Chuvas extremas avançam e multiplicam tragédias no Brasil

Relatório mostra que eventos climáticos extremos aumentaram 730% em três décadas, deixando rastro de mortes, cidades destruídas e prejuízos que já superam R$ 230 bilhões

Equipes trabalham no resgate dos desaparecidos em Petrópolis (2022) | Foto: Equipe APA Petrópolis/NGI Teresópolis

As chuvas extremas se tornaram o novo normal no Brasil — e os dados confirmam o avanço implacável da crise climática. Entre 1991 e 2023, foram registrados mais de 26 mil desastres relacionados a chuvas, número que saltou 730% desde os anos 1990. Só entre 2020 e 2023, houve 7.539 registros — o triplo da década anterior.

A crise se intensificou em 2024 com a tragédia no Rio Grande do Sul. Um volume recorde de chuvas desencadeou inundações devastadoras, afetando 2,3 milhões de pessoas, matando 183 e deixando prejuízos estimados em R$ 88,9 bilhões. Além disso, 800 pessoas ficaram feridas e 580 mil desalojadas no que é considerado hoje um dos maiores desastres climáticos da história do país.

Desastres cada vez mais frequentes e destrutivos

A série Brasil em Transformação: Temporadas das Águas, coordenada pelo Programa Maré de Ciência da Unifesp e parceiros como a Fundação Grupo Boticário e Unesco, revela que os danos causados por chuvas já somam 34,6 milhões de bens e infraestruturas destruídas ou danificadas — sendo 90% referentes a obras públicas.

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No setor privado, os principais afetados são agricultura (47%) e comércio (30%). No setor público, transporte (52%) e saneamento básico (28%) lideram os prejuízos. No total, as perdas econômicas no país somam R$ 146,7 bilhões até 2023. Com os desastres de 2024, esse valor já ultrapassa os R$ 230 bilhões nesta década.

“Esses eventos são, atualmente, os principais responsáveis por mortes e pelo número de pessoas desalojadas e desabrigadas no Brasil”, alerta o relatório técnico.

Regiões vulneráveis, população em risco

Ao longo das últimas três décadas, 91,7 milhões de pessoas foram afetadas por desastres de chuvas com 4.247 mortes — 86% de todas as mortes por desastres climáticos no Brasil. O número de desabrigados e desalojados ultrapassa 8,7 milhões — 94% de todos os casos de desastres climáticos registrados no país. E só entre 2020 e 2023, 31,8 milhões de pessoas foram atingidas, valor 82 vezes maior que o da década de 1990.

As regiões Sul e Sudeste concentram a maioria dos eventos, mas o Nordeste é o que tem mais municípios atingidos. O verão é a estação mais crítica, respondendo por 44% dos desastres registrados. Destaques recentes incluem:

  • Petrópolis (RJ), 2022: chuvas de 530 mm em um dia deixaram 240 mortos e milhares de desabrigados.
  • São Sebastião (SP), 2023: 65 mortos e mais de 600 mm de chuva em menos de 24 horas.
  • Bahia, 2021: 160 municípios em emergência, 26 mortes e 100 mil afetados.
  • Baixada Santista (SP), 2020: 33 mortes e R$ 215 milhões em prejuízos.

O desafio da adaptação e das soluções baseadas na natureza

As mudanças no regime de chuvas são comprovadas por décadas de dados. Estudos da ANA e do PBMC apontam que, até 2100, o Sul e o Sudeste terão até 30% mais chuvas, enquanto Norte e Nordeste podem enfrentar reduções de até 40%. Isso significa mais risco de inundações ao sul e secas severas ao norte.

A saída passa por investir em “Soluções baseadas na Natureza” (SbN), como a restauração de manguezais e florestas para conter erosões e alagamentos; a adoção de infraestrutura verde (como jardins de chuva e parques alagáveis); o planejamento urbano que evite ocupações em áreas de risco e a ampliação dos sistemas de drenagem e alerta precoce. “Nosso principal objetivo é comunicar, de forma clara e acessível, informações fundamentadas em dados concretos para apoiar a tomada de decisão e impulsionar mudanças de comportamento”, diz trecho do documento.

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Além disso, o relatório enfatiza que “em um mundo onde as mudanças climáticas já não são mais uma ameaça distante, mas uma realidade presente, é imperativo que cada cidadão, gestor público, tomador de decisão, e líder comunitário se envolvam ativamente na construção de cidades mais resilientes e sustentáveis.” E conclui: “Juntos, podemos transformar nossas cidades em exemplos de inovação e resistência, garantindo um futuro mais seguro e próspero para as próximas gerações.”

A publicação “Temporadas das Águas: O Desafio Crescente das Chuvas Extremas” compõe o segundo volume da série Brasil em Transformação e busca alertar a sociedade sobre os impactos e consequências das mudanças climáticas no Brasil.

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