UNE defende reformulação do arcabouço fiscal: “Educação não pode ser alvo de ajuste”
Ao Entrelinhas Vermelhas, atual presidenta da UNE e candidata à presidência, Manuela Mirella e Bianca Borges, defendem retirar a educação do teto de gastos, aumentar investimentos e tributar grandes fortunas
Lideranças estudantis apontam teto de gastos rebatizado como entrave estrutural ao desenvolvimento nacional; 60º Congresso da UNE promete ser trincheira em defesa de financiamento estável, assistência estudantil e democracia
A poucos dias do 60º Congresso da UNE, que acontecerá entre 16 e 20 de julho, em Goiânia, o programa Entrelinhas Vermelhas recebeu nesta quinta-feira (10) duas protagonistas da atual cena estudantil brasileira: Manuela Mirella, presidenta da UNE, e Bianca Borges, candidata à presidência da entidade pelo movimento Canto de Coragem. A entrevista se transformou em um amplo manifesto em defesa da educação pública, da democracia e do papel ativo da juventude na reconstrução nacional.
As dirigentes estudantis denunciaram os impactos do arcabouço fiscal sobre o orçamento da educação pública. Em um contexto de mobilizações crescentes, elas colocam o financiamento como ponto central da disputa por um novo projeto de país. “Investimento em educação não pode ser refém de ajuste neoliberal”, sintetizou Bianca.
O debate, que antecede o 60º Congresso da União Nacional dos Estudantes (Conune), previsto para ocorrer de 16 a 20 de julho em Goiânia (GO), teve como pano de fundo a conjuntura política e econômica do país, as disputas em torno do novo Plano Nacional de Educação (PNE) e o papel da juventude na resistência democrática.
Assista a íntegra da entrevista:
O teto rebatizado: uma velha camisa de força
Durante a entrevista, Manuela Mirella criticou diretamente o arcabouço fiscal aprovado em 2023, classificando-o como uma versão “maquiada” do antigo teto de gastos imposto pela Emenda Constitucional 95. Segundo a dirigente, ao atrelar os investimentos em áreas sociais ao resultado primário e ao crescimento da arrecadação, o novo marco orçamentário continua limitando a capacidade do Estado de responder às demandas da educação pública.
“O financiamento da educação não pode continuar sendo variável de ajuste. Universidades não podem depender de suplementações emergenciais para fechar o ano. Essa lógica fiscalista nos condena à precariedade”, afirmou Manuela. Ela ressaltou que a UNE continuará pressionando por uma vinculação estável de recursos, especialmente a partir de fontes estratégicas como o fundo social do pré-sal.
Bianca: “Universidade não pode ser luxo, tem que ser direito”
Para Bianca Borges, candidata à presidência da UNE pelo movimento Canto de Coragem, a centralidade da educação no projeto nacional passa obrigatoriamente por enfrentar o modelo de austeridade. “Estamos falando de permanência estudantil, de acesso real ao ensino superior. Mas como garantir isso se os recursos estão congelados por uma lógica neoliberal que privilegia o rentismo?”, questionou.
Bianca criticou a ausência de políticas universais de assistência estudantil, o sucateamento de bolsas e a precarização enfrentada por estudantes do ensino privado. “Muitos jovens entram na universidade, mas não conseguem permanecer. Trabalham 12 horas por dia, viram entregadores, vivem sem perspectiva. Isso não é escolha: é abandono por parte do Estado”, denunciou.
60º Congresso da UNE: 15 mil estudantes em Goiânia e o reencontro com o Brasil
Com expectativa de 15 mil participantes de todos os estados, o 60º Congresso da UNE (Conune) será o maior encontro estudantil da América Latina. O evento reunirá jovens de universidades públicas e privadas para debater educação, justiça social, soberania nacional, democracia e o papel do Brasil no mundo multipolar.
“A juventude brasileira quer ser protagonista das soluções para as crises que o país atravessa. O Congresso da UNE é onde esse protagonismo se expressa”, afirmou Manuela Mirella, atual presidenta da entidade.
