EUA barram resolução da ONU por cessar-fogo imediato em Gaza
Proposta por cessar-fogo e ajuda humanitária foi vetada apenas pelos Estados Unidos, aprofundando isolamento diplomático de Washington e agravando crise humanitária no enclave palestino.
Publicado 05/06/2025 14:51 | Editado 05/06/2025 15:03

Os Estados Unidos foram o único país a vetar, nesta quarta-feira (4), um projeto de resolução do Conselho de Segurança da ONU que exigia “cessar-fogo imediato, incondicional e permanente” na Faixa de Gaza. A proposta teve apoio dos outros 14 países-membros do conselho e previa ainda a liberação total da ajuda humanitária e a libertação imediata de reféns.
A embaixadora interina dos EUA na ONU, Dorothy Shea, justificou o veto afirmando que a proposta não condenava explicitamente o Hamas nem exigia seu desarmamento e retirada de Gaza. “Qualquer produto que comprometa a segurança de nosso aliado Israel é inaceitável”, declarou. “A guerra terminará quando o Hamas for derrotado”, disse ela, reafirmando a posição contínua do governo norte-americano desde o início do conflito.
Desde o início da guerra em outubro de 2023, os EUA já vetaram quatro resoluções semelhantes e permitiram apenas uma abstenção que viabilizou aprovação em junho passado. A posição norte-americana tem sido cada vez mais criticada internacionalmente, inclusive por aliados tradicionais.
Essa foi a quinta vez que os Estados Unidos usaram seu poder de veto para bloquear uma resolução semelhante desde outubro de 2023, quando o ataque surpresa do Hamas resultou na morte de centenas de israelenses e desencadeou o atual genocídio de palestinos em Gaza.
Genocídio entra em nova escalada e agrava tragédia humanitária
A votação no Conselho de Segurança ocorreu em meio à retomada da ofensiva israelense, após o fim de uma trégua de dois meses em março. Autoridades de saúde em Gaza relataram a morte de 45 pessoas em ataques israelenses na quarta-feira. Israel, por sua vez, informou a morte de um soldado em combates.
Com mais de 54 mil mortos em Gaza, segundo números das autoridades locais controladas pelo Hamas, e cerca de 50 mil crianças mortas ou feridas, de acordo com a Unicef, a situação humanitária atinge níveis catastróficos. Mais de 2 milhões de pessoas enfrentam risco de fome, escassez de água e colapso hospitalar.
Desde março, Israel impede a entrada de ajuda humanitária, sob alegações de que o Hamas a desviaria. No entanto, organizações internacionais, como a UNICEF, alertam que crianças estão morrendo de fome e que cerca de 50 mil menores foram feridos ou mortos desde o início da guerra.
A entrada de ajuda humanitária tem sido limitada e intermitente, dependendo da autorização israelense. A distribuição atual — coordenada por empresas privadas com apoio de EUA e Israel — foi suspensa após incidentes letais nos pontos de entrega de alimentos. Em três dias, mais de 80 pessoas morreram em áreas de distribuição.
Israel é acusado de atrair essas pessoas para estes locais, como uma armadilha mortal para metralhá-las sob a alegação de “advertência após civis saírem da rota estabelecida”. Na terça-feira, ao menos 27 pessoas foram mortas enquanto se dirigiam a um ponto de distribuição no sul de Gaza.
Alerta internacional e críticas à postura dos EUA
Antes da votação, o chefe humanitário da ONU, Tom Fletcher, fez um apelo direto por acesso pleno e imediato para as agências humanitárias. “Temos as equipes, os suprimentos e o plano. Só precisamos que nos deixem trabalhar”, disse. Ele também exigiu o fim das restrições impostas por Israel.
A embaixadora do Reino Unido, Barbara Woodward, criticou a expansão das operações israelenses e as barreiras à ajuda como “injustificáveis, desproporcionais e contraproducentes”. Já o embaixador da Argélia, Amar Bendjama, afirmou que a resolução vetada representava “a vontade coletiva do mundo, não a voz de uma minoria”.
Diplomatas de diversos países apontaram o veto dos EUA como um sinal de isolamento crescente de Washington e de descompasso com a opinião pública internacional. Segundo o embaixador da Eslovênia, Samuel Žbogar, “o texto vetado expressava o consenso de que a guerra precisa parar imediatamente, os reféns precisam ser libertados e os civis não podem morrer de fome”.
Veto como obstáculo à paz
Apesar de Washington afirmar que trabalha por um cessar-fogo “duradouro e realista”, o veto foi amplamente interpretado como um impedimento às negociações multilaterais em curso. O Hamas rejeitou o plano de trégua mediado pelos EUA, por não prever o fim definitivo da guerra nem garantias de retirada israelense.
Israel, por sua vez, tem reafirmado que não aceitará cessar-fogo antes da eliminação total do Hamas e rejeita qualquer proposta que permita a permanência do grupo no território. “Vocês escolheram a submissão e não a paz”, declarou o embaixador israelense Danny Danon aos membros que apoiaram a resolução.
Enquanto a diplomacia se trava no Conselho de Segurança, a população civil de Gaza continua a pagar o preço mais alto da guerra. Em meio aos escombros, à fome e à violência, cresce a pressão internacional para que cesse o fogo e se restabeleça o mínimo de dignidade humana para os palestinos.