Artigo: Potencial agrícola e inflação, por Murilo Ferreira

O professor de economia rural Murilo Ferreira dá sua opinião aqui no Vermelho sobre um assunto que ganhou a pauta mundial e tem sido freqüentemente citada pelo presidente Lula: Inflação, produção agrícola e consumo.

Na década de 80 vivemos uma forte onde inflacionária, principalmente no final do governo Sarney. Chegou a alcançar números alarmantes, conseqüência principalmente dos aumentos dos juros nos EUA e a falta de liquidez internacional. Com isso, passamos por uma crise da dívida externa, alta dos preços do petróleo e crise econômica gerada pelos desequilíbrios nas contas externas.


 


No lado da oferta de produtos agropecuários, apresentávamos problemas de abastecimento que empurravam a inflação para cima, além de filas em supermercados e pessoas fazendo estoque de alimentos em casa com medo de faltar produto. Resumindo, havia problemas estruturais originados de uma insuficiente capacidade de nossa agricultura atender a uma demanda aquecida, retirando-se da conta os problemas sazonais de uma safra ou outra.


 


Vejamos a evolução de alguns produtos: comparando-se o ano de 1990 e o ano de 2005, verificou-se um crescimento de 410% na produção de frango (2267 para 9297 mil ton.); de 257% na produção de soja (19898 para 51162 mil ton.) e de 64,6% na produção de milho (21346 para 35134 mil ton.). Já no caso do rebanho bovino, comparando-se o ano de 1994 e 2005, o rebanho cresceu de 158,2 para 195,5 milhões de cabeças. Cresceu cerca de 23,6%, o suficiente para garantir a liderança mundial na produção de carne bovina.


 


Estes dados, mesmo não levando em conta a série histórica, mostra os bons resultados do setor agropecuário. Acrescente-se que a previsão da safra agrícola 2007/08, segundo a CONAB, poderá chegar a 140,77 milhões de toneladas. Com isso, pode-se sustentar, então, que a agricultura hoje pode corresponder estruturalmente diante de uma demanda aquecida.


 


Contudo, desde FHC as políticas rígidas de metas inflacionárias desconsideram o enorme potencial e o atual dinamismo deste setor. De lá para cá, cultivamos uma brutal taxa de juros, um dos fatores mais restritivos ao crescimento do produto interno e ao desenvolvimento do país. Apesar dos ventos contrários, a agricultura consegue navegar. Mas não podemos dizer o mesmo da indústria. Seus fracos resultados têm levado o Brasil, novamente, ao título de exportador de commodities primárias.


 


Paralelo a isso, o governo está travando uma luta estéril contra os subsídios praticados pelos países ricos à sua produção agrícola. Tais subsídios tem sido responsabilizados por desestimular a nossa produção agrícola. Mas, poderíamos obter um estímulo ainda mais forte se o governo destravasse a economia e praticasse uma taxa de juros próxima da média mundial. Haveria crescimento do emprego e da renda dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que cresceriam a produção e o mercado interno.


 


Resta saber se o setor agropecuário poderia corresponder a uma política com este tipo de foco, isto é, no bem estar social. Pelo que se tem visto, sim. E muito mais do que imaginam os nossos monetaristas do Banco Central.


 


Murilo Ferreira é agrônomo formado pela Universidade de Lavras, onde fez mestrado em Economia Rural. É diretor do Sindicato dos Professores