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TVs têm até o dia 9 para se adaptarem aos fusos horários

No próximo dia 9 de janeiro, vence o prazo de 180 dias para que as emissoras de televisão adaptem suas programações aos diversos fusos horários do país, como mandam as regras de classificação indicativa de obras audiovisuais destinadas à televisão que reg

O último dia 20 de dezembro marcou o primeiro grande embate entre o Ministério da Justiça e os radiodifusores após a publicação da Portaria 1220. A reclassificação da novela “Duas Caras” – motivo de mais de duas dezenas de reclamações por conta das cenas de forte apelo sexual da personagem Alzira, interpretada pela atriz Flávia Alessandra – para as 21h, inapropriada para menores de 14 anos, aconteceu na seqüência da decisão da própria emissora de classificá-la como inapropriada para menores de 12 anos, ou seja, para as 20h.



Para o diretor do Departamento de Justiça e Classificação do Ministério da Justiça, José Eduardo Romão, responsável pela implantação da Classificação Indicativa, a decisão sobre “Duas Caras” foi o maior desafio da Portaria 1220 até agora. “A classificação indicativa tem sido um aprendizado tanto para o MJ quanto para o público. Acredito que a portaria foi testada e aprovada, e a recepção da decisão tem dado provas de legitimidade à nossa atuação”, afirma Romão, atribuindo também ao Ministério Público Federal (MPF) a responsabilidade pelo controle público. “O ministro [da Justiça] já havia dito que só haveria decisão com anuência do MPF. Hoje, se a emissora não cumpre um acordo com o Ministério da Justiça, a questão é encaminhada ao MPF, que pode enquadrar a empresa em um Termo de Ajustamento de Conduta, o que significa mais segurança para o cidadão”, conta o diretor do MJ.



A despeito das insinuações de diretores da Globo e do autor da novela, Aguinaldo Silva, de que a reclassificação seria uma forma de censura, Romão acredita que este discurso, sistematicamente reproduzido pelas emissoras, perdeu força com a não adoção do recurso da análise prévia, que permitia ao MJ classificar programas antes deles irem ao ar. “Vejo que o fim da análise prévia representou vantagem para todos, pois a avaliação é sobre o que já aconteceu e a portaria deixou clara a questão”, afirma.



Fuso horário



Um dos principais pontos da Portaria 1220/07 se refere à adequação da grade de programação das emissoras aos diversos fusos horários do país. Todas as tentativas de implementar a medida, contudo, foram abortadas pela força do lobby das empresas de radiodifusão que, ao que tudo indica, já pressionam por um novo adiamento. O texto da portaria estabelece o prazo de 180 dias para o ajustamento, a partir de sua publicação, sendo este o segundo prazo concedido às emissoras – o primeiro foi ainda no começo de 2007.



Prevendo a possibilidade de adiamento, a Campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania” emitiu comunicado onde afirma que “a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão – Abert e outros proprietários radiodifusores já procuraram o governo e parlamentares solicitando a prorrogação do prazo estabelecido na portaria”, o que, de fato, causa preocupação nas organizações da sociedade civil.



“Qualquer das partes interessadas pode pleitear mudanças na legislação, mas isto deve ser feito segundo as regras e com justificativas plausíveis, ou seja, lembrando que todas as partes interessadas devem ser consultadas”, afirma Guilherme Canela, coordenador de relações acadêmicas da Andi – Agência de Notícias dos Direitos da Infância. “A questão é que até agora não há justificativa plausível para adiamento”. Canela questiona ainda a legitimidade da reivindicação dos radiodifusores. “O que foi feito nestes seis meses para se adequarem? As emissoras precisam demonstrar que tentaram, lembrando que a regra deveria ter entrado em vigor em maio deste ano, ou seja, elas estavam alertadas”.



O Ministério da Justiça assume que as emissoras têm se movimentado no sentido de pleitear o adiamento, mas refuta a possibilidade de que o prazo seja novamente estendido. “Formalmente, recebemos da Abert e da Abra [Associação Brasileira de Radiodifusores] uma solicitação de adiamento, inclusive com assinaturas de deputados de estados da Amazônia legal, exceto o Acre, mas não haverá adiamento nem revogação da regra”, afirmou José Eduardo Romão.



As emissoras alegam que problemas operacionais e financeiros dificultariam a consecução da regra, pois as retransmissoras locais teriam que gravar a programação e colocá-la no ar apenas nos horários determinados pela Portaria. A proposta da Abert para que a adequação não entrasse em vigor no próximo dia 9 envolvia uma campanha maciça nas regiões Norte e Nordeste, alertando a população de que aquela programação é veiculada no horário de Brasília e que a advertência de impropriedade deveria ser levada em consideração pelos pais. “A campanha deve acontecer juntamente com a adequação ao fuso horário e o Ministério Público vai averiguar com o tempo”, defende Romão.



Avaliação do processo



Em relação à aplicação e à eficácia da classificação indicativa até aqui, Guilherme Canela, da Andi, aponta duas questões importantes a serem analisadas. A primeira diz respeito a publicização das regras através dos símbolos padronizados. “Essa não é uma questão menos importante, pois é por esse conjunto de regras que a população pode se interar da iniciativa”.



Um segundo ponto e que preocupa Canela é, na sua opinião, a falta de análise em relação ao cumprimento da auto-classificação, uma demanda das emissoras que substituiu o mecanismo da análise prévia. “Agora, a análise da classificação indicativa fica a cargo das emissoras. Mas será que elas, ao produzirem a auto-classificação, seguem a lógica do que foi discutido e está no manual?”. Canela acredita ainda que não há indícios objetivos para afirmar que as regras têm sido eficazes. “Não se analisa se está sendo cumprido [o que define o manual] ou não é publicizado. Também o número de denúncias ainda é pequeno”, avalia.



De qualquer forma, a Portaria 1220/07 já produziu seu primeiro resultado. A reclassificação da novela “Duas Caras” atendeu a necessidade óbvia de preservar os direitos das crianças e adolescentes que viam-se expostos ao abuso praticado pela Rede Globo. Outros tantos casos ainda causam assombro pela péssima qualidade atribuída à busca sem limites pela audiência ou pelos apelos extremamente questionáveis das emissoras por “liberdade de expressão”. A participação da sociedade ainda é tímida, mas o exemplo atual pode marcar uma nova fase nas relações com a mídia.



Fonte: Observatório do Direito à Comunicação