Amazonas, Volta do Exílio e Continuidade da Vigilância Policial

João Amazonas  
Amazonas, no aeroporto, com Arruda (de bigode), abraça Maria Trindade  

Em 25 de novembro, há 31 anos, 2 mil pessoas e militantes foram ao aeroporto de Congonhas, em São Paulo, receber João Amazonas que retornava de Paris. Com ele, estava Diógenes Arruda, cujo coração, fragilizado pela tortura, não aguentou,  morrendo de enfarto. Entre  as centenas de que os recepcionavam, estava Maria Trindade, que sobreviveu à traição e a delação que resultou na Chacina da Lapa, às violências dos militares e aos anos de prisão, para recepcionar os velhos camaradas na volta do exílio, em 1979.

Convencionado como o Dia do Amazonas, como  a Guerrilha do Araguaia, para os comunistas do PCdoB, a data é um marco simbólico da resistência à Ditadura que subordinou as classes dominantes ao imperialismo norte-americano e manchou parte da História das Forças Armadas brasileiras.

Era a conjuntura da conquista da libertação da maioria dos presos políticos, bem como da Lei da Anistia que, contraditoriamente, auto-incluiu os militares acusados de crimes de lesa-humanidade e lesa-pátria, nos anos de “abertura” política do governo do último ditador, o general João Baptista de Oliveira Figueiredo.

O que poucos sabem é que naquele momento a polícia política continuava em intensa vigilância. O Fundo “Polícias Políticas” do Arquivo Histórico do Rio de Janeiro (APERJ), no prontuário Guanabara – João Amazonas, explica um pouco mais aqueles momentos.[1]

Neste documento, há diversas folhas, contendo a foto de João Amazonas de Souza Pedroso, nascido em 1º de janeiro de 1912, e inúmeras folhas que mostram a vigilância histórica em torno do líder revolucionário. Desde sua entrada para o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), em Belém do Para, no contexto na Aliança Nacional Libertadora (ANL), em 1935, a frente popular que, há 75 anos, levantou a bandeira contra o fascismo, o latifúndio e o imperialismo.

Entre várias folhas, a polícia política mostra a preocupação com a fuga da prisão, em agosto de 1941, na Ditadura do Estado Novo, dos “presos extremistas” Pedro Araújo Pomar, João Amazonas Pedroso, João Cruz e Souza (Marujo), Agostinho Dias de Oliveira, Raimundo Serrão de Castro Sobrinho e Henrique Felipe Santiago.[2] Cumprindo pena como condenados pelo Tribunal de Segurança Nacional (TSN), os presos políticos fugiram em busca da liberdade, e dali, no caso de João Amazonas e Pedro Pomar, viajaram pelo Brasil buscando a reorganização clandestina no Partido dos comunsitas. O resultado foi a organização da Conferência da Mantiqueira, junto com Maurício Grabois e outros, em 1943, outro marco da luta histórica pela democracia no Brasil.

João Amazonas – preso entre 20 de novembro de 1937 e 9 de março do ano seguinte e de 9 de setembro de 1939 até a sua fuga, acusado pelo TSN de ter colaborado com os rebeldes comunistas de 1935 -, havia percorrido o País, sobretudo no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, buscando a reorganização do Partido destroçado pela repressão. Como resultado, veio a anistia de 1945, sua participação e direção no Movimento Unificado dos Trabalhadores (MUT), a representação brasileira na Convenção dos Partidos Comunistas da América, ocorrida no Chile, no mesmo ano, e a eleição como Deputado Federal Constituinte, em 1946. Documento policial da época o identificava como “depois de Prestes, o elemento de maior projeção e influência no Partido”.[3]

As fontes policiais ainda remetem, entre outros, para um documento de 1950, da Embaixada do Brasil na Bolívia, o qual trata de “atividades subversivas” de João Amazonas, Agildo Barata e José Maria Crispim, em Cochabamba, no país vizinho. 17 anos antes da ação de Che Guevara, militantes comunistas do Brasil atuavam em busca de revolucionários bolivianos.[4] Também são destacadas, entre tantas, João Amazonas participando do XX Congresso do PCUS (URSS – 1956), como Secretário-Geral do Partido no Rio Grande do Sul (a partir de junho de 1959), um mandado de prisão (03-11-1965)  e outro de 1977, decretada pela 1ª Auditoria de Guerra, “devido estar indiciado no inquérito que apurou as atividades do PCdoB, encontradas no ‘aparelho’ à Rua Pio XI, no Alto da Lapa, São Paulo – SP”, isto no período de “distensão” do governo do ditador Ernesto Geisel.

A prova documental maior da vigilância da polícia política sobre João Amazonas, após o retorno do exílio, é o informe n. 3147: “… o prontuariado, Secretário- Geral do (Partido Comunista do Brasil) PCdoB, em 24 de novembro de 1979, as 20:30 horas, desembarcou no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, após longo tempo de exílio”.Também é informado que, “após se desembarcar da alfândega”, João Amazonas, “que regressou juntamente com José Luiz Guedes, Helena Bocaiúva Cunha e Augusto Pinto Boal”, dirigiu “algumas palavras aos manifestantes presentes”. Em seguida, “embarcou no auto Volkswagen, cor azul, placa RJ-WM 6097, em companhia de Elza de Lima Monerat e Diógenes de Arruda Câmara e se dirigiram para a Rua Conde de Baependi, 34”. No aeroporto, esperando os exilados, “dentre os manifestantes presentes, foram reconhecidos”, segundo o informante da polícia, entre outros, Nelson Levy, Francisco Buarque de Holanda, Dina Sfat, Paulo José, Wanda Lacerda e Betty Mendes. [5].

Em 2012, no centenário de nascimento de João Amazonas, governará o Brasil Dilma Vana Roussef que, assim como o líder comunista, foi vítima dos porões da repressão. Que até lá, passos largos sejam dados pelo novo governo para a definitiva abertura dos Arquivos da Ditadura Civil-Militar, a fim de que documentos como os acima descritos ajudem ainda mais para o resgate da formação histórica brasileira, bem como consolidar a consciência democrática em nosso País.

Notas
[1] Ver o Prontuário Guanabara – João Amazonas, n. 35.144, caixa 1964. Fundo Polícias Políticas, Arqui Arquivo Histórico do Rio de Janeiro (APERJ).
[2] Idem, Comunicado do Governo do Pará ao Chefe de Polícia do Distrito Federal, Circular n. 161 de 11/08/1941, Folha 3, APERJ.
[3] Idem, Folha 20, APERJ.
[4] Idem, Folha 32, APERJ.
[5] Como alertou o historiador britânico Edward P. Thompson, as fontes policiais foram produzidas pela polícia, por isso devem ser vistas pelo pesquisador sem de descuidar desta origem. Mesmo assim, os arquivos da repressão são fontes materiais que se dispõe para resgatar parte de um processo histórico. Sobre a volta do Exílio e a vigilância da polícia sobre Amazonas, cf. idem, Folha 8, documentos 116 e 120, APERJ.

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