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Lugo pode brecar conservadorismo pró-EUA do Paraguai?

As pesquisas dizem que os colorados podem perder as eleições do próximo 20 de abril e que o candidato para realizar essa façanha é Fernando Lugo, ex-bispo da Teologia da Libertação, conhecido como “bispo dos pobres”. Há décadas que o Paraguai é um aliado

Um monumento e uma avenida para honrar o líder anticomunista taiwanês Chiang Kai-Shek em plena Assunção são alguns dos sinais que levam ao Paraguai de Alfredo Stroessner, o ditador que governou com mão de ferro durante 35 anos e deu abrigo a criminosos tão destacados e obscuros como o médico nazista Josef Mengele ou o ditador nicaragüense Anastasio Somoza.



Mas desde bem antes, esta “ilha rodeada de terra”, como o país foi chamado por Roa Bastos (o Paraguai também não tem mar), estava na mira de outros fanáticos: já no século XIX, Bernhard Förster, cunhado do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, tentou construir uma colônia ariana para tornar realidade suas teses racistas. E foi lá que se instalou o primeiro partido nazista fora de Alemanha.



Em 1989, a queda de Stroessner em mãos de seu consogro, o general Andrés Rodríguez, abriu uma transição na qual pouca coisa mudou. A “democracia” manteve as rédeas do poder em mãos dos ex-partidários de Stroessner agrupados no partido Colorado, que governa ininterruptamente há 60 anos.



Contudo, agora esta hegemonia começa a erodir e, por trás da calma de Assunção, é possível perceber o nervosismo de uns e a expectativa de outros diante da nova realidade: as pesquisas dizem que os colorados podem perder as eleições do próximo 20 de abril e que o candidato para realizar essa façanha é Fernando Lugo, ex-bispo da Teologia da Libertação, conhecido como “bispo dos pobres”, da região rural de San Pedro, que deixou a batina em dezembro de 2006 para entrar na arena política.



Mas Lugo ainda é uma incógnita: se para uns é o “Evo paraguaio” —com um forte apoio na zona rural e nos bairros populares das cidades— para outros é um pragmático moderado cujas ânsias de mudança serão “fagocitadas” pelo “tradicional” partido Liberal, que sustenta sua candidatura. “Mbytetépe, poncho yurúicha” (estou no centro exato, como a boca do poncho) disse ele em certa ocasião.



Há décadas que o Paraguai é um aliado chave dos EUA na América do Sul e em 2005 causou preocupação regional a ampliação da pista de aterrissagem na localidade de Mariscal Estigarribia, a 250 Km. da fronteira com a Bolívia: seus 3.800 metros permitem a aterrissagem dos maiores aviões do estoque bélico norte-americano, como os bombardeiros B-52 ou os Galaxy, para transporte de tropas e material de guerra. A desculpa dos EUA é a suposta presença de terroristas da Al Qaeda na denominada Tríplice Fronteira.



Mas o Paraguai — durante Stroessner e seus sucessores — submeteu-se também à Brasília, onde foi o exílio do ditador, em 1989. “Finalmente alguém dá uma dor de cabeça ao Brasil”, disse Lugo com relação à sua exigência de renegociar a distribuição do produto da gigantesca hidrelétrica binacional de Itaipú. E os brasileiros “invadiram”, também, os campos paraguaios para cultivar soja, anexando de fato zonas fronteiriças.



Hoje, o Paraguai observa com atenção as mudanças continentais, especialmente os processos de mudança na Bolívia, Venezuela e Equador. Mas o continente — incluindo os países vizinhos — ainda não olha para esta nação que tenta deixar para trás o patético “realismo mágico” construído por um dos ditadores mais corruptos, longevos e desconhecidos da América Latina e ser um país de verdade.



Fonte: Carta Maior
Tradução: Naila Freitas / Verso Tradutores