Mais da metade dos lares brasileiros são sustentados por mulheres

Dados mostram que, entre 2012 e 2022, o número de lares com mulheres ocupando da função de protagonistas cresceu 72,9%, passando de 22,2 milhões para 38,3 milhões.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Nos últimos dez anos, o número de domicílios chefiados por mulheres no Brasil, especialmente sem cônjuge, disparou. Segundo levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre) para o jornal Valor, a maior inserção das mulheres no mercado de trabalho e sua autonomia financeira são os principais impulsionadores desse fenômeno.

Dados compilados pela economista Janaína Feijó, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), mostram que, entre 2012 e 2022, o número de lares com mulheres ocupando da função de protagonistas cresceu 72,9%, passando de 22,2 milhões para 38,3 milhões.

A participação das mulheres como responsáveis por seus lares, passou de 35,7% para 50,9%, enquanto a dos homens foi de 64,3% para 49,1%.

Imagem: Valor Econômico

Já os lares chefiados por homens casados ​​com filhos diminuíram, indo de 40,2% para 22,7%, enquanto a participação de lares chefiados por mulheres casadas com filhos aumentou de 8,8% para 17,1%, e mulheres casadas sem filhos de 3 % para 7,2%.

O número de lares em que a pessoa de referência não tem cônjuge, mas sim filhos, cresceu de 10,9 milhões no quarto trimestre de 2012 para 13 milhões no último trimestre de 2022. O aumento de mães solo responsáveis pelos lares, respondem por 82,3% do crescimento.

De acordo com Janaína, esse fenômeno é explicado por mudanças econômicas e sociais. “A maior inserção da mulher no mercado de trabalho possibilitou o aumento da renda domiciliar, trazendo autonomia e independência financeira para muitas mulheres”, afirma. “O aumento de mulheres como pessoa de referência também está associado às mudanças nas normas sociais e combates a estereótipos de gênero.”, complementa.

Fonte: Valor Econômico

A economista argumenta que a postergação da maternidade também contribui para esse cenário, já que muitas mulheres “permanecem no mercado de trabalho, ocupando posições mais estratégicas nas empresas e ganhando mais.”

Segundo Patrícia Costa, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a dinâmica demográfica da sociedade também é um fator importante. Desde os anos 1970 e 1980, a participação das mulheres no mercado de trabalho vem aumentando e isso trouxe configurações diferentes para as famílias. “Há uma redução de famílias nucleares com cônjuge e filhos para aumenta daquelas em que mulheres ou homem moram sozinhos ou com filhos”.

Em partes, isso explica por que o número de lares chefiados por mães solteira mais que quadruplicou em relação ao total de domicílios chefiados por pais solo. Enquanto os chefiados por mães que moram apenas com seus filhos cresceu 1,7 milhão, indo de 9,55 milhões em 2012 para 11,25 milhões em 2022, os de pais solo aumentou em 370 mil, indo de 1,39 milhão em 2012 para 1,76 milhão em 2022, de acordo com o estudo.

O aumento de lares chefiados por mulheres é reflexo dessas mudanças sociais. A tendência é que haja uma maior equidade na proporção de homens e mulheres consideradas chefes de família.

Mães têm mais desemprego e menos renda

Apesar de as mulheres liderarem mais da metade dos lares brasileiros, as mães continuam a ser a maioria dos desempregados e ganham menos do que os homens. Dados da Pnad Contínua mostraram também que em 2022, a taxa de desemprego entre mães solteiras foi de 7,3%, mais alta do que a de mães casadas (4,4%) e mais do que o dobro de pais casados (3,2%) e pais solo (3,4%). A proporção de mães solo fora da força de trabalho foi de 29,4%, quase três vezes mais do que a de pais casados (7,8%) e menor do que a de mães casadas (37,6%).

“A presença de um cônjuge que trabalha permite que algumas mães saiam da força de trabalho para se dedicar à maternidade”, diz Janaína. “Já as mães solo são obrigadas a ir para o mercado para poder ter renda familiar.”

Já em relação aos rendimentos do trabalho, as mães solo ganham em média R$ 2.105 por mês, 38,8% a menos do que os pais casados ou solo (R$ 3.440) e 19,8% a menos do que as mães casadas (R$ 2.626). A renda familiar proveniente do trabalho nos lares de mães solo foi de R$ 2.199 em 2022, enquanto nos de mães e pais casados ficou em R$ 5.040. Em termos de renda per capita, a das mães solo foi a mais baixa (R$ 797 por pessoa do domicílio), quando descoberto à de pais solo (R$ 1.485), mães casadas (R$ 1.385) ou pais casados (R$ 1.384).

O levantamento mostra ainda que o salário-hora das mães solo foi de R$ 14,6, enquanto o dos pais (casados ​​ou solteiros) foi de R$ 20,3 e das mães casadas chegou a R$ 18. Janaína destaca que as mães solo tendem a buscar jornadas flexíveis ou a aceitar bicos e trabalhos informais que satisfizeram maior equilíbrio entre responsabilidades familiares e trabalho, mesmo que sejam menores de idade e não compatíveis com o nível educacional. Elas trabalham, em média, 155,5 horas por mês, 24,5 horas a menos que pais casados.

Patrícia Costa alerta para a reprodução das desigualdades em lares chefiados por mães solo. Segundo ela, “as dificuldades no mercado de trabalho para essas mães acabam se refletindo em seu domicílio. Há uma parcela expressiva dessas mulheres no emprego doméstico. O rendimento per capita desses lares equivale ao valor da cesta básica individual em São Paulo. Se o filho precisar trabalhar antes para compor a renda, há risco de a condição de pobreza se perpetuar.”

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com informações de agências

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