Geopolítica americana: Jalife-Rahme rebate arauto do Pentágono

"A novidade não é que os Estados Unidos considerem o mar do Caribe como seu mare nostrum nem que procurem desmontar tanto o Brics como o Mercosul, mas que, por meio de seu arauto predileto, anunciem a "anarquia vindoura" na Colômbia e na Venezuela, para impedirem a nova conexão com a China e incendiarem a selva amazônica do Brasil". Artigo de Alfredo Jalife-Rahme, rebatendo texto de Robert D. Kaplan, publicado em seguida ao "A nova visão geoestratégica do Brasil", de 19 de julho.

Parecia até uma resposta ao meu artigo "Nova visão estratégica do Brasil", de 18 de julho, já que no dia seguinte o megastar da geopolítica dos superfalcões dos Estados Unidos e flamante colaborador da Stratfor, Robert D. Kaplan, publicou "A fonte do poder dos EUA", que omite ignominiosas ameaças de desestabilização tanto da Colômbia, de forma surpreendente, como da Venezuela (pela propaganda suja envolvida), mediante a aplicação dos conceitos geopolíticos do nederlandês-americano Nicholas J. Spykman, que virou moda nos círculos geoestratégicos do Brasil e dos Estados Unidos.

Cabe destacar que o artigo sobre a "Nova visão geoestratégica do Brasil" causou forte impacto no cone sul no dia seguinte, quando publicado pelo Portal Vermelho (19 de julho).

O controvertido portal Stratfor foi desmontado pelo Anonymous, que exibiu suas ligações com a CIA, com Israel e com a filial no México do superfacista Committee on the Present Danger.

A geobiografia do israelo-americano Robert D. Kaplan (soldado raso do exército de Israel), que apoiou a invasão dos Estados Unidos contra o Iraque, evidencia o choque conceitual das geopolíticas dos Estados Unidos e do Brasil: membro do Conselho de Política de Defesa sob o mandato do secretário Robert Gates, consultor dos três ramos das Forças Armadas dos Estados Unidos e considerado pela revista Foreign Policy como um dos "100 maiores pensadores (sic) globais (sic)".

A meu ver, Robert D. Kaplan representa o arauto do Pentágono para torcer os braços de seus adversários e/ou ameaçá-los. Seu eterno artigo "A anarquia vindoura" (no Atlantic Monthly, de fevereiro de 1994) cativou o então presidente Bill Clinton e, de fato, anunciou "premonitoriamente" o caos geopolítico global posterior aos polêmicos ataques de 11 de Setembro de 2001.

As "análises" de Robert D. Kaplan foram demolidas, com justa razão, como sendo pouco ortodoxas e sem rigor. Não importa. Vale mais aqui a mensagem transcedental do arauto que a sua qualidade acadêmica.

Somado a isso, apesar da hegemonia dos Estados Unidos no grande Caribe e a seu controle geopolítico até a fronteira do Amazonas, "onde nenhum poder significativamente pode desafiar os Estados Unidos", paradoxalmente os "Estados Unidos não podem contar com a estabilidade da Colômbia ou Venezuela, ainda porque a guerra das drogas continua em sua fronteira norte".

Assim, os Estados Unidos podem dominar o grande Caribe, "mas, com todo seu poderio" não pode garantir a estabilidade (mega sic!) em nenhuma parte dessa mesma região.

Robert D. Kaplan define "A fonte do poder dos EUA", com enfoque geopolítico, que representa o grande Caribe, o que faz temer que o Pentágono pretenda recuperar o que perdeu na América Latina – algo que já teve início: Haiti, Honduras e Paraguai, depois de abandoná-la durante a nefasta fase de Baby Bush – e até detonar uma Terceira Guerra Mundial termonuclear contra os novos e indesejáveis inquilinos da América Latina (Irã, Rússia e China).

Robert D. Kaplan define o grande Caribe a partir de Yorktown (mega sic!) até as Guianas (mega sic!), isto é, "desde os estados da metade do Atlântico dos Estados Unidos até as selvas do norte da América do Sul (mega sic!), com base em uma extensão do conceito de "hemisfério ocidental" do geoestratega Spykman em 1942.

Naturalmente, a linha Yorktown-Guianas chega à fronteira do Brasil e engole todas as ilhas do grande Caribe.

O grande Caribe de Robert D. Kaplan entra em choque com a definição de "América do Sul" do professor universitário brasileiro Ronaldo Carmona.

