A luta antirracista frente ao desafio de derrotar Bolsonaro e eleger um governo democrático

O racismo que hoje grassa no Brasil é uma meticulosa construção humana, entranhada estruturalmente em nossa sociedade

A luta contra o racismo tem como finalidade precípua combater o racismo em suas múltiplas manifestações e promover soluções para superação dos agravos e perversões sobre a população e indivíduos alvos. Compreendendo o racismo como um engenhoso instrumento político voltado a justificar a dominação colonial e imperialista; no âmbito interno dos Estados, legitimar a superexploração e divisão do trabalho – legando a marginalização aos grupos racialmente discriminados. Para atingir tal fim transpõe barreiras tangíveis e intangíveis, articulando mecanismos ideológicos, “científicos”, culturais, dispondo da violência, do Direito, das instituições, da religião, ou seja, transversaliza sua incidência em todos espaços de sociabilidades.

Raça é um conceito ideológico herdado do iluminismo, por seu meio se constitui e justifica formas de controle social, no Brasil plasma a fisionomia da desigualdade e das clivagens que nos caracteriza como Nação. Ascendeu sobre as relações social, política, econômica, cultural, formou sujeitos e determinou seus lugares na hierarquia social, naturalizou perversões. Foi fator determinante para garantia do tráfico transatlântico de africanos e transformação do oceano Atlântico em um cemitério aberto, na travessia de 10 milhões de corpos escravizados, aos 388 anos de escravidão, a escravização e genocídio indígena, ao processo de transição do trabalho escravo ao livre, legando ao Brasil uma abolição destituída de qualquer insumo governamental e da sociedade para o gozo de direitos mínimos como trabalho, moradia, alimentação, educação, transformando massas de ex-escravizados em sub-cidadãos, população indesejável, inimigos da Nação.

O conceito de raça balizou as ciências humanas e sociais, penetrou no senso comum, instruiu a elite política e intelectual brasileira – de finais do século XIX até os anos 30 do século posterior – a compreensão que o sangue negro e indígena marca a inferioridade e a vocação do Brasil ao subdesenvolvimento e subalternidade. Dando ensejo à agressiva política de branqueamento com forte aporte do Estado, ao completo abandono da população negra e indígena nas franjas da sociedade, ao entreguismo atávico e antipatriótico da classe dominante.

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O racismo que hoje grassa no Brasil é uma meticulosa construção humana, entranhada estruturalmente em nossa sociedade ao longo da linha histórica contida nos cinco séculos que marcam a chegada dos portugueses e depois a vinda dos africanos por meio de sequestro. Vivemos contemporaneamente com resquícios da escravidão, com a determinação de uma elite econômica em manter seus privilégios. Com o conforto de uma classe média branca, dado pelas vantagens angariadas num país racista, para assegurar essa comodidade está sempre disposta a se aproximar das elites e se posicionar contra o povo.

A população negra e indígena acumula os piores indicadores de renda, desemprego, educação, condições de moradia, dentre outros, a produção dessas clivagens tem como objetivo gerar e manter confusão no seio do povo, além de subtrair mais lucro com a desvalorização do trabalho de negros, índios e brancos promovido pelo racismo, logo, cenários desiguais com gradação de raça e gênero é uma tecnologia que tem se mostrado eficaz ao capital. Os números da desigualdade é caso pensado, não há razoabilidade um país naturalizar que a cada R$ 1.000 recebidos por homens brancos, são pagos R$ 758 para mulheres brancas, R$ 561 para homens pretos ou pardos e R$ 444 para mulheres pretas ou pardas (IBGE – 2019). Por isso, a desconstrução do racismo no Brasil se associa às lutas antissistêmica, transformadora, emancipatória, no entanto, deve compor o repertório cotidiano da luta política voltada a construção da revolução brasileira.

Derrotar o principal inimigo dos nossos dias

Foto: Reprodução

O Presidente Jair Bolsonaro representa a face mais odienta dos fluxos políticos que conduziram o Brasil, suas idéias tem lastro histórico no escravismo, autoritarismo, violência endêmica, nas quebras da ordem democrática, na tortura, perseguições e mortes. Tem apelo político, uma base ativa que margeia 30% dos brasileiros, acolhimento da burguesia nacional (veja que hoje a maioria dos empresários votarão em Bolsonaro, segundo pesquisa da Data Folha). Seu olhar econômico coaduna com a perversidade neoliberal, é defendido em praça pública apesar do fracasso provado em experiências vividas em todo planeta. Por isso foi capaz de produzir em pouco tempo o que denominamos bolsonarismo – um tipo neofascismo popular com potencial de perdurar por anos no tabuleiro político nacional. Derrotar Bolsonaro é um passo fundamental para salvação nacional e recolocar o país ao encontro de seu povo, pois o terreno do desenvolvimento, da democracia, da soberania e unidade nacional é fértil para florescer as mais esperadas iniciativas à equidade.

Bolsonaro faz um governo de múltiplas tragédias ao resiliente povo brasileiro, no campo econômico, social e político. É responsável pelo empobrecimento, desemprego e fome. Pela selvagem reforma previdenciária, que colocou a maioria do povo em condições análoga aos beneficiários da Lei do Sexagenário. Pela entrega do Banco Central a voracidade do mercado. Pela morte de mais 660 mil brasileiras e brasileiros, 113 mil crianças e adolescentes órfãos do COVID e mais de 2,8 milhões de sequelados. Enquanto essa tragédia percorria o país, Bolsonaro armava suas milícias, incitava a violência policial escancarando a face da morte que o caracteriza, para ele a massa pobre e preta não tem serventia, são indesejáveis, deve ser descartada. Bolsonaro sadicamente gera instabilidade, adora o pânico, atenta contra as instituições, faz ameaças, prega o ódio, se incompatibiliza ou coopta Poderes da República, é o germe que mata a democracia por dentro (Steven Levitsky e Daniel Ziblatt).

A parte importante da pauta antirracismo tem base material, logo, um Estado Mínimo mergulhado em divisões e crise econômica não está apto a realizar-la, pois precisamos tirar o povo da pobreza e aprofundar as ações afirmativas, ou seja, primar pelas políticas públicas de caráter universal e ao mesmo tempo garantir iniciativas que superem as clivagens raciais. Outra parte exige mudança que uma mente racista e negacionista no comando da nação se contrapõe, então, não há caminhos ao antirracismo com Bolsonaro no poder. A principal tarefa ao campo antirracista é derrotar Bolsonaro e eleger um governo democrático, antineoliberal, comprometido com o povo e com o Brasil.

São pressupostos desse desafio a denúncia do caráter do Governo Bolsonaro, dos trágicos resultados que colhemos de seu governo, do seu maior legado que consiste na formatação de um exército de fanáticos que insulta a consciência humana e a civilização com mentiras, ferocidade e ódio. Construir o caminho inverso, retomar a autoestima nacional obliterada em sucessivas derrotas, unir o povo, recuperar a economia nacional e cuidar de quem precisa.

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