Exploração de petróleo na margem equatorial do litoral divide opiniões

Trabalhadores temem impacto ambiental; Petrobras destaca papel estratégico da região e rigor na segurança ambiental.

Margem equatorial de exploração de petróleo vai do Amapá ao Rio Grande do Norte

Os presidentes da Petrobras, Jean Paul Prates, e da Shell, Wael Sawan, assinaram na semana passada um memorando de entendimentos, com validade de cinco anos, para estudar futuras parcerias em transição energética e exploração de petróleo e gás natural. Petrobras e Shell são sócias em grandes campos de produção de óleo e gás no pré-sal da Bacia de Santos e também em áreas exploratórias na margem equatorial do litoral brasileiro, que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte.

Em audiência na Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e Amazônia da Câmara dos Deputados, representantes de trabalhadores da indústria petrolífera discutiram, há cinco meses, as preocupações com os impactos ambientais e sobre as populações de estados das regiões Norte e Nordeste no planejamento da exploração de petróleo e gás da margem equatorial, e pode elevar o Brasil do oitavo para o quarto maior produtor de petróleo do mundo.

A Petrobras se movimenta para a exploração na faixa litorânea que inclui o maior sistema de recifes do Brasil e o maior complexo de mangues do mundo. Para a estatal, a área é considerada estratégica ao crescimento da produção brasileira. Somente a ExxonMobil já soma, desde 2015, mais de 25 descobertas de hidrocarbonetos no mar territorial da Guiana, cinco apenas em 2022. Na área offshore do Suriname, a TotalEnergies e a Apache anunciaram a descoberta de seis reservas significativas no chamado bloco 58, desde janeiro de 2020.

80% dos manguezais e o maior sistema de recifes do Brasil ficam na região. Berçário de aves, peixes, moluscos e crustáceos, o mangue é responsável por 95% do alimento que o homem retira do mar. Com até 220 metros de profundidade, os recifes ocupam 56 mil km², área equivalente ao estado da Paraíba. A primeira perfuração prevista será a 160 quilômetros da costa, em águas ultra profundas (2,8 mil metros de profundidade), em região pertencente ao estado do Amapá, na bacia da Foz do Amazonas.

A estatal planeja investir US$ 3 bilhões (R$ 15 bilhões) entre 2023 e 2027 para essa exploração, mas o Plano Estratégico da Petrobras não prevê investimento em energia renovável no mesmo período. O presidente Lula tem assumido compromissos internacionais pela transição energética que vão de encontro com este planejamento.

Maiores produtores mundiais

De acordo com o gerente-geral de Ativos Exploratórios da Petrobras, Rogério da Cunha, o Plano Estratégico 2022-2026 prevê investimentos de US$ 2,1 bilhões na região. A parte da costa brasileira que engloba Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte, segundo ele, ainda é pouco explorada em termos de prospecção em águas profundas.

Diretor do Departamento de Política de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural do Ministério das Minas e Energia, Carlos Agenor Cabral apontou que a margem equatorial é a nova fronteira petrolífera do País, uma vez que as reservas do Sudeste já são conhecidas.

De acordo com Cabral, a expectativa é aumentar em 73% a produção de petróleo entre 2021 e 2031, passando dos atuais 3 milhões para 5,2 milhões de barris por dia. A ideia é que o Brasil passe a ser o quarto maior produtor mundial, atrás apenas de Estados Unidos, Rússia e Arábia Saudita.

“A gente precisa que esses projetos avancem, para que haja a confirmação de que existe ou não existe petróleo e gás natural nessa região. Chamo a atenção para a robustez do nosso processo de licenciamento ambiental e da nossa segurança operacional”, disse. “O Brasil é um dos países com licenciamento ambiental offshore mais rigoroso do mundo. Tem também um arcabouço regulatório de segurança operacional que é exemplo para o mundo.”

Bruno Terribas e Carlos Agenor Cabral (Fotos de Bruno Spada e Billy Boss)

Críticas
Por sua vez, representantes de sindicatos e federações de petroleiros levaram para a audiência pública reivindicações que incluem críticas ao modelo de exploração de commodities, à Política de Paridade de Importação (PPI) para os preços do petróleo e à instalação de poços em áreas ambientalmente mais sensíveis, além de preocupações com a soberania energética e a situação dos povos originários.

