Após golpe, delegados da PF pedem cabeça do "intocável" Daiello
A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) anunciou após assembleia da categoria realizada na última sexta-feira (10), que enviará uma carta a Michel Temer (PMDB) pedindo a cabeça do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello.
Por Dayane Santos
Publicado 13/02/2017 17:14

Em nota, a ADPF afirma que 72% dos delegados presentes à assembleia estão descontentes com Daiello por sua “constante omissão” que, segundo eles, “enfraquece a instituição”.
A posição da entidade revela uma contradição de posição da entidade no antes e pós golpe. No comando da PF desde 2011, Leandro Daiello, assim como outros nomes que integram a Lava Jato, eram considerados intocáveis. Em fevereiro do ano passado, quando o então ministro da legítima presidenta Dilma Rousseff, Eugênio Aragão, ameaçou trocar todo o comando da PF, após os vazamentos seletivos de investigações em andamento para a grande mídia, a entidade e outros setores reagiram.
“Delegados de Polícia Federal permanecerão vigilantes a qualquer possibilidade de ameaça de interferência nas investigações. As manifestações públicas recentes demonstram que a população não deseja uma Polícia Federal controlada pelo governo, e, sim, uma Polícia Federal de Estado, firme e atuante contra a corrupção e o crime organizado”, afirma o comunicado da entidade.
O texto destacava ainda que ADPF não descartava “a possibilidade de ingressar com medidas judiciais e administrativas em face de qualquer arbitrariedade que venha a ser praticada pelo ministro da Justiça”.
Posteriormente, em entrevista ao Estadão, em 20 de abril de 2016, o presidente da ADPF, Carlos Eduardo Sobral, quando questionado se a provável mudança de governo ameaça a atuação da Polícia Federal, ele disse: “Infelizmente, a PF não tem autonomia prevista pela Constituição. Nosso diretor-geral não tem mandato e, portanto, pode ser destituído a qualquer momento. A saída dele implica mudança de mais de 200 delegados que exercem função de chefia. Por isso, uma mudança de governo traz riscos, primeiro pela possibilidade de paralisação do órgão caso haja troca na coordenação e, segundo, porque há vários membros do poder político investigados pela PF – e, evidentemente, quem vai nomear o corpo diretivo da Polícia Federal não escapa desse filtro político”.
“Os delegados estão com receio?”, voltou a questionar o Estadão e Sobral respondeu: “Sim! Há um clima de receio pelo fato de não termos a autonomia garantida na Constituição. Temos receio sim e o cenário político é de intensa instabilidade”.
Agora, mesmo de um ano depois, a ADPF defende que o novo diretor seja escolhido da chamada lista tríplice votada pela categoria, e pede que Temer leve em consideração os nomes mais votados. E mais. Garantem que a eventual mudança não comprometerá o destino de grandes operações em curso, como a Lava Jato, a Zelotes e a Acrônimo.
Além da politização, uma outra explicação para essa contradição foi dada por Armando Rodrigues Coelho Neto, advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo, em artigo publicado no Jornal GGN desta segunda-feira (13). Ele enfatiza que a indicação de Leandro Daiello para o comando-geral da instituição durante o governo Dilma foi de Michel Temer.
"Em nível nacional, poucos engoliram a indicação dele, que segundo especulações teria sido urdida por um ex-superintendente da paulista, ligado à colônia sírio-libanesa. Um pouco antes da indicação, porém, esse escrevinhador havia concluído um relatório correicional sobre a PF/SP (então comandada por Daiello) que não teria agradado a ninguém. Nela apontamos falhas graves e o chefe do Setor de Correições foi ou teria sido instado a alterar. Por haver recusado a refazer e ou modificar nosso trabalho, por coincidência foi destituído. Um novo teria sido feito, sabe-se lá por quem", conta Armando.
E segue: "Ao que consta, era necessário passar uma imagem de bom gestor, para que Daiello pudesse ser indicado para o cargo, embora ele alardeasse aos quatros cantos que seu desejo era ser Adido Policial na Itália. Sequer é possível presumir que Daiello tenha daquilo tudo compactuado, e o tal “domínio do fato” ainda não era moda. O certo é que, nas eleições realizadas pelas entidades de classe, o atual diretor-geral da PF ficou num minguado sexto lugar, com míseros 8% de votos, caçados a unha de último hora para que ele pudesse chegar ao cargo. Mas, “convidado”, aceitou e não agradou quase ninguém. De todo modo, prevaleceu a indicação dos emissários de Fora Temer. A legítima Presidenta Dilma Rousseff teve que engolir Daiello, com medo de ser acusada de interferência na Farsa Jato".
Segundo Armando, setores da PF que discordam da politização dos trabalhos, chegou a alimentar a esperança de investigar todos os partidos. "Mas, Fora Temer já “determinou” a operação “Estanca Sangria” e, aos poucos, a Farsa Jato vem sendo direcionadamente esquartejada, ainda que fique preservada a destruição do Partido dos Trabalhadores".
Na campanha pela troca do diretor-geral, Sobral e alguns diretores tentarão se reunir com Temer, e o ministro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, para tratar do conteúdo da carta.
Enquanto alguns pedem a saída de Daiello, outros não dão um piu. É o caso dos tucanos. Em março do ano passado, eles endossaram o coro dos delegados contra a possibilidade de substituição no comando da PF. Hoje, com nomes da cúpula do PMDB e PSDB na lista de citados pelos delatores, o site da legenda nem fala sobre o assunto. Aliás, a manchete do site é: “Sinais de melhora começam a despontar no Brasil, por Aécio Neves”.