As amigas de Antonioni

A emancipação das mulheres na obra “As amigas”, de Michelangelo Antonioni e o filme em homenagem a Celso Marconi feito por Helder Pessoa e Paulo de Sá

Filme "As amigas"I Foto: Divulgação/Mubi

De repente, abri o YouTube e apareceu o anúncio oferecendo o filme “Le Amiche” do cineasta italiano Michelangelo Antonioni. E rever uma obra de Antonioni, para uma pessoa que sempre foi maravilhado pelo seu trabalho, é algo sempre especial. Uma versão totalmente original sem legendas e com os diálogos em italiano. É como se eu estivesse inaugurando uma obra de arte.

Michelangelo Antonioni começou a fazer cinema nos anos 40 do século XX, e “Le Amiche” é de 1955. O seu sucesso maior foi depois nos anos 60, quando fez a trilogia “A Aventura”, “A Noite”, e “O Eclipse”. Mas depois disso fez outras obras onde o tédio não foi propriamente a estrutura principal, que fizeram até mais sucesso como “Blow-Up”, “Profissão: Repórter” e “O Deserto Vermelho”. Ele é autor de um documentário sobre a China muito bom, mas que não teve aprovação dos Partidos Comunistas, simplesmente por mostrar algumas coisas que eles acharam desnecessárias.

O filme “As Amigas” poderia se chamar talvez “As Moças”, e assim talvez o título contivesse melhor o objetivo principal da obra, que foi mostrar a forma mais autônoma na qual as mulheres começaram a se comportar saindo fora da dominação masculina. Nessa obra, Antonioni começou a mostrar que para se construir um filme não se precisa criar uma estória com início, meio e fim, nessa ordem. Bastaria documentar como as pessoas estavam se comportando. Hoje, quase todo o cinema é assim, basta lembrar o pernambucano “Rio Doce” e o coreano “Moving on”, que vimos há pouco. Até mesmo um Jean-Luc Godard aproveitou do cinema de Antonioni para formar a sua linguagem cinematográfica.

Cineasta Michelangelo Antonini I Foto: Reprodução

Em “Le Amiche”, o cineasta ainda está preso à maneira de narrar hollywoodiana e seus intérpretes quase não se calam. Falam correndo para completar a fala estabelecida. Tem um momento, quase já para o fim do filme, quando uma moça está chorando, se desprende do seu amigo e sai andando por um escuro, estreito corredor. E assim o cineasta atingiu uma cena bela,  muito mais tensa, como foi comum em seus filmes dos anos 60.

Enfim, é sempre muito bom rever filmes de grandes criadores como Michelangelo Antonioni, pois através dessas novas visões a gente vai descobrindo novos aspectos do tradicional e grande cinema.

Olinda, 16. 10. 21

Um filme com Celso Marconi

Exibição do filme “Um Filme com Celso Marconi” I Foto: Celso Marconi/Arquivo Pessoal

Assisti hoje pela segunda vez a “Um filme com Celso Marconi”. A verdade é que agora formulei comigo uma visão bastante diferente de quando o vi no Sesc. Eu estava com informações que me foram transmitidas por Helder Pessoa, e certamente desejei que o produto final me mostrasse o que me havia sido prometido.

O importante, porém, é que os realizadores, que formam uma dupla profissionalmente Helder Pessoa e Paulo de Sá, estudaram o material cinematográfico que tinham e então criaram uma visão. Eu como espectador procurei encontrar o discurso oral, enquanto os cineastas descobriram e formularam o discurso visual e oral. Assim, criaram o discurso pretendido. Realmente, o personagem do filme é autor do que está dito, mas quem que é o autor do filme são os cineastas.

Eu tinha comentado com Helder que no filme dele faltava “o meio”. Isto é, tinha começo e fim, mas não tinha meio. Entretanto, nessa visão de agora descobri que o filme não tem nem começo nem fim, e talvez na verdade tenha, ou seja, todo ele um meio. Enquanto eu esperava o discurso oral feito pela boca, pelo som da boca, a dupla de cineastas formulou em cada cena um discurso. Cada palavra ou apenas cada gesto diz o que eles acharam que o personagem deveria dizer, porque faz parte de sua vida, particularmente da vida profissional.

Espero que esse filme de Paulo de Sá e Helder Lopes entre no circuito dos festivais, e isso deve acontecer no próximo ano. E não pelo personagem, mas  pelo inteligente e sutil trabalho estético da dupla. Helder diz que os próprios meios utilizados para a confecção do filme – digital, Super-8, e ele citou vários outros tipos técnicos … – mostram quem é e foi o personagem, e assim não precisa de discurso oral.

Olinda, 10. 12. 21

Ainda o filme de Helder e Paulo

Exibição do filme “Um filme com Celso Marconi” I Foto: Celso Marconi/Arquivo pessoal

Eles, Paulo de Sá e Helder Lopes, intitularam como “Um filme com Celso Marconi”, mas poderiam ter continuado com um ‘e / ou “Um filme sobre um velhinho crítico (entre outras coisas) de cinema”. Alguém que tem um monte de quadros e outros tipos de arte em casa e que também, ao invés de ver filmes aos montes, lê obras literárias e filosóficas. Aliás, eles citam uma afirmação do cineasta principal do Brasil Nelson Pereira dos Santos: “Ao lado de sua câmera, a escritura: em ambas, comandando-as, a cabeça do filósofo indagador”.

Eles buscam explicar que o crítico cumpriu a sua tarefa de crítico. E que pode descansar. Com o pouco de recursos ainda pode continuar criticando. Calmamente. E tanto o perfil escrito por Luiz Joaquim quanto esse filme de Paulo de Sá e Helder Lopes ajudam. E até o cartaz que está sendo construído pelo artista performático Daniel Lima Santiago.

Olinda, 10. 12. 21

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