolucionário e ingressou no M-26-7 em 1955, onde foi organizador do aparato estudantil das brigadas juvenis desse movimento revolucionário.

Entre outras atividades, na esfera estudantil e juvenil, foi eleito vice-presidente da FEU em 1959 e presidente desta organização de 1961 a 1962.

Depois de se formar, em 1962, a pedido do chanceler Raúl Roa, ingressou no Ministério das Relações Exteriores, onde atuou como Diretor da América Latina.

Em 1965, Raúl Roa o nomeou chefe da Missão Cubana junto às Nações Unidas, primeiro como Embaixador Interino e depois como Representante Permanente, cargo que ocupou de 1966 a 1978. Nessa etapa, introduziu formal e conceitualmente o tema da independência de Porto Rico na ONU, presidiu inúmeras reuniões do Movimento dos Não-Alinhados e foi simultaneamente Embaixador em vários países do Caribe.

De 1978 a 1988 foi nomeado Vice-Ministro dos Negócios Estrangeiros. Foi promovido a Primeiro Vice-Ministro em 1989, e nesse cargo voltou a servir, entre 1990 e 1992, como Embaixador junto da ONU, presidindo duas vezes ao Conselho de Segurança (1990 e 1991), nas condições particularmente difíceis criadas pela desaparecimento da União Soviética e do campo socialista. Ele foi o iniciador de muitas das ideias que hoje constituem a base das reivindicações a favor da reforma do Conselho de Segurança da ONU.

Ao longo deste período, integrou a delegação cubana nas negociações de paz na África Austral (1988-1990) e foi o arquiteto da ideia de apresentar um projeto de Resolução sobre o bloqueio na Assembleia Geral da ONU (1991), primeiro texto que escreveu pessoalmente.

De 1992 a 1993 foi Ministro dos Negócios Estrangeiros. Ao longo de sua vida diplomática e também posteriormente, foi chefe das delegações cubanas que participaram de várias negociações com os Estados Unidos, inclusive aquelas que levaram à assinatura dos acordos migratórios de 1984, 1994 e 1995.

Foi membro do Comitê Central do Partido Comunista de Cuba e membro de seu Birô Político. Em 1993 foi eleito Presidente da Assembleia Nacional do Poder Popular, cargo que ocupou durante 20 anos, até 2013.

Ele desempenhou um papel fundamental, sob a orientação pessoal do Comandante em Chefe, nas batalhas pelo retorno do menino Elián González e a libertação dos Cinco Heróis.

Por sua notável carreira revolucionária, recebeu diferentes condecorações. Será lembrado como “um revolucionário completo por seu anti-imperialismo e fidelidade revolucionária”, diz o CubaDebate.

Sobre o Comandante em Chefe escreveu no Granma em 2016: “Fidel é um personagem raríssimo. muito raro Quase irrepetível. Nenhum chefe de Estado na história (talvez Lênin) teve esse ‘defeito’ que é não poder deixar algo pela metade, essa necessidade de chegar ao último detalhe das coisas. Nem a cultura insaciável que a caracteriza. Nem seu apaixonado senso de trabalho.

Leia abaixa a homenagem do jornalista da Rádio Havana, Pedro Martinez-Pirez, ao diplomata e amigo:

A alegria dos cubanos pelos atos massivos e combativos realizados neste primeiro de maio em todo o país foi obscurecida pela triste notícia da morte do camarada Ricardo Alarcón de Quesada.

Ricardo, que conheci no Ministério das Relações Exteriores nos já distantes anos sessenta do século passado, sempre me disse que era mais novo que eu. E era verdade, porque eu completei 85 anos no dia 22 de fevereiro e ele faria 85 no dia 21 de maio de 2022, em apenas vinte dias.

Fomos sócios no MINREX e depois também no Parlamento cubano, já que ambos fomos eleitos deputados nacionais em 1993 no mesmo município de Plaza de la Revolución, já que Ricardo morava então no bairro de El Vedado, muito perto de Capri e Nacional.

