Contra a repressão, estudantes ocupam sede do DCE da USP
Depois de ficar três anos fechado para reformas, o Centro de Convivência da USP, sede do Diretório Central dos Estudantes Alexandre Vannucchi Leme (DCE), deveria ser integralmente devolvido à entidade. Mas não foi isso o que ocorreu. Como resposta à escal
Publicado 27/04/2009 19:06
O Centro de Vivência, localizado em frente ao prédio da Administração Central da Universidade, além da sede do DCE e da Associação de Pós-Graduandos da USP (APG), também abriga uma livraria da Editora da Universidade de São Paulo (EDUSP), Farmácia Universitária e espaços para a instalação de restaurante, café, lanchonete, papelaria, copiadora e revistaria.
Todo o prédio, antes de ser fechado para a reforma, era gerido pelo DCE e os recursos oriundos do aluguel das empresas prestadoras de serviço eram a principal fonte de renda da entidade. Porém, após a reforma, a reitoria da universidade se nega a reconhecer a histórica autonomia dos estudantes sob o espaço. Segundo nota divulgada pela instituição na sexta-feira (24), apenas uma sala do Centro de Convivência é concedida ao DCE.
“Restringiram o espaço físico (do DCE), tiraram autonomia da gestão do espaço. Todos os aluguéis do espaço, para restaurantes, lojas, iriam para a universidade, não para o DCE. O elemento central (da ocupação) é que é a sede histórica do DCE da USP. O espaço era uma conquista desde a época da Ditadura”, afirmou o diretor da entidade, Gabriel Casoni.
Versões controversas
Em nota desta sexta, a “reitoria ressalta que o repasse de recursos financeiros a terceiros, advindos da exploração comercial de áreas concedidas na universidade, não encontra fundamento legal”. Mas a nota não esclarece por que somente depois da reforma a exploração comercial passou a ser ilegal, já que antes ela acontecia livremente pelo DCE e era consentida pela instituição. A nota ainda transparece o autoritarismo vigente na USP ao definir o DCE como “terceiros”, e não como parte da comunidade universitária.
A UEE-SP (União Estadual dos Estudantes de São Paulo), afirmou apoiar a ocupação. “A unidade de todas as forças políticas que atuam na universidade pela retomada do espaço do DCE simboliza a justeza desse movimento. Agora o desafio é fazer com ele tenha consequência”, defendeu ao Vermelho Augusto Chagas, presidente da UEE-SP.
Para Augusto, a retomada do DCE será importante para mudar o cenário dramático em que estão inseridas as universidades estaduais na gestão do governador José Serra (PSDB). “As estaduais paulistas não estão em nenhum processo de expansão, de democratização do acesso ou de aumento de recursos para o seu desenvolvimento. Bem pelo contrário, o que assistimos é mais repressão e falta de investimentos. Retomar o DCE da USP será de grande ajuda para que se reverta este cenário.”
Repressão e autoritarismo
Em 2006, dois estudantes de Arquitetura, Daniel Sene, 25, e Ilana Tschiptschin, 23, foram condenados a três meses de detenção por terem escrito “Brasília 17'' na rua do campus Butantã, na capital. A frase era uma convocação para um protesto contra a corrupção no dia 17 daquele mês. Um carro da guarda universitária abordou os alunos, que portavam pincéis e tinta, e imediatamente os levou a delegacia. Eles passaram a noite em uma cela do 93º DP (Jaguaré).
A vitoriosa ocupação realizada em 2007 — que derrotou os decretos do governador Serra para o ensino superior — recrudesceu ainda mais o trato da a reitoria com os movimentos da comunidade. Logo após a ocupação, a reitora Suely Vilela rompeu com o termo de compromisso que deu fim ao conflito indiciando cerca de 40 pessoas (entre trabalhadores e estudantes) e impondo, na Justiça, pesadas multas ao Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP) e ao DCE pela ocupação. Além disso, demitiu o diretor do sindicato Claudionor Brandão.
