Movimento sindical convoca ato em defesa da indústria naval

Destruição da indústria naval brasileira resultou em demissões em massa. De 80 mil empregos até 2015, a categoria foi reduzida aos 15 mil atuais.

O Fórum pela Retomada da Construção Naval, formado por entidades do movimento sindical, convocou para 15 de março o Ato em Defesa da Indústria Naval e Offshore – Contra o Fretamento sem Limites de Navios. A atividade está marcada para as 10 horas, em frente ao Edifício Senado (Edisen), da Petrobrás, no Rio de Janeiro.

Entre as entidades que compõem o Fórum estão a CTB, a CUT, a Conttmaf (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos), a FUP (Federação Única dos Petroleiros) e a Fitmetal (Federação Interestadual de Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil).

“O Brasil não pode abrir mão de sua indústria naval e offshore”, afirmam as entidades, no manifesto do Fórum. “O discurso falacioso da competitividade internacional omite propositalmente os vultosos subsídios e proteções com que os países asiáticos, europeus e mesmo os EUA brindam suas indústrias. Aqui, temos sido tratados pior do que os estrangeiros.”

Segundo o texto, a destruição da indústria naval brasileira resultou em demissões em massa. De 80 mil empregos até 2015, a categoria foi reduzida aos 15 mil atuais. “Grande parte dos estaleiros se encontra em recuperação judicial. Os que se mantêm funcionando e não foram convertidos em terminais portuários registram imensa capacidade ociosa.”

A principal reivindicação do Fórum é a revogação da Lei 14.301/2022, a “BR do Mar”, que permitiu a abertura do setor e prejudicou a indústria nacional. As entidades defendem a volta da política de conteúdo local. Além disso, o movimento propõe 16 “medidas de curto prazo” para recuperar a Indústria Naval e Offshore.

Para Carlos Müller, presidente da Conttmaf, “não é possível que o Brasil continue à mercê de gerentes de escalão inferior com motivações equivocadas, que não seguem a legislação e se mostram incapazes de perceber os danos que estão causando ao País”.

O sindicalista dá números que revelam a perda da soberania nacional no setor: A maior empresa do Brasil, que responde por 70% de todas as cargas movimentadas na costa do País, não está alinhada com o crescimento da frota em bandeira brasileira. Hoje, em nossa cabotagem, na área de petróleo e gás, são apenas 11 navios brasileiros operados pela Transpetro e mais de 100 estrangeiros afretados pela Logística da Petrobras”.

Leia abaixo o manifesto do Fórum pela Retomada da Construção Naval

Fórum pela Retomada da Indústria Naval e Offshore

Em todo o mundo, a Indústria Naval tem papel estratégico. Envolve Defesa Nacional, Marinha Mercante, construção naval, navegações de longo curso, cabotagem, apoio marítimo, interior e atividade portuária, bem como extrativismo mineral, pesca industrial e geração de energia offshore. É responsável pela ocupação da Zona Exclusiva Econômica (ZEE) marítima, conhecida no Brasil como Amazônia Azul, por grande parte da integração e da eficiência econômica do país, ao incluir o transporte fluvial, além da produção de petróleo e gás.

O domínio da tecnologia e da produção nacional minimamente suficiente dos insumos da longa e complexa cadeia produtiva é parte da nossa soberania. O Brasil não pode abrir mão de sua indústria naval e offshore. O discurso falacioso da competitividade internacional omite propositalmente os vultosos subsídios e proteções com que os países asiáticos, europeus e mesmo os EUA brindam suas indústrias. Aqui, temos sido tratados pior do que os estrangeiros.

A indução de demanda é fundamental, assim como a manutenção da bandeira brasileira na cabotagem e no apoio marítimo. Os EUA, nação mais liberal do mundo, exigem que todas as embarcações sejam construídas no próprio país, e os tripulantes envolvidos nessas atividades, estadunidenses. No Brasil, a Lei 14.301/22 (“BR do Mar”) abriu esse mercado, num enorme retrocesso, razão por que defendemos sua revogação e/ou revisão, garantindo a soberania e a indústria naval nacional, a navegação de bandeira nacional e a empregabilidade dos brasileiros.

Precisamos de demanda imediata. Maior contratante do setor, o sistema PETROBRAS precisa abandonar os erros da ideologia lava-jatista em que a aversão às empresas brasileiras virou filosofia empresarial. A PETROBRAS decidiu excluir financeiramente as empresas nacionais, ao impor fluxo de caixa negativo em seus contratos. Uma política preconceituosa, erguida sob um pretenso programa de risco de integridade, só atingiu fornecedores brasileiros. Seu sistema de cadastro foi calibrado para que o tamanho dos contratos ou supostos requisitos técnicos jamais pudessem caber no mercado nacional. São barreiras de acesso construídas propositalmente para favorecer o estrangeiro.

