Em Washington, Netanyahu defende plano de expulsão dos palestinos de Gaza
Premiê israelense chama limpeza étnica de “livre escolha” em plano para transferir população de Gaza a outros países; proposta é rechaçada por países da região
Publicado 08/07/2025 11:23 | Editado 08/07/2025 11:31

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, defendeu nesta segunda-feira (7) o plano de realocação em massa dos palestinos que vivem na Faixa de Gaza, durante uma reunião com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na Casa Branca.
“Se as pessoas quiserem ficar, podem ficar, mas se quiserem sair, devem poder sair”, declarou Netanyahu ao ser questionado por jornalistas sobre os relatos de que Israel pretende transferir forçadamente a população palestina para fora do enclave.
“Não deveria ser uma prisão. Deveria ser um lugar aberto e dar às pessoas uma escolha livre”, afirmou.
O premiê israelense chamou de “brilhante” a visão de Trump sobre o futuro de Gaza e confirmou que seu governo está trabalhando “muito de perto com os Estados Unidos” para encontrar países dispostos a acolher a população expulsa do território palestino.
Segundo ele, “estamos chegando perto de encontrar vários países”. A proposta é condenada por organizações de direitos humanos, por países árabes e por setores da diplomacia internacional como um plano de limpeza étnica.
A visita de Netanyahu a Washington ocorre em meio a negociações indiretas com o Hamas para um cessar-fogo de 60 dias, mediadas pelo Qatar e com supervisão norte-americana.
Embora as conversas avancem, as principais divergências continuam sendo a exigência de Israel de manter o controle sobre a entrada de ajuda humanitária e a recusa em encerrar a guerra antes da libertação dos reféns.
Os Estados Unidos têm pressionado Netanyahu a aceitar os termos do acordo, mas o premiê evita se comprometer publicamente.
Do lado de fora da Casa Branca, centenas de manifestantes se reuniram com bandeiras da Palestina, retratos de vítimas da guerra e cartazes pedindo a prisão de Netanyahu.
Foi a terceira visita de Netanyahu à Casa Branca desde o retorno do republicano à presidência norte-americana. Trump e seus assessores pareceram tentar capitalizar qualquer impulso criado pelo virtual enfraquecimento do Irã — que apoia o Hamas — para pressionar ambos os lados por um avanço na guerra de 21 meses em Gaza.
Trump e Netanyahu celebram bombardeio ao Irã e evitam compromisso com solução de dois Estados
Durante o encontro, Trump e Netanyahu também celebraram os ataques recentes às instalações nucleares do Irã, comparando a ofensiva à decisão de Harry Truman de lançar bombas atômicas sobre o Japão.
“Isso impediu muitas lutas, e isso aqui impediu muitas lutas também”, declarou Trump. Ele afirmou que as forças norte-americanas atingiram “não apenas o grande [alvo], mas três locais, um deles profundo e granítico, que foi obliterado”.
Trump disse que o Irã “levou uma surra” e que agora “quer conversar”. Embora tenha dito que gostaria de suspender as sanções contra o país, o presidente afirmou que pretende “colocar algo no papel” e que um encontro com os iranianos deverá ocorrer nos próximos dias. “Eles ganharam muito respeito por nós e por Israel”, declarou.
Netanyahu evitou comentar diretamente sobre a retomada de negociações com o Irã, mas afirmou que o fim da influência iraniana na Síria representa uma oportunidade para ampliar a estabilidade regional.
“O Hezbollah foi levado de joelhos. O Irã está fora do jogo. Isso apresenta oportunidades para estabilidade, segurança e, eventualmente, paz”, disse ele, embora não tenha confirmado se Israel está dialogando com o atual governo sírio.
A possível reaproximação com países árabes, incluindo Arábia Saudita, Líbano e Síria, foi tratada com entusiasmo cauteloso por aliados de Trump.
Segundo o New York Times, o presidente norte-americano aposta na expansão dos Acordos de Abraão — pactos firmados durante seu primeiro mandato que normalizaram as relações entre Israel e países do Golfo — como legado diplomático de seu segundo mandato.
Netanyahu rejeita soberania palestina
Netanyahu usou a reunião para reiterar sua oposição a um Estado palestino soberano.
“Acho que os palestinos devem ter todos os poderes para se autogovernar, mas nenhum dos poderes para nos ameaçar. Isso significa que poderes soberanos, como a segurança geral, permanecerão sempre em nossas mãos”, declarou.
Ele acrescentou que a experiência com Gaza mostra que a concessão de soberania resultaria em ataques.
“Depois de 7 de outubro, as pessoas disseram que os palestinos têm um Estado, um Estado do Hamas em Gaza, e vejam o que fizeram com ele”, afirmou.
Trump, por sua vez, evitou responder diretamente se apoia a solução de dois Estados e encaminhou a pergunta a Netanyahu. O presidente norte-americano afirmou apenas que deseja alcançar um acordo de cessar-fogo “muito em breve” e que Hamas “quer se encontrar” para negociar a trégua.
Segundo a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, a prioridade do governo dos EUA neste momento é garantir a libertação dos reféns e encerrar os combates.
“Há uma proposta de cessar-fogo apoiada por Israel que foi enviada ao Hamas, e esperamos que eles concordem com essa proposta”, disse.
Acordo ainda depende da ajuda humanitária, enquanto ofensiva israelense se intensifica
Embora os representantes de Israel e Hamas tenham retomado as negociações em Doha, intermediadas pelo Qatar e pelo enviado especial dos EUA Steve Witkoff, o principal impasse gira em torno da distribuição de ajuda humanitária em Gaza.
Fontes palestinas informaram ao Haaretz que Israel insiste em manter controle sobre a entrega dos suprimentos, impedindo canais independentes como o Crescente Vermelho e a ONU.
O governo israelense quer excluir a Gaza Humanitarian Foundation, alegando que não há como impedir que o Hamas se aproprie dos mantimentos sem listas de distribuição pré-aprovadas.
O chefe do Estado-Maior, Eyal Zamir, compartilha dessa visão, e o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, tem pressionado Netanyahu a congelar qualquer flexibilização nesse ponto.
Um esboço de proposta discutido no Qatar prevê um mecanismo alternativo, sem menção direta à fundação humanitária, mas as negociações continuam estagnadas. Segundo um oficial familiarizado com as conversas, “foram produtivas, mas ainda estamos esperando uma decisão”.
Enquanto isso, a ofensiva israelense se intensifica em diversas regiões da Faixa de Gaza. Mais de 57 mil palestinos foram mortos desde o início da guerra, segundo o Ministério da Saúde local, e quase 500 mil enfrentam risco iminente de fome.