“Abril” mais uma escola

“Assim como os internatos muçulmanos, as escolas dos sem-terra ensinam o ódio e instigam a revolução. Os infiéis, no caso, somos todos nós.”

Essa foi a introdução do artigo publicado na Revista Veja (Editora Abril) do dia 8 de setembro de 2004, intitulado “Madraçais do MST”¹. O texto, eivado de hostilidades, denuncia essas escolas instaladas em acampamentos e assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de ensinarem crianças entre 7 e 14 anos de idade a defender o socialismo, a "desenvolver a consciência revolucionária" e a cultuar personalidades do comunismo como Karl Marx, Ho Chi Minh e Che Guevara. Já a defesa do imperialismo, o desenvolvimento de uma consciência alienada e o culto às personalidades do capitalismo como Milton Friedman, Margareth Tatcher e Obama não soa tão absurdo para Veja. Pelo contrário, seria o índex ideal a ser adotado em todas as escolas.

Assim sendo, não satisfeita com essa “doutrinação” da esquerda, Veja resolveu “salvar” as almas dos brasileiros e investir pesado no mesmo ensino paralelo (só que privado) que condenou no referido artigo, sobre qual o poder público, desgraçadamente, não exerce quase nenhum controle.

Na semana passada, como revelou o Valor Econômico² do dia 05/07, “a Abril Educação anunciou a compra, por meio da subsidiária Central Abril Educação (Caep), das sociedades Colégio Motivo, Park Carapuceiro e Centro Recifense de Educação. O valor total da aquisição foi de R$ 103,121 milhões, com uma parcela de R$ 81,121 milhões desembolsada de imediato e as outras duas nos anos subsequentes – de R$ 11 milhões em julho de 2014 e R$ 11 milhões em julho de 2015. Com a aquisição, a empresa passará a atender diretamente a mais 2,8 mil alunos do Colégio Motivo, desde educação infantil até pré-vestibular.” (Grifo meu).

Um dia antes, a Abril já havia comunicado a compra do Centro Educacional Sigma, por R$ 130 milhões. “Após as últimas aquisições no segmento, a empresa decidiu criar uma nova unidade de negócios, que passará a se centrar na gestão desses ativos. A Abril Educação estima receita de R$ 270 milhões em 2013 para o negócio de escolas e cursos pré-vestibulares”, concluiu a matéria.

Diante destes fatos, é de se pensar seriamente o nível da batalha ideológica travada pelos grandes meios de comunicação no país que, não satisfeitos em apenas difundir seus valores e pensamentos pelos meios convencionais da mídia, estendem seus tentáculos em várias outras esferas, promovendo a luta política através do campo das ideias por meio do ensino privado elitista e conservador.

A Abril Educação, como é possível ver em sua própria página na internet, reúne também as editoras Ática e Scipione. Estas editoras atingem 60% dos estudantes brasileiros. São líderes absolutas no mercado de ensino no Brasil e se orgulha de oferecer o “mais completo portfólio de livros didáticos e paradidáticos” do país. Só em 2011 colocou mais de 50 milhões de livros didáticos em circulação. Fico só imaginando como o presidente Lula será retratado em algum livro de história destas editoras daqui a uns 20, 30 ou 50 anos.

Criada em 2007 como um braço do Grupo Abril, a Abril Educação vai além. É proprietária dos sistemas de ensino privado Anglo, Ser, Maxi e Geo. Também é dona da Anglo Vestibulares, do Curso e Colégio pH, do Grupo ETB (Escolas Técnicas do Brasil) e das escolas de inglês Red Balloon e a Alfacon, além de outros cursos preparatórios para concursos. Assim, vão formando seus quadros mais qualificados ao mesmo tempo em que enchem os bolsos.

Já passou da hora de o Estado Nacional assumir o seu papel na democratização dos meios de comunicação e na defesa ao direito de todos os brasileiros a uma educação pública gratuita, laica, universal, democrática, de qualidade e com um currículo básico comum e capaz de se manter acima dos interesses particulares deste e daquele grupo político.

Referências:
¹http://veja.abril.com.br/080904/p_046.html.
²http://www.valor.com.br/empresas/3188014/abril-educacao-vai-compras-pelo-segundo-dia

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