A construção naval e offshore é composta de grandes contratos e longo processo de contratação. Após essa etapa, são necessários mais de oito meses de revisão de projetos e contratação de equipamentos, antes do início do trabalho nos estaleiros. Da mesma forma, no transporte marítimo, projetos de curto prazo costumam ter entre dois e cinco anos de duração, e os contratos de longo prazo, não raro, alcançam 15 a 20 anos.

Precisamos que as medidas concretas para a recuperação do setor sejam tomadas neste primeiro semestre de 2023. Caso se opte pelo adiamento, travestido em tempo desistir da retomada da indústria naval nesse ciclo de quatro anos, e empurrando a possibilidade de resgate desse mercado para 2026.

Não existe caminho sem a alteração imediata do rumo das licitações em curso para contratação das plataformas FPSOs (sigla em inglês para Unidades Flutuantes de Produção, Armazenamento e Transferência). A TRANSPETRO tem o seu papel, mas representa apenas 10% da demanda normal do segmento. É preciso que a PETROBRAS mude a forma como vem atuando.

A construção naval, desde 2002, espalhou-se por diversos estados. Sua destruição, a partir de 2015, levou a retrocessos significativos, com impactos graves. O setor chegou a contar com 80 mil empregos, hoje reduzidos a cerca de 15 mil. Grande parte dos estaleiros se encontra em recuperação judicial. Os que se mantêm funcionando e não foram convertidos em terminais portuários registram imensa capacidade ociosa.

Os estaleiros dedicados à navegação fluvial continuam com encomendas. Na construção offshore, além da Estaleiros do Brasil (EBR), apenas BRASFELS e o Estaleiro Jurong Aracruz (EJA), integrantes do gigantesco grupo econômico Keppel, que monopolizou as licitações de plataformas por escolha da PETROBRAS, recebem demanda marginal das gigantescas obras exportadas para Singapura e China. Ou seja, menos de 20% dos contratos que as matrizes conquistaram com a complacência da nossa estatal de petróleo.

Diante desse quadro, retomamos o fórum, com o objetivo de ser um espaço de debate para o desenvolvimento sustentável das atividades do setor. Neste documento, apresentamos nossas demandas para implementação em 2023, capazes de promover o rápido resgate da indústria de construção naval e offshore.

Medidas de curto prazo propostas para recuperação da Indústria Naval e Offshore

1. Revisão imediata dos critérios de avaliação de Risco de Integridade do sistema Petrobras para as empresas de Construção Offshore e Estaleiros, considerando que é necessário incluir as empresas nacionais do mercado de construção naval, e não interferir indevidamente na composição de conselhos de administração e diretoria, com exigências direcionadas exclusivamente a empresas brasileiras.

2. Execução dos reparos programados da frota da Transpetro no Brasil. Avaliar a possibilidade de realização de parte dos serviços nas instalações do Estaleiro Inhaúma.

3. Revisão imediata das condições da licitação da construção das unidades P-84 e P85. Contratação direta por parte da Petrobras do Topside, em modelagem similar à que foi adotada no projeto dos replicantes, em múltiplos contratos.

4. Revisão do modelo de contratação das FPSO de Revitalização, especialmente a de Albacora e as que serão lançadas – Barracuda e Caratinga. Na contratação de plataformas e FPSO, recomendamos abandonar a modalidade de afretamento da unidade, adotando a modalidade EPC (sigla em inglês para Engenharia, Suprimentos e Construção) em múltiplos contratos, com definição de conteúdo local mínimo entre 30% e 60%, por tipo de unidade, buscando potencializar as possibilidades de aproveitamento da indústria local.

5. Criação de um grupo de trabalho integrado por representantes do Fórum e da Petrobras para discutir as bases para lançamento de uma nova fase do PROREFAM – Programa de Renovação da Frota de Apoio Marítimo à Exploração e Produção, recuperando a experiência proveitosa baseada em construção no Brasil, conteúdo local obrigatório e garantia de contratos com duração compatível com o prazo de amortização dos financiamentos.

6. Criação de um grupo de trabalho integrado por representantes do Fórum, da Petrobras e da Transpetro para discutir as bases para o lançamento de uma nova fase do PROMEF – Programa de Modernização e Expansão da Frota da TRANSPETRO.

7. Implementar mecanismo para que navios petroleiros, gaseiros, aliviadores e outros, de outras bandeiras, afretados por mais de 3 anos pela Petrobras, tenham cláusula obrigando o fretador/armador a docar a referida embarcação no Brasil.

