Acordo Hamas – Fatá: reconhecimento de Israel?

As duas maiores organizações políticas palestinas – o Hamas e a Al Fatá – anunciaram nesta segunda-feira (11) um acordo […]

As duas maiores organizações políticas palestinas – o Hamas e a Al Fatá – anunciaram nesta segunda-feira (11) um acordo e a intenção de formar a curto prazo um governo de unidade nacional. O anúncio foi feito pessoalmente pelo presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, da Fatá, e o primeiro ministro, Ismail Haniyeh, do Hamas. A novidade, no entendimento, é o reconhecimento implícito do Estado de Israel, historicamente negado pelo Hamas.


 


O tema tem sido abordado na mídia sob um prisma pragmático e imediato. O governo do Hamas, eleito pelo povo palestino em janeiro, sofre um boicote por parte da “comunidade internacional” – leia-se os países ricos, sob comando dos EUA. Estes suspenderam toda ajuda à Autoridade Nacional Palestina, agravando as já penosas condições de vida daquele povo. Na semana passada, a greve dos funcionários da ANP, que não recebem desde março, acentuou a iminência do colapso.


 


Visto assim, o acordo Hamas-Fatá teria um sabor de derrota. E de êxito de uma intolerável chantagem externa. Mas não é este o único e nem o melhor prisma para se avaliar a questão. Outro ponto de vista, mais abrangente, tem sido defendido por forças expressivas e líderes ilustres da causa palestina.


 


Ao longo de grande parte da segunda metade do século passado, dois modos de pensar se ergueram em oposição ao reconhecimento do Estado judeu. Um, da direita árabe, sintetizado pela mídia no slogan “Jogar os judeus no mar”. E outro, da esquerda, defendendo um Estado único pluri-racial e laico, de convivência de palestinos e judeus. Este último programa, generoso e avançado, conquistou a maior parte do movimento palestino.


 


Entretanto, os pressupostos dessa proposta, enquanto plataforma concreta, foram sendo erodidos nas últimas décadas. A ofensiva neoliberal gerou no mundo e no Oriente Médio uma correlação de forças difícil. Israel inclinou-se mais e mais para o reacionarismo, o racismo, a expansão e o terror, com crescente apoio dos EUA, encurralando as forças progressistas e as tradições humanistas do povo judeu. Este ambiente foi envenenando a coexistência entre os povos palestino e judeu.


 


Nestas circunstâncias, passou a ganhar força a proposta de dois Estados: o de Israel, dentro das suas fronteiras anteriores à guerra de 1967, e um Estado livre e independente da Palestina, na Cisjordânia e na faixa de Gaza ocupadas em 67, com capital em Jerusalém Oriental. Entre os seus defensores destacou-se Iasser Arafat (1929-2004), que em seu nome assinou em 1993 os Acordos de Oslo com Israel, aos quais chamou “Paz dos bravos”.


 


É compreensível que esta não seja uma solução fácil para muitos palestinos que ainda guardam, como relíquias, as chaves das casas onde habitaram geração após geração, tomadas pela força quando o Estado judeu impôs-se pela força. Mas há motivos para ver nela as condições reais de unir o povo palestino, granjear apoio no mundo, constranger à defensiva as forças mais reacionárias do “Grande Israel”, mudar a correlação de forças existente e triunfar. Quem duvida que seria um triunfo da Palestina e dos palestinos, da paz e da justiça?


 


Há, sim, quem duvide, como mostra a posição assumida pelo Hamas desde sua fundação em 1987. Porém o acordo desta segunda-feira, com a chancela de Haniyeh, pode indicar uma flexão de vulto, e abrir um capítulo novo na luta do heróico povo palestino.