Ainda em 2007, durante um ato promovido pela UNE e o MST, na Faculdade de Direito no Largo São Francisco, a tropa de choque da polícia militar foi acionada pelo diretor da faculdade. Bombas, balas de borracha, gás lacrimogêneo e diversas detenções deram fim ao movimento. Durante os últimos três anos, panfletar e colar cartazes também está proibido pela universidade. Sempre que a guarda universitária observa ações do tipo, os estudantes mobilizados são intimidados e constrangidos a cessarem o movimento. Diversos espaços estudantis também já foram fechados pela universidade.
– Leia abaixo a íntegra das notas do DCE e da Reitoria
– Carta aberta: O DCE é nosso!
Nota pública do DCE da USP
São Paulo, 25 de abril de 2009
Na última quinta-feira, dia 23 de abril, a assembléia geral dos estudantes da USP, com mais de 400 presentes, decidiu por unanimidade retomar a sede do nosso Diretório Central dos Estudantes – maior entidade representativa dos estudantes da Universidade de São Paulo.
A sede do DCE havia sido fechada pela reitoria da USP no ano de 2006, sob o pretexto de reforma e regulamentação do espaço. No início deste ano, com a proximidade do fim da reforma, a reitoria notificou ao DCE que o espaço físico, antes destinado às atividades políticas estudantis, passaria ao seu controle administrativo. Acabando, assim, a autonomia política e financeira dos estudantes sobre a sede de sua entidade.
O DCE da USP entende que essa ação por parte da reitoria é um claro ataque à liberdade de organização do movimento estudantil em nossa universidade. O que se passa com a sede do DCE não é um fato isolado, pois é parte de toda uma política repressiva da burocracia acadêmica, que se dá por meio da retirada de espaços estudantis, da demissão de um dirigente do sindicato dos funcionários (Sintusp), de sindicâncias e inquéritos criminais contra estudantes e funcionários, multas às entidades representativas (DCE e Sintusp), entre outros casos.
Esse processo repressivo vem com o intuito de desarticular a organização política da comunidade universitária, justamente quando se aprofunda a precarização do ensino público no estado de São Paulo. Afinal, as universidades públicas sofrerão fortes contingenciamentos de verbas, fruto dos reflexos da crise econômica no orçamento da educação. Além disso, será implementada a Univesp, projeto de ensino à distância que compromete ainda mais a qualidade do nosso ensino.
Portanto, nesse contexto, a luta pela autonomia dos espaços de organização política e por liberdades de manifestação torna-se extremamente fundamental para a defesa da educação. Por isso, reiteramos a defesa intransigente da sede do DCE, hoje, ocupada pelos seus legítimos donos: os estudantes. O DCE é nosso!
Diretório Central dos Estudantes – Gestão Nada Será Como Antes!
– Comunicado da Reitoria da USP
A Reitoria da Universidade de São Paulo (USP) esclarece que o Centro de Vivência, localizado em frente ao prédio da Administração Central da Universidade, abriga as sedes do Diretório Central dos Estudantes ''Alexandre Vannucchi Leme” (DCE) e da Associação de Pós-Graduandos da USP (APG), além de uma livraria da Editora da Universidade de São Paulo (EDUSP), Farmácia Universitária e espaços para a instalação de restaurante, café, lanchonete, papelaria, copiadora e revistaria.
O Centro de Vivência está passando por reforma, em fase de conclusão e, no dia 4 de fevereiro deste ano, foi realizada uma reunião para a entrega das chaves para o DCE e para a APG. A APG assinou o termo de autorização de uso e assumiu o espaço. Entretanto, a representante do DCE recusou-se a assinar o termo e levou uma cópia do documento para discussão junto aos representantes da entidade. Para regularizar essa situação, a Coordenadoria do Campus da Capital tentou agendar, ao longo do mês, reuniões com representantes do DCE, que não compareceram a nenhum dos encontros.
A Reitoria ressalta que o repasse de recursos financeiros a terceiros, advindos da exploração comercial de áreas concedidas na Universidade, não encontra fundamento legal. No entanto, reitera o compromisso com a manutenção de atividades do DCE, que sejam de interesse para a formação dos alunos, dentro da missão da Universidade.
Reitoria da Universidade de São Paulo
De São Paulo,
por Carla Santos