Vereador de SP propõe CPI das ONGs e mira em Padre Júlio Lancellotti

Iniciativa de Rubinho Nunes (União Brasil), ex-MBL, tem como alvo o trabalho filantrópico do Padre na Cracolândia; parlamentares e lideranças criam movimento “Protejam o padre Júlio Lancellotti”

Foto: Adriana Spaca/ AE

O vereador Rubinho Nunes (União Brasil), ex-membro do Movimento Brasil Livre (MBL), obteve o aval de seus colegas na Câmara Municipal de São Paulo para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que visa investigar Organizações Não Governamentais (ONGs) que atuam no centro da cidade. A principal mira da CPI é o trabalho filantrópico do padre Júlio Lancellotti, da Paróquia de São Miguel Arcanjo, conhecido por sua atuação na região da Cracolândia.

A iniciativa, que recebeu 25 assinaturas, tem como alvo principal duas entidades que realizam trabalho comunitário destinado à população de rua e aos dependentes químicos da região: o Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto (Bompar) e o coletivo Craco Resiste. O vereador acusa o religioso de fazer parcerias com essas organizações, alegando receber “inúmeras denúncias” sobre a atuação de diversas ONGs que, segundo ele, fornecem alimentos, mas não realizam o devido acolhimento dos vulneráveis.

Nunes vai além, denominando essa situação como a “máfia da miséria”, alegando que há uma rede de organizações que receberiam recursos públicos e privados para auxiliar dependentes químicos, mas estariam, segundo ele, agravando a situação dos afetados. Em suas palavras, o padre Júlio seria o “verdadeiro cafetão de miséria em São Paulo”, enfatizando que a distribuição de comida e itens básicos não resolve efetivamente a problemática. A expectativa é de que a comissão seja instalada no retorno do recesso parlamentar, em fevereiro.

Em resposta às acusações, o padre Júlio Lancellotti afirma que a instalação da CPI “é um direito” dos vereadores, mas ressalta que o trabalho da Pastoral é independente e não recebe apoio do governo municipal. Em nota pública, Lancellotti esclareceu que a atividade da Pastoral da Rua é uma ação pastoral da Arquidiocese de São Paulo e não está vinculada às atividades que motivaram a criação da CPI.

Repercussão

O tema ganhou destaque nas redes sociais, com o nome do padre Júlio Lancellotti figurando entre os assuntos mais comentados do X (antigo Twitter). Parlamentares, lideranças de movimentos sociais, membros da sociedade civil e entidades como a UNE (União Nacional dos Estudantes), criticaram a iniciativa da Câmara paulistana e convocaram seus correligionários a defender as ações do Padre.

A UNE, por exemplo, expressou “todo o apoio ao Padre Júlio Lancellotti, que sempre atuou em defesa da população em situação de rua, combatendo a aporofobia (aversão aos pobres) no Brasil.”

Segundo as publicações, a perseguição a quem trabalha para o acolhimento e garantia dos direitos básicos das pessoas em situação de rua é inaceitável. Nas redes sociais, a hashtag “protejam o padre Julio Lancelotti” circula, evidenciando o apoio popular ao religioso.

Para a deputada federal Daiana Santos (PCdoB-RS), “a aprovação pela Câmara de São Paulo de uma CPI para investigar Padre Júlio Lancellotti é de um tamanho absurdo e vergonha“.

João Pedro Stedile, líder do MST, classificou como “absurdo” a instalação de uma CPI que é “nitidamente uma tentativa de perseguição política ao Padre Júlio Lancellotti e todos aqueles que lutam pela justiça social”.

A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) também disse ser um absurdo uma CPI para investigar ONGs que acolhem pessoas em situação vulnerável. “Tinha que ser obra dos mimados e criados a danoninho do MBL”, afirmou.

Para Marcelo Freixo, presidente da Embratur, essa é uma “página triste da história da Câmara Municipal de São Paulo: perseguir, com uma CPI, quem dedica sua vida a fazer o bem. Sorte tem a cidade de contar com a humanidade de Padre Júlio Lancellotti, que segue o exemplo de Cristo e se dedica tanto a acolher famílias que deveriam, por direito, ser amparadas pelo estado.”

A situação também se tornou uma “pedra no sapato” da gestão de Ricardo Nunes (MDB) e promete ser um dos temas da disputa eleitoral deste ano em São Paulo – que disputa o primeiro lugar com o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL).

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com agências

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