Bruno Terribas, do Sindicato dos Petroleiros da Região Amazônica (SindPetro Amazônia), fez coro com outros sindicalistas ao reivindicar que os ganhos obtidos com o petróleo da margem equatorial sejam usados na preservação do meio ambiente.

“Que a renda da exploração e produção de petróleo e gás se transforme em investimento na redução das emissoras de carbono, na segurança operacional, a fim de evitar acidentes terríveis como a gente viu no Golfo do México e o próprio Campo de Frade aqui no Brasil”, declarou. “Que parcela dessa renda petroleira seja investida na transição energética com fontes renováveis, que são parte da nossa defesa da soberania energética nacional.”

O representante da Petrobras, por outros lado, defendeu a viabilidade econômica e sustentável do projeto e disse que vários encontros estão sendo feitos com a população da região onde a prospecção de petróleo e gás vai acontecer.

Segundo a companhia, as atividades de perfuração serão monitoradas e acompanhadas 24 horas por dia por meio de equipamentos e equipes técnicas especializadas. “Como forma de garantir a segurança das atividades, serão realizadas inspeções planejadas de sistemas e equipamentos, programas de manutenção preventiva e corretiva, treinamentos, simulados de emergência, vistorias e auditorias”, afirma.

Participação dos moradores
Para a deputada Vivi Reis (Psol-PA), que propôs a realização da audiência pública, é preciso que as comunidades a serem afetadas possam ter voz ativa e não somente participar de reuniões informativas.

“O nosso objetivo, de forma alguma, é frear o desenvolvimento ou não apostar em alternativas para o desenvolvimento. Para a gente, também é prioridade entender o papel do Brasil nesse contexto de, nos próximos dez anos, poder ser o quarto produtor mundial. Mas é entender também que isso tem de estar conectado com essa escuta à comunidade e com a escuta por parte dos próprios trabalhadores”, comentou a parlamentar.

O coordenador-geral de Licenciamento Ambiental do Ibama, Itagyba Alvarenga Neto, informou que o órgão já concedeu e negou licenças na região, com base em critérios técnicos e legais. Ele acrescentou que a mesma preocupação com o diagnóstico ambiental existe também com a participação dos moradores.

Em 2018, o Ibama negou licença para cinco blocos de exploração. Na época, a petroleira francesa Total não provou que conseguiria impedir que um vazamento de óleo chegasse à costa da Guiana.

“A sensibilidade ambiental da região é extremamente alta, tem características que são específicas. A própria população não está familiarizada, é algo novo para ela essa atividade na região, diferente dos habitantes do Sudeste. Por isso, é fundamental ter todo o cuidado com a participação pública da comunidade”, explicou.

Riscos
Representante da organização ambiental WWF Brasil, Ricardo Fuji sustentou que ainda não há evidências claras de que haja reservas significativas de petróleo e gás na região, mas, em caso positivo, alertou para futuros impactos na atividade pesqueira e no aumento da demanda por serviços, além dos riscos de vazamento.

“Só haverá petróleo a partir de meados de 2035 e, aí, a gente vai estar no contexto de exigências climáticas, de redução de emissões de carbono e transição energética muito mais acelerado que estamos hoje. Isso é um aspecto importante pra gente considerar em uma política energética”, argumentou.

Em 2021, a IEA (Agência Internacional de Energia) divulgou relatório em que pede às empresas do setor de combustíveis que “interrompam novos projetos de petróleo e gás para manter as mudanças climáticas sob controle”. Em 2035, não haverá vendas de carros novos com motor de combustão interna e, em 2040, o setor elétrico global atingirá emissões líquidas zero, diz o relatório. Será um alto investimento em uma fonte de energia que perderá valor nas próximas décadas.

Carlos Agenor Cabral, do Ministério de Minas e Energia, lembrou durante o debate que, em países como Guiana e Suriname, próximos da margem equatorial, houve descobertas expressivas de petróleo e que a perspectiva é de uma produção de 1,8 milhão de barris por dia em 2032.

Com informações da Agência Câmara de Notícias

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