8. Retomada pela PETROBRAS da prática de pagamento dos seus contratos de serviço, manutenção e EPC (Engenharia, Suprimento e Construção) em 30 dias após a medição. Suspensão da prática de alongar esses pagamentos em até 120 dias, para obrigar as empresas prestadoras a aderirem ao nocivo programa “PROGREDIR”, da PETROBRAS.

9. Adoção pela PETROBRAS da política gerencial de fluxo de caixa neutro em suas contratações, e suspensão do nocivo conceito de fluxo de caixa negativo.

10. Revisão e ajustes, no curto prazo, da Lei nº 14.301/2022, que instituiu o “Programa “BR do MAR”. Criação de um marco legal efetivo para a cabotagem, assegurando que a navegação seja feita com embarcações construídas no Brasil, com empresas brasileiras de navegação na armação, de navios de bandeira nacional e com tripulação brasileira.

11. Continuidade e fortalecimento do marco legal definido na Lei 9.432/1997, que estabelece preferência na contratação para os navios de bandeira brasileira. Combater iniciativas de empresas estrangeiras que buscam dominar nichos específicos mediante desenquadramento, na legislação, de embarcações que realizam operações especiais.

12. Estimular a atuação de empresas brasileiras na navegação de longo curso, com legislação própria que permita operação de navios nessa modalidade de navegação em condições competitivas no cenário internacional,com garantia de emprego de comandante, chefe de máquinas e 2/3 de marítimos brasileiros, proporcionando substituição tributária nos itens que são desonerados em outras bandeiras.

13. Valorização do sistema educacional público, abrangendo a rede federal de ensino técnico e tecnológico, as universidades federais e a rede de Ensino Profissional Marítimo administrado pela Autoridade Marítima Brasileira. Estímulo aos investimentos nas áreas de pesquisa e extensão de modo a garantir oferta de mão de obra especializada nacional para toda a cadeia de valor do setor naval, seja com recursos diretos de educação, ciência e tecnologia, ou com aportes do próprio setor demandante.

14. Instituir tratamento excepcional para o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Profissional Marítimo (FDEPM) no orçamento da Marinha do Brasil, estabelecendo sua vinculação direta com a Autoridade Marítima Brasileira. Assegurar a aplicação dos recursos do FDEPM no Ensino Profissional Marítimo Público administrado pela Autoridade Marítima Brasileira, impedindo o contingenciamento, para pagamento de dívida, de seus recursos.

15. Recriação da Secretaria de Fomento no Ministério de Portos e Aeroportos (Mpor), para cuidar do Fundo de Marinha Mercante (FMM) e do acompanhamento e desdobramentos dos programas de estímulo à construção naval.

16. Na condição de gestor dos recursos do Fundo de Marinha Mercante, garantir a atuação do BNDES como banco estatal de fomento, focado no desenvolvimento econômico e social, proporcionando um ambiente de negócios favorável à expansão da frota de bandeira brasileira e construída no Brasil. Ajustar as regras para financiamento e refinanciamento dos estaleiros e das embarcações, construídas em condições compatíveis com a finalidade do banco e que permitam a competitividade das empresas brasileiras no setor.

Rio de Janeiro, 23 de Fevereiro de 2024.

ASSINAM:

Entidades laborais:

● Associação de Empregados da Nuclep (AEP)

● Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB)

● Central Única dos Trabalhadores (CUT)

● Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM/CUT)

● Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Aquaviários e Aéreos na Pesca e nos Portos (CONTTMAF)

● Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro (Corecon-RJ)

● Conselho Regional dos Técnicos Industriais (CRT-RJ)

● Federação Interestadual dos Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil (FITMETAL)

● Federação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Aquaviários e Afins (FNTTAA)

● Federação Única dos Petroleiros (FUP)

● Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ)

● Sindicato dos Metalúrgicos de Angra dos Reis

● Sindicato dos Metalúrgicos de Niterói

● Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro

● Sindicato dos Petroleiros do Rio Grande do Sul (Sindipetro-RS)

● Sindicato Nacional dos Oficiais da Marinha Mercante (Sindmar)

● Sindicato Nacional dos Aposentados, pensionistas e idosos (SINTAPI)

● Sindicato Nacional dos Enfermeiros da Marinha Mercante (Sindenfmar)

● Sindicato Nacional dos Taifeiros, Culinários e Panificadores Marítimos (Taicupam)

● Sindicato Nacional dos Marinheiros e Moços em Transportes Marítimos (Sindmarconvés)

● Sindicato Nacional dos Marinheiros e Moços de Máquinas em Transportes Marítimos e Fluviais (Sindfogo)

● Sindicato Nacional dos Tripulantes Não Aquaviários em Embarcações Marítimas (Sindextrarol)

Entidade patronal:

● Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval)

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