Para Spykman, segundo Robert D. Kaplan, o hemisfério ocidental não está dividido entre o Norte e o Sul da América, mas sim entre "as latitude norte da grande barreira da selva amazônica e a latitude sul desta". Que demais!

A "barreira natural" do Amazonas, a meu ver, balcanizaria de fato o conceito de América do Sul do Brasil, ao Mercosul, e ao mesmo Brasil.

Deduz-se assim que Argentina e Chile seriam mais "sul-americanos" que o Brasil e ficariam à mercê de uma dupla asfixia, a partir da Antártica e das Ilhas Malvinas.

Robert D. Kaplan transtorna a geografia em benefício dos interesses geopolíticos irredentistas dos Estados Unidos e sentencia que "a Venezuela não é mais um país sul-americano, É um país caribenho: a mairo parte de sua população de 28,8 milhões de pessoas vive no norte e ao largo do mar do Caribe, longe das selvas do sul". E onde ficariam então o Peru, o Equador, a Bolívia, o Paraguai e o Uruguai?

Os Estados Unidos, segundo ele, se constituem na "potência hegemônica do hemisfério ocidental abrangendo do Ártico canadense ao Cone Sul da América do Sul, com regiões cinzas (sic) como Bolívia, Equador e Peru, que estariam mais além do cinturão de segurança esculpido (sic) pela marinha dos EUA".

Algo interessante: "Com o hemisfério ocidental sob seu domínio, os Estados Unidos foram capazes de desequilibrar o poder no hemisfério oriental. As vitórias dos Estados Unidos nas duas guerras mundiais e na guerra fria foram construídas originalmente sobre a geopolítica do grande Caribe". Sem dúvida nenhuma!

Considera "um exagero (sic) dizer que os Estados Unidos perderam seu controle sobre o grande Caribe" e julga de uma forma depreciativa que até sua "guarda costeira" (mega sic!) é capaz de manejá-la.

A seu ver, os problemas atuais proveem do "contrabando maciço de drogas do México e da América Central para os Estados Unidos e por uma presença comercial robusta da China no canal do Panamá e na Venezuela". Cita a Colômbia como um "Estado parcialmente fracassado" e a Venezuela como um lar do "radicalismo contra os EUA", quando as "apostas são elevadas devido à ampliação do Canal do Panamá em 2014, que aumentará o tráfego marítimo global da Colômbia e da Venezuela.

Salto as diatribes contra a Venezuela e concluo brevemente a leitura com o linchamento de Juan Manuel Santos, a quem Kaplan culpa a ressurreição das Farc e quem "mudou retoricamente sua política externa para longe da amizade com os Estados Unidos e mais para um acomodamento com a Venezuela e o Equador". Passa longe dele a espetacular aproximação geoeconômica de Santos com a China.

Na realidade, a Venezuela é tão caribenha como é sul-americana (ver Radar Geopolítico, Contralínea, "EUA capturam o mar do Caribe do Bric", 21 de fevereiro de 2010).

A novidade não é que os Estados Unidos considerem o mar do Caribe como seu mare nostrum nem que procure desmontar tanto o Brics como o Mercosul, mas que, por meio de seu arauto predileto, anuncie a "anarquia vindoura" na Colômbia e na Venezuela, para impedir a nova conexão com a China e incendiar a selva amazônica do Brasil.

Conclusão:

Minha hipótese: Os Estados Unidos controlam hegemônica e geopoliticamente o grande Caribe e deixam fazer, se não é que promovem, a "anarquía vindoura" na Colômbia (citada antes que a Venezuela, debido a sua singular característica bi-oceânica) para incitar "mudanças de regime" que se coordenem com a irredentista agenda hemisférica e global dos Estados Unidos.

No caso do México, não está em jogo a "mudança do regime" – avassalado pelos Estados Unidos desde a Revolução – mas o controle dos hidrocarbonetos no Golfo do México (parte substancial do grande Caribe), onde de forma paulatina os Estados Unidos começam a recuperar seus "ativos" mediante a expulsão da espanhola Repsol da América Latina e do megaescândalo da "lavagem" de dinheiro do banco britânico HSBC, exibida pelo Senado dos Estados Unidos depois do "acidente ambiental" da British Petroleum.

As "lavagens" (amplamente expostas por um funcionário há não muito tempo) são isso: servem para as "limpezas energéticas e financeiras" com objetivo geopolítico.

O original encontra-se em www.alfredojalife.com