Sem noção

Outro dia, ao sair do banho, alguém o chamou no portão e ele não pensou duas vezes, saiu para fora, com tudo de fora e teve que agüentar os impropérios gritados por dona Gertrudes que saiu correndo sem olhar para tras. Dona Gertrudes estava tão desesperada que esqueceu até o andador. Pobre senhora, já fazia anos que não via algo igual.

Por esta época um dos amigos da turma do futebol, o Alencar, perdeu o pai de forma trágica. Enforcado em dívidas como estava, o homem não agüentou a pressão e se enforcou de verdade. Jogou uma corda numa árvore do bairro e pôs em prática a metáfora de seu sofrimento.

Foram dias difíceis para o Alencar. Andava cabisbaixo, calado, acabrunhado. Se afastou do futebol e dos churrascos na casa dos amigos. Precisou de um tempo para se recuperar. E como quem está vivo tem que viver, o bom Alencar foi aos poucos voltando ao convívio social.

Já passara algum tempo e a turma organizou um daqueles futebolzinhos acompanhado de um bom churrasco. Todos estavam presentes, a roda de samba, a carne assando e a bola rolando. Até o Alencar foi e estava feliz. O Sandoval também se fez presente, sempre chamando a Betinha, esposa do Carlão, de Lilia, que havia sido a noiva desse antes do casamento.

Estava tudo bem até o Alencar receber uma ligação de casa. Era sua mulher que não pôde ir à festa e reclamava sua presença. Preocupado em não deixar a mulher nervosa, Alencar se despede as pressas e vai saindo quando o samba pára, rola aquele silêncio e o Sandoval fala aos berros:

– Volta aqui, Alencar! Para que esta pressa? Parece que vai tirar o pai da forca!

Todos gritam em uma só voz:

– Sandoval!

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