Permanência estudantil: a grande batalha da década
Bianca Borges destacou que o foco do novo ciclo da UNE será a permanência estudantil. “Democratizar o acesso foi um avanço com as cotas, com o ProUni, com o Reuni. Agora, o desafio da nossa geração é garantir que esses estudantes consigam ficar na universidade, se formar e contribuir com o país”, disse.
Ela defendeu a regulamentação do Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), a criação de restaurantes populares para estudantes da rede privada e o uso do fundo social do pré-sal para financiar essas políticas. “Não adianta entrar na universidade e depois ter que abandoná-la para trabalhar em aplicativo”, criticou.
Financiamento público e o novo Plano Nacional de Educação (PNE)
As dirigentes apontaram que o subfinanciamento crônico da educação pública ameaça o futuro do ensino superior. “A cada ano é um apagão, um sufoco. A universidade não pode viver de suplementação emergencial. Precisa de um orçamento estável, vinculado a um projeto nacional”, denunciou Manuela.
Bianca e Manuela defenderam que o novo PNE 2024-2034 reafirme metas históricas como os 10% do PIB para a educação e 50% do fundo do pré-sal para o setor. “Há mais de 2 mil emendas no texto atual do Congresso. Algumas querem reduzir o investimento mínimo para 5%. Isso é inaceitável. Os 10% têm que ser cláusula pétrea”, alertou Manuela.
Educação, trincheira contra o autoritarismo e a desinformação
Diante do avanço da extrema-direita, ambas reforçaram que a UNE seguirá na linha de frente da luta democrática. “Estão tentando matar o sonho da universidade. Nossa resposta é ocupar as ruas, os debates, as redes, os espaços de decisão”, afirmou Bianca.
Ela alertou para a conexão entre precarização educacional e desinformação, criticando o modelo mercantilista de grupos privados. “O ensino remoto precário das plataformas da Ânima, por exemplo, destrói a formação crítica. Educação virou produto barato com mensalidade cara.”
Plebiscito Popular: juventude mobilizada por justiça tributária
Durante o Congresso, a UNE lançará sua participação no Plebiscito Popular, que propõe:
Taxação de grandes fortunas;
Isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil;
Fim da escala 6×1 que precariza o trabalho.
“O plebiscito é sobre o que o Brasil quer ser. É educação, saúde, trabalho digno. Cada estudante sairá de Goiânia com sua urna e será multiplicador da luta”, afirmou Manuela.
Rumo a 2026: juventude na linha de frente contra o retrocesso
Para Bianca Borges, a UNE terá papel estratégico nas eleições de 2026, que ela define como “uma das mais difíceis da história recente do país”. Ela defende uma nova frente ampla, mas agora com educação no centro do programa mínimo de reconstrução nacional.
“A UNE foi fundamental em 2022. Em 2026, será mais ainda. Não basta derrotar o autoritarismo: precisamos de um novo projeto para o Brasil — e a universidade tem que estar no centro dele”, declarou.
Bianca Borges: nova presidenta e a continuidade de uma revolução feminina
O Congresso da UNE pode marcar também a eleição da 11ª mulher à frente da entidade, consolidando um ciclo iniciado com Clara Araújo em 1982. Bianca, militante da UEE São Paulo, assume a presidência em meio a desafios gigantescos — e com um discurso marcado por coragem e visão coletiva.
“Não é sobre mim. É sobre o coletivo que constrói essa UNE. A juventude está viva, está organizada e não aceitará voltar ao passado. Vamos à luta por um Brasil justo, democrático e popular.”
Serviço
📌 60º Congresso da UNE (Conune) 🗓️ De 16 a 20 de julho de 2025 📍 Goiânia (GO) 🎓 15 mil estudantes de todo o Brasil 🗳️ Lançamento do Plebiscito Popular por Justiça Fiscal 📚 Pautas: permanência estudantil, PNE, financiamento, soberania e democratização da universidade brasileira
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