 Sempre o vi atuar como um dos sucessores do Ministro das Relações Exteriores da Dignidade Raúl Roa García e do Comandante Fidel Castro, que acompanhou no início do diálogo com a comunidade cubana residente no exterior em 1978.

Coincidimos muitas vezes na vida, uma delas como delegado ao IV Congresso do Partido Comunista de Cuba, realizado em outubro de 1991 na cidade de Santiago de Cuba, e em várias ocasiões na sede da ONU, onde se destacou por sua talento e seu prestígio como grande negociador sempre representando a Revolução Cubana.

Tive também a honra de acompanhá-lo por ocasião da assinatura nas Nações Unidas, em Dezembro de 1988, dos acordos tripartidos que garantiam a independência da Namíbia, a segurança de Angola e a paz entre os países do Sudoeste Africano. Com a assinatura dos chamados Acordos Tripartites, as tropas internacionalistas cubanas também puderam voltar vitoriosas. Este acordo histórico foi assinado por Isidoro Malmierca, que precedeu Ricardo Alarcón como chefe do Ministério das Relações Exteriores de Cuba.

Entrevistei Ricardo Alarcón muitas vezes para a Rádio Habana Cuba e a Televisão Cubana.

Nos arquivos sonoros da Rádio Habana Cuba está a entrevista que fiz anos atrás para o programa ENTRE CUBANOS, na qual Ricardo conta onde estava e o que fazia em 1º de janeiro de 1959, data do triunfo da Revolução Cubana.

Há também a entrevista que fiz com ele quando era Ministro das Relações Exteriores em 1992, um testemunho sobre Direitos Humanos em Cuba que o advogado e jornalista costarriquenho Alvaro Montero Mejía havia solicitado para seu programa de televisão em San José.

Enquanto escrevo estas linhas recebo várias mensagens de Porto Rico e ligações de Havana de duas porto-riquenhas, Rosa Meneses, neta de Dom Pedro Albizu Campos, e o cantor e compositor Pepe Sánchez, que reconhecem em Alarcón o diplomata cubano que sempre se destacou por sua solidariedade com a outra asa do pássaro, segundo a definição da poetisa Lola Rodríguez de Tió.

E isso me lembra outro momento em minhas relações com Ricardo Alarcón, que em 1993, já como Presidente da Assembleia Nacional do Poder Popular, me confiou o prólogo de um livro sobre Porto Rico escrito por Fidel Castro para que eu o entregasse em San Juan Laura, uma das filhas de Don Pedro.

Viajei a Porto Rico naquele ano convidado para os atos que para o Centenário de Don Pedro aconteceram na Universidade de Río Piedras, em San Juan.

Lembro que Alarcón também me deu uma mensagem para seu amigo Juan Mari Bras, fundador com Fidel Castro da Missão de Porto Rico em Havana.

E um momento que não esqueço em minhas relações com Alarcón foi a última vez que o convidei para um evento na Rádio Habana Cuba, sobre a colocação de uma xilogravura do pensador peruano José Carlos Mariátegui, doada à nossa emissora pelo amigo e colaborador Gustavo Spinoza. Os áudios desse ato, realizado e transmitido ao vivo na sexta-feira, 10 de janeiro de 2020, estão preservados nos arquivos sonoros da Rádio Habana Cuba.

E guardo também, como um tesouro, o breve mas muito caloroso artigo de Ricardo Alarcón sobre a morte em Havana, em dezembro passado, do cantor e compositor Vicente Feliú.

E tomo de Ricardo duas linhas de sua mensagem intitulada CHORANDO POR VICENTE FELIU, para encerrar estas linhas dedicadas ao querido e querido amigo que tanto glorificou a diplomacia e a Revolução Cubana.

“Achei que tinha esquecido de chorar, mas me enganei. Com lágrimas vão essas linhas apressadas para quem merece muito mais.

Havana, 1 de maio de 2022

De Cuba Debate com informações